Quem tem medo da adopção?
A família precisa de tempo para mudar. Precisa de mais uma oportunidade. E mais outra. Enquanto isso, a criança aguarda em banho-maria por um projecto de vida alternativo ao acolhimento. E cresce, tantas vezes, até uma idade em que dificilmente se consegue depois um processo de adopção. Porque é já adolescente.
O processo de adopção é, em tantas e tantas situações, a única e derradeira forma de salvaguardar a promoção do direito de pertença da criança a uma família, o seu bem-estar e o desenvolvimento harmonioso e adequado das suas potencialidades. Não obstante estarmos todos de acordo sobre o direito da criança a viver no seio de uma família que a proteja, assistimos muito frequentemente a situações em que se permite que a criança vá crescendo em acolhimento residencial… e crescendo… enquanto à família biológica são dadas sucessivas e intermináveis oportunidades de mudança. Mudança esta que não chega a acontecer em tempo útil para a criança.
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O processo de adopção é, em tantas e tantas situações, a única e derradeira forma de salvaguardar a promoção do direito de pertença da criança a uma família, o seu bem-estar e o desenvolvimento harmonioso e adequado das suas potencialidades. Não obstante estarmos todos de acordo sobre o direito da criança a viver no seio de uma família que a proteja, assistimos muito frequentemente a situações em que se permite que a criança vá crescendo em acolhimento residencial… e crescendo… enquanto à família biológica são dadas sucessivas e intermináveis oportunidades de mudança. Mudança esta que não chega a acontecer em tempo útil para a criança.
Penso que vale a pena pensarmos um pouco sobre isto.
Os pais são, habitualmente, as principais fontes de perigo para as crianças, que negligenciam ou maltratam de formas muito diversas. Em situações mais limite, e por forma a assegurar a protecção da criança, esta é muitas vezes acolhida. Em acolhimento familiar (um processo que tem ainda muitos passos para dar) ou residencial. Protegida a criança, urge ajudar os pais ou outros familiares a melhorarem a sua aptidão parental, potenciando factores protectores e minimizando factores de risco. O primeiro objectivo será sempre a reunificação da criança com a sua família e é nesse sentido que se aposta (e bem) num trabalho de capacitação das famílias.
Esta capacitação implica, no entanto, um potencial de mudança em tempo útil. Quer isto dizer que a família deve reconhecer as suas áreas problemáticas e cooperar com os serviços, permitindo-lhe mudar de forma a minimizar o tempo de permanência da criança em acolhimento. Mas mudar custa. Demora algum tempo. E é preciso dar esse tempo à família. Por isso, as famílias são intervencionadas anos a fio e, muitas vezes, por equipas distintas em simultâneo. A família afirma gostar da sua criança e esta, sem qualquer outra referência afectiva, afirma gostar da sua família. Sorri quando os pais a visitam e são estes sinais de afecto que justificam que se assista passivamente à passagem do tempo. Enquanto a família vai sendo intervencionada, sem que as mudanças surjam de uma forma consistente e por forma a salvaguardar os interesses da criança.
A família precisa de tempo para mudar. Precisa de mais uma oportunidade. E mais outra. Enquanto isso, a criança aguarda em banho-maria por um projecto de vida alternativo ao acolhimento. Cresce com múltiplos cuidadores que, por melhores que sejam, não podem nunca substituir o amor exclusivo de uma família. E cresce, tantas vezes, até uma idade em que dificilmente se consegue depois um processo de adopção. Porque é já adolescente. Porque resiste à ideia de ter outra família que não aquela, a que não a soube cuidar nem proteger, mas ainda assim é a única que tem e conhece.
Quem tem medo da adopção? Os técnicos que hesitam em propor essa medida? Os tribunais, que hesitam em decretá-la?
Penso que sei quem não tem medo da adopção. As crianças que dela precisam, como a única forma de aceder ao colo e ao amor de uma família.