Joe Biden domina primárias do Partido Democrata na Florida, Arizona e Illinois
Numa situação normal, a corrida para a escolha do adversário de Donald Trump nas presidenciais estaria decidida por esta altura, mas a pandemia do coronavírus veio baralhar as contas.
O antigo vice-presidente dos Estados Unidos Joe Biden dominou as três eleições primárias do Partido Democrata realizadas na terça-feira, garantindo uma vantagem decisiva sobre o senador Bernie Sanders na corrida pela escolha do adversário de Donald Trump nas presidenciais de Novembro.
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O antigo vice-presidente dos Estados Unidos Joe Biden dominou as três eleições primárias do Partido Democrata realizadas na terça-feira, garantindo uma vantagem decisiva sobre o senador Bernie Sanders na corrida pela escolha do adversário de Donald Trump nas presidenciais de Novembro.
Numa repetição do que aconteceu a 3 e 10 de Março – quando Biden dominou as eleições nos 20 estados que foram a votos nesses dois dias –, as votações na Florida, no Arizona e no Illinois confirmaram que a corrida poderia estar prestes a chegar ao fim, não fosse a incerteza provocada pela pandemia do coronavírus.
Na terça-feira, o domínio de Joe Biden foi mais notório na Florida, onde grande parte da comunidade latino-americana, que tem apoiado Sanders noutros estados do país, contribuiu para a vitória do antigo vice-presidente dos Estados Unidos.
A Florida tem uma grande comunidade de cubanos que fugiram ao regime de Fidel Castro, há décadas, e que viram com muita desconfiança os elogios de Bernie Sanders aos primeiros anos da revolução cubana. Em particular, o senador favorito da ala progressista do Partido Democrata elogiou os avanços em termos de educação e saúde na ilha, na década de 1960.
No final, Joe Biden teve 61,9% dos votos na Florida, contra 22,8% de Bernie Sanders, uma vantagem que se traduziu no alargamento do fosso entre os dois candidatos na contagem que mais interessa para a nomeação: o número de delegados que vão representar cada estado norte-americano na convenção do partido, marcada para meados de Julho.
Só na Florida, que era o estado com mais delegados em jogo na terça-feira (219), Biden seguia, nesta quarta-feira, com uma vantagem de 130-48 em relação a Sanders, quando ainda faltava atribuir 41.
O fosso poderia ser ainda maior se o Partido Democrata distribuísse os seus delegados através do sistema winner takes all (em que o vencedor fica com tudo). Por causa do sistema proporcional, Sanders somou quase três dezenas de delegados na Florida apesar da diferença para Biden no voto popular: Biden teve mais de um milhão de votos e Sanders teve menos de 400 mil.
Vantagem no Midwest
O domínio de Joe Biden repetiu-se no Illinois, outro estado com muitos delegados em jogo (155). Com quase o dobro dos votos de Bernie Sanders (quase um milhão contra mais de 500 mil), o antigo vice-presidente dos Estados Unidos seguia, nesta quarta-feira, com uma vantagem de 93-46 na contagem de delegados, numa altura em que ainda faltava distribuir 16.
Tal como na Florida, o resultado das primárias do Partido Democrata no Illinois era aguardado com expectativa. Se na Florida a curiosidade era saber a dimensão da vantagem de Biden, no Illinois tratava-se de saber se o candidato preferido da ala mais tradicional do partido repetiria as suas grandes vitórias noutros estados da região do Midwest, como o Michigan, o Minnesota e o Missouri.
É esta região dos Estados Unidos, onde os efeitos da globalização se fizeram sentir no encerramento de fábricas e na perda de postos trabalho transferidos para países como a China, que pode ser decisiva para a escolha do próximo Presidente dos Estados Unidos.
Em 2016, Trump ganhou o voto de alguns eleitores que tinham votado em Barack Obama nas eleições presidenciais de 2008 e 2012. Essa transferência de voto foi um dos factores que levaram às derrotas tangenciais de Hillary Clinton em estados do Midwest como a Pensilvânia (onde Biden nasceu), o Michigan (que Biden dominou este ano frente a Sanders) e o Wisconsin (com primárias marcadas para 7 de Abril).
Um dos argumentos da campanha de Bernie Sanders na corrida contra Joe Biden era a ideia de que as propostas mais à esquerda do senador do Vermont, em defesa dos trabalhadores em dificuldades, faziam dele o candidato mais bem posicionado para recuperar os eleitores perdidos para Trump em 2016. Com o domínio de Biden nestes estados nas primárias, esse argumento ficou bastante comprometido.
Na terceira votação de terça-feira, no Arizona, a vitória de Joe Biden foi menos impressionante, mas o facto de o estado distribuir apenas 67 delegados acabou por limitar a sua importância na corrida. Quando faltavam distribuir 19 delegados, Biden liderava com 26 e Sanders tinha 22.
Numa altura em que já foram distribuídos mais de 60% dos delegados em jogo em toda a corrida no Partido Democrata, Joe Biden lidera a contagem provisória com 1147 delegados, contra 861 de Bernie Sanders (ainda não foram distribuídos 76 delegados das eleições de terça-feira e 59 de eleições anteriores).
O primeiro a conquistar pelo menos 1991 delegados garante a nomeação virtual como candidato do Partido Democrata às eleições presidenciais de Novembro contra Donald Trump.
As eleições do coronavírus
Mas as primárias do Partido Democrata ficaram marcadas pela pandemia do novo coronavírus, que levou ao cancelamento, na terça-feira, da votação no Ohio – outro importante estado do Midwest.
A poucas horas da abertura das mesas de voto, o governador do estado, Mike DeWine, apoiou-se numa declaração de ameaça para a saúde pública para suspender a votação. Nos outros três estados (Florida, Arizona e Illinois), as autoridades locais reforçaram as regras de segurança e decidiram manter as eleições.
O Ohio é já o quinto estado norte-americano a adiar as primárias este ano, depois da Georgia, Louisiana, Kentucky e Maryland.
Com a campanha dominada pela pandemia de coronavírus, sem comícios e sem espaço nos jornais para debater outros temas com profundidade, a candidatura de Bernie Sanders fica ainda mais limitada na sua resposta ao domínio de Joe Biden nas últimas duas semanas.
Por outro lado, o adiamento de eleições primárias em alguns estados (que pode continuar nos próximos dias) e o sucesso de Sanders na recolha de apoio financeiro podem dar-lhe espaço para se manter na corrida por mais tempo – Biden fica impedido de alargar o fosso de uma forma decisiva nos próximos tempos, sem poder contar com os delegados do Ohio e dos outros estados que adiaram as primárias, e Sanders pode querer continuar a somar o maior número de delegados possível para ter mais margem de manobra para negociar a nomeação.
Só que a dinâmica da corrida foi profundamente alterada nos últimos dias, e ninguém pode garantir que haverá uma convenção nacional do Partido Democrata em Julho – pelo menos, será difícil que ela decorra da forma tradicional, com milhares de pessoas reunidas num pavilhão durante quatro dias consecutivos.
Do lado da liderança do Partido Democrata e da campanha de Joe Biden, o desejo é que Bernie Sanders desista da corrida o mais rapidamente possível, para que o partido possa concentrar-se na oposição ao Presidente Donald Trump.
E as presidenciais?
A suspensão de eleições primárias por causa do novo coronavírus alimentou também uma discussão sobre a hipótese de as eleições presidenciais virem a ser adiadas. Mas, para que isso aconteça, não basta a vontade do Presidente dos Estados Unidos.
Os estados têm quase total autoridade sobre as eleições locais (Nova Iorque, por exemplo, suspendeu as eleições primárias para a câmara, que viriam a ser ganhas por Michael Bloomberg, no dia 11 de Setembro de 2001).
Mas as eleições presidenciais seguem uma lei federal de 1845. Para que a data possa ser alterada, será preciso modificar a lei – e isso só acontece com a aprovação das duas câmaras do Congresso e a assinatura do Presidente, e após um longo período de possível contestação nos tribunais até ao Supremo.
Para dificultar ainda mais a obtenção de um consenso político numa época de grande divisão entre o Partido Democrata e o Partido Republicano, a suspensão da data das presidenciais não seria suficiente para resolver o problema.
Depois disso, seria preciso marcar uma nova data, o que exigiria uma alteração não apenas à lei federal, mas também à própria Constituição – é lá que se exige a tomada de posse de um novo Congresso a 3 de Janeiro e de um Presidente a 20 de Janeiro.
Para que a Constituição dos Estados Unidos possa ser alterada, é necessário iniciar um processo longo e que poderia agravar ainda mais as divisões no país.
Em qualquer caso, é preciso que a Câmara dos Representantes e o Senado proponham uma emenda, aprovada com dois terços dos votos, e que três quartos dos 50 estados aprovem essa proposta; ou que três quartos dos 50 estados peçam ao Congresso que realize uma convenção constitucional, e que depois o mesmo número de estados aprove a proposta. Em ambas as situações, as decisões finais têm de ser tomadas ou por votação nos congressos de cada estado, ou em convenções especiais para ratificar a proposta de emenda.