Sangue de doentes recuperados pode ajudar a tratar novo coronavírus

A técnica passa pela administração a doentes de soro sanguíneo obtido do sangue de pessoas que resistiram à doença.

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O uso de soro sanguíneo de pessoas curadas para tratar outras doenças é uma prática antiga Andre Rodrigues

Na ausência de medicamentos ou vacinas para combater o novo coronavírus, vários investigadores em todo o mundo pensam que a chave para tratar a nova covid-19 pode estar no sangue daqueles que já recuperaram da doença.

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Na ausência de medicamentos ou vacinas para combater o novo coronavírus, vários investigadores em todo o mundo pensam que a chave para tratar a nova covid-19 pode estar no sangue daqueles que já recuperaram da doença.

A técnica passa pela administração a doentes que ainda estejam a lutar contra a infecção de soro sanguíneo obtido do sangue de pessoas que já recuperaram da doença covid-19. A ideia é que consigam usar os anticorpos desenvolvidos pelos pacientes já recuperados. 

No último mês, a proposta foi defendida por imunologistas da Universidade John Hopkinsmédicos em Xangai, na China, que já estão a testar o método, e investigadores da empresa farmacêutica Takeda Pharmaceutical, no Japão, que querem criar um novo medicamento com os anticorpos.

O uso de soro sanguíneo de pessoas curadas para tratar outras é uma prática antiga, com mais do que um século, usada quando não há nenhum outro meio de tratamento de uma doença. Um dos primeiros casos de sucesso remonta a 1918, quando médicos nos EUA mostraram que usar transfusões de sangue de sobreviventes da pandemia que ficou conhecida como “gripe espanhola” para tratar doentes graves levou a uma redução de 50% da mortalidade dos pacientes internados no Hospital Naval de Chelsea, em Massachusetts.

A técnica caiu em desuso por volta da década de 1950, com a descoberta de tratamentos mais eficazes, mas voltou a ser usada em 2003, na China, no tratamento de algumas pessoas infectadas com a síndrome respiratória aguda grave (SARS), outro coronavírus, e durante a luta diária contra o surto de ébola entre 2014 e 2016 na Guiné-Conacri, Libéria e Serra Leoa.

“É uma opção que não requer qualquer investigação ou desenvolvimento”, explica Arturo Casadevall, imunologista na Universidade John Hopkins, num comunicado publicado no site da universidade. “É tudo exequível – mas para que comece é preciso algum esforço de organização, recursos e pessoas que tenham recuperado da doença e possam doar sangue.”

Médicos na China que começaram a tratar pacientes infectados com covid-19 com soro sanguíneo de sobreviventes têm reportado resultados positivos, especialmente quando o método é aplicado logo início da doença. Numa entrevista à Al-Jazeera na semana passada, Zhang Wenhong, o líder de uma equipa médica enviada de Xangai a Wuhan, disse que a técnica poderá “reduzir o tempo necessário para tratar a doença de cinco a 10 dias para três a cinco dias”.

“Área muito importante”, diz OMS

O método não está isento de riscos, mas a Organização Mundial da Saúde publicou orientações para garantir a sua segurança já em 2014: o sangue de qualquer dador terá de ser testado para certos agentes patogénicos como as hepatites e o vírus da sida. “É uma área muito importante para seguir”, referiu no mês passado o director do programa de emergência da OMS, Mike Ryan, notando que a técnica tem-se mostrado “eficaz” no combate a outras doenças infecciosas como a difteria.

O uso de soro sanguíneo de pacientes recuperados funciona porque pessoas que recuperam de uma doença ficam com anticorpos, gerados pelo seu sistema imunitário no plasma sanguíneo (a componente líquida do sangue). Ao isolar estes anticorpos, pode-se fornecer uma “imunidade passiva” a pessoas que ainda estão doentes. 

A vantagem conferida por este tipo de imunidade é a sua acção imediata, ou seja, a disponibilidade de anticorpos no organismo do doente logo após a administração do soro. A desvantagem é o carácter temporário dos anticorpos no corpo dos doentes. Uma forma de conseguir imunização activa, produzida pelo próprio organismo, são as vacinas, que implicam a exposição a agentes patogénicos atenuados ou inactivados (de modo a não fazerem mal) ou a pedaços desses microorganismos, para obrigar o corpo a produzir anticorpos contra a doença.