Trabalho, educação, saúde, justiça, fronteiras: um guia para todas as mudanças já em vigor

Como acciono a baixa de apoio aos filhos? O que faço se o meu cartão de cidadão caducar? E se tiver um processo em tribunal? Posso ir ver os meus familiares ao hospital? E marcar uma consulta? As fronteiras estão fechadas? Área a área, aqui ficam as explicações sobre tudo o que vai mudar e mexer com a sua vida nestes dias de excepção.

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Tiago Lopes

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Como funciona o apoio aos pais com filhos em casa?
O apoio destina-se a pais que tenham filhos menores de 12 anos, deficientes ou doentes crónicos, que ficam em casa a partir de segunda-feira, quando encerram as escolas. Os trabalhadores nessas condições terão faltas justificadas, mas mantêm os direitos, excepto a remuneração. Neste cenário, o apoio mensal criado terá um valor correspondente a 66% da remuneração base, dividida entre os 33% pagos pela empresa e os 33% da entidade empregadora. E oscilará entre um mínimo de 635 euros (um salário mínimo nacional) e 1905 euros (três SMN). O apoio só pode ser recebido por um dos pais dos filhos até aos 12 anos, à vez, “independentemente do número de filhos”.

Este apoio estende-se às férias da Páscoa?
Não. Só pode ser usado “fora dos períodos de interrupções lectivas” como as férias da Páscoa (que vão de 30 de Março a 13 de Abril).

Como se concretiza?
O trabalhador só tem de o solicitar à entidade empregadora. O pagamento deste apoio é autorizado de forma automática no momento em que for solicitado pela entidade empregadora “desde que não existam outras formas de prestação da actividade, nomeadamente por teletrabalho”. A parte da remuneração da responsabilidade da Segurança Social é entregue à empresa, que depois efectua o pagamento integral deste apoio ao trabalhador. No caso da função pública, e com excepção do sector empresarial do Estado, o apoio é assegurado “integralmente” pela entidade empregadora.

E quem estiver de quarentena?
Quem tiver de entrar em isolamento profiláctico durante 14 dias decretado por uma entidade de saúde, recebe um subsídio correspondente a 100% da remuneração de referência, tanto um trabalhador por conta de outrem, como um independente. Uma situação distinta de quem tiver sido diagnosticado com a covid-19, que terá um subsídio de 55%, como prevê o regime geral.

E no caso de acompanhantes de crianças de quarentena?
Para quem tiver que acompanhar um filho ou neto, ou outro dependente, em isolamento profiláctico durante 14 dias, também terá direito a uma falta justificada no âmbito do subsídio de assistência a filhos e netos, que não será contabilizada para efeitos do número máximo de faltas atribuídas em cada ano. Neste caso, o subsídio para assistência assegurará 65% do salário do trabalhador. O Orçamento do Estado para 2020 - que continua à espera de promulgação - prevê que este apoio seja equiparado ao da função pública nestes casos e que assegure 100% da remuneração.

Quem decide o recurso ao teletrabalho?
No novo quadro legal, o recurso ao teletrabalho pode ser “determinado unilateralmente pelo empregador ou requerido pelo trabalhador, sem necessidade de acordo das partes, desde que compatível com as funções exercidas”. 

Que apoio têm os recibos verdes?
Os trabalhadores a recibos verdes que estejam a enfrentar uma redução drástica da actividade de forma repentina, seja por falta de encomendas, seja porque há projectos que estão a ser cancelados, vão ter um apoio mensal extraordinário, “correspondente ao valor da remuneração registada como base de incidência contributiva”. Mas há um tecto e, por isso, o montante mensal a pagar pela Segurança Social não será superior a 438,81 euros. A verba é paga “a partir do mês seguinte ao da apresentação do requerimento”, quem estiver em quebra comprovada da actividade e o fizer neste mês de Março poderá receber a ajuda já em Abril. Pedro Crisóstomo

E os independentes que tiverem filhos em casa a partir de segunda-feira?
Quem passa recibos verdes e tem de ficar em casa para cuidar da família terá um apoio extraordinário equivalente a um terço da “base de incidência contributiva mensualizada referente ao primeiro trimestre de 2020”, sendo que, aqui, há um tecto mínimo e um máximo que se pode receber da Segurança Social. O apoio não poderá ser inferior a 438,81 euros (um IAS) e não poderá ser superior a 1097 euros (2,5 IAS). Pedro Crisóstomo

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Empresas

Quem pode requerer o layoff simplificado?
Segundo as regras deste novo modelo “análogo” ao layoff — mais ágil e simples que o normal — podem recorrer as “empresas em situação de crise empresarial”, caso haja “suspensão da actividade relacionada com o surto de covid-19” e “caso haja interrupção das cadeias de abastecimento globais ou quebra abrupta e acentuada de 40 % das vendas”, “com referência ao período homólogo de três meses”. O layoff — suspensão temporária do contrato ou à redução temporária das horas laborais — é aplicável mesmo sem acordo dos trabalhadores. A empresa está, no entanto, obrigada a comunicar as suas intenções com antecedência. Victor Ferreira

O que acontece ao salário dos trabalhadores abrangidos?
O regime simplificado mantém as regras do regime normal. “Os trabalhadores auferem, no mínimo, uma remuneração ilíquida mensal de dois terços, até um limite máximo de três remunerações mínimas mensais garantidas”. Isto significa que ninguém pode ficar a ganhar menos do que o salário mínimo (635 euros) nem receberá mais do que 1905 euros (todos os valores são brutos). A Segurança Social assegura o pagamento correspondente a 70% da remuneração. Victor Ferreira

Que outras formas de apoio existem para as empresas?
Além do adiamento de prazos fiscais, já detalhados num despacho de 9 de Março e todas referentes ao IRC, o Governo abriu uma linha de crédito de 200 milhões de euros para empresas que comprovadamente tenham sido afectadas pela covid-19. Esta dotação, incluída numa linha de financiamento já existente (chamada Capitalizar), está disponível desde o dia 12 de Março e divide-se em duas parcelas, segundo o prospecto já publicado: 160 milhões para reforço de fundo de maneio e 40 milhões para tesouraria. Para as micro-empresas do turismo há uma linha específica de 60 milhões, mas a resolução publicada no Diário da República não fala disto. Victor Ferreira

As assembleias-gerais das empresas podem ser adiadas?
Sim, o Governo determinou que a realização de assembleias-gerais pode derrapar e ser adiadas até à nova data limite de 30 de Junho de 2020. Isto, a menos de um mês da época de assembleias-gerais da generalidade das empresas portuguesas.

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Saúde

O que foi alterado nos hospitais?
Antes de mais o conselho deixado pelas autoridades de saúde: tudo o que são consultas e procedimentos não urgentes (como exames) devem ser adiados. Em alguns hospitais as cirurgias não urgentes também estão a ser reagendadas. No Hospital de Santa Maria, por exemplo, foi criada uma enfermaria só para receber doentes infectados pelo novo coronavírus a que se junta uma unidade de cuidados intensivos. Há circuitos diferenciados nos hospitais para suspeitos de infecção pelo novo coronavírus e para os restantes doentes. Quanto a visitas, são condicionadas. Em alguns hospitais os horários das visitas foram reduzidos e só pode entrar uma pessoa, mas há casos de suspensão total das visitas, como no Hospital de Braga, que só autoriza visitas a grávidas e crianças. Os hospitais privados também já estão a adoptar medidas e a fazer triagem das consultas e exames não urgentes e a reorganizar as suas unidades.

Vão ser contratados mais profissionais de saúde? Como?
Sim. O Serviço Nacional de Saúde pode contratar mais recursos humanos em regime simplificado, sem necessidade de autorização das Finanças. Nestas condições os contratos são a termo e válidos por quatro meses. As mesmas regras são aplicadas ao Hospital das Forças Armadas, Laboratório Militar de Produtos Químicos e Farmacêuticos, Instituto de Acção Social das Forças Armadas, da Direcção-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais e do Instituto Nacional de Medicina Legal e Ciências Forenses. Os contratos podem ser renovados, por iguais períodos, “pelos membros do Governo responsáveis pelas áreas das finanças e consoante o caso, da saúde, da defesa nacional ou da justiça”. Está prevista a contratação de médicos reformados sem limitação de idade, a mobilidade dos profissionais e a suspensão do limite de horas extraordinárias, que é de 150 horas extraordinárias por ano, podendo chegar às 200 horas anuais.

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Educação

Onde ficam os filhos de médicos ou bombeiros?
Mesmo com as aulas interrompidas, cada agrupamento de escolas tem de garantir o acolhimento dos filhos ou outros dependentes a cargo dos “profissionais de saúde, das forças e serviços de segurança e de socorro, incluindo os bombeiros voluntários, e das forças armadas, os trabalhadores dos serviços públicos essenciais, de gestão e manutenção de infra-estruturas essenciais, bem como outros serviços essenciais, cuja mobilização para o serviço ou prontidão obste a que prestem assistência aos mesmos”.

E as crianças que dependem da cantina da escola para ter uma refeição?
O decreto-lei aprovado é claro: “Os agrupamentos de escolas e escolas não agrupadas da rede pública de ensino e os estabelecimentos particulares, cooperativos e do sector social e solidário com financiamento público devem adoptar as medidas necessárias para a prestação de apoios alimentares a alunos beneficiários do escalão A da acção social escolar e, sempre que necessário, as medidas de apoio aos alunos das unidades especializadas que foram integradas nos centros de apoio à aprendizagem e cuja permanência na escola seja considerada indispensável.”

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Justiça

Pode faltar-se a uma sessão de tribunal?
Apenas com um atestado médico se pode justificar a falta no tribunal, caso a diligência seja mantida. 

Se os tribunais estão fechados e as sessões suspensas, os prazos continuam a contar?
Não. Os prazos dos processos ficam suspensos caso as instalações estejam fechadas com o fundamento de risco de contágio pelo novo coronavírus. Isto aplica-se quando se suspendem actos e diligências nos tribunais judiciais, administrativos e fiscais, tribunais arbitrais, Ministério Público, julgados de paz, entidades de resolução alternativa de litígios, cartórios notariais, conservatórias, serviços e entidades administrativas. Essa suspensão de prazos termina a partir do momento em que haja declaração da autoridade pública de reabertura das instalações.

E se os meus documentos caducarem e não conseguir renová-los?
Se por acaso a sua carta de condução ou o seu cartão de cidadão tiver expirado nos 15 dias anteriores ao decreto-lei publicado ontem pelo Governo ou nos próximos 15 dias, as autoridades públicas vão continuar a aceitá-los como válidos. O Governo determina que “o cartão do cidadão, certidões e certificados emitidos pelos serviços de registos e da identificação civil, carta de condução, bem como os documentos e vistos relativos à permanência em território nacional, cuja validade termine a partir da data de entrada em vigor do presente decreto-lei são aceites, nos mesmos termos, até 30 de Junho de 2020”.

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Fronteiras

As fronteiras portuguesas estão fechadas?
O Governo decidiu este sábado realizar controlo pontual das fronteiras terrestres. “Durante o fim-de-semana decorrem acções conjuntas da GNR, SEF e DGS para acções pontuais de controlo da fronteira terrestre”, diz uma nota do gabinete do primeiro-ministro. O comunicado revela ainda que segunda-feira “irá ter lugar uma reunião por videoconferência dos ministros da Administração Interna e da Saúde da União Europeia para definir medidas de controlo sanitário nas fronteiras internas e externas da União Europeia”. Ainda este domingo vai realizar-se uma teleconferência entre o primeiro-ministro e o presidente do Governo de Espanha sobre a gestão da fronteira comum dos dois países.

Os Açores e a Madeira têm regras diferentes para quem lá chega?
Sim. Nos Açores, “todos os passageiros de voos do exterior que aterrem na Região estão, a partir do início da tarde de hoje [ontem], obrigados a cumprir um período obrigatório de quarentena de 14 dias, determinado pela Autoridade de Saúde Regional”, avançou o Governo Regional. Na Madeira, depois de terem sido fechados os portos e marinas à entrada e cruzeiros e iates, de ter sido imposto o controlo de temperatura corporal a passageiros e tripulantes que aterram no aeroporto, o Funchal impôs desde a meia-noite de domingo quarentena obrigatória ou isolamento social para todos os que cheguem à Madeira.