Milhares fogem da Nicarágua de Ortega todos os meses, e a “generosa” Costa Rica precisa de ajuda

Crise política e social no país faz 4000 novos deslocados a cada mês, mais de 100 mil desde a onda de repressão de Abril de 2018. A esmagadora maioria pede asilo na Costa Rica.

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Mais de 300 pessoas morreram nos últimos dois anos nos protestos anti-regime Reuters/OSWALDO RIVAS

Dois anos depois da maior onda de repressão na Nicarágua desde a sangrenta guerra civil da década de 1980, milhares de pessoas continuam a fugir do país todos os meses para escaparem aos abusos do regime do Presidente Daniel Ortega. Segundo os números do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR), as perseguições, ameaças e violações da liberdade de expressão e de imprensa empurram para fora do país 4000 pessoas por mês, num total superior a 100 mil desde Abril de 2018.

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Dois anos depois da maior onda de repressão na Nicarágua desde a sangrenta guerra civil da década de 1980, milhares de pessoas continuam a fugir do país todos os meses para escaparem aos abusos do regime do Presidente Daniel Ortega. Segundo os números do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR), as perseguições, ameaças e violações da liberdade de expressão e de imprensa empurram para fora do país 4000 pessoas por mês, num total superior a 100 mil desde Abril de 2018.

A mais recente crise política e social na Nicarágua começou com a reacção nas ruas da capital, Manágua, contra uma reforma da Segurança Social imposta pelo governo de Ortega. Mas a repressão das autoridades, e de grupos paramilitares armados afectos ao regime sandinista, mergulhou o país numa crise que continua a levar à fuga de jornalistas, estudantes, agricultores ou activistas dos direitos humanos.

“A liberdade de expressão foi restringida de várias formas, desde o fecho de jornais independentes, à apreensão de equipamento, até à detenção de jornalistas durante vários meses”, disse a porta-voz do ACNUR, Shabia Mantoo, na apresentação de um relatório sobre a situação na Nicarágua, que decorreu em Genebra, na Suíça.

No último ano, desde que o Governo retomou o diálogo com os líderes dos protestos, “o número de violações contra a vida e a integridade pessoal tem diminuído”, diz o ACNUR, que vê nisso “uma prova de que o diálogo é um caminho possível e pacífico para solucionar a crise”.

Mas enquanto esse dia não chega, milhares de nicaraguenses continuam a procurar refúgio nos países vizinhos, com destaque para a Costa Rica. Nos últimos dois anos, o país da América Central recebeu 77 mil pessoas em fuga da Nicarágua, e o ACNUR pede agora que o Governo local seja ajudado a enfrentar o impacto do êxodo nos seus serviços de saúde.

“Desde Outubro de 2019, a Costa Rica, com o apoio do ACNUR, tem simplificado os procedimentos para a atribuição do estatuto de refugiado às pessoas reconhecidas como vítimas de perseguição na Nicarágua, o que lhes confere protecção”, disse Shabia Mantoo.

No âmbito da colaboração entre as autoridades da Costa Rica e do ACNUR, 6000 requerentes de asilo “vulneráveis” foram tratados no sistema de saúde público costa-riquenho. “Neste grupo estão incluídas pessoas com doenças crónicas ou incapacitantes, as que precisam de cirurgia, sobreviventes de tortura e pessoas em situação de pobreza extrema”, disse a porta-voz do ACNUR.

Mas a capacidade da Costa Rica, que é o país mais estável da região, também tem limites. E precisa agora de “um apoio financeiro forte da comunidade internacional”, disse ao jornal espanhol El País Sibylla Vrodzinsky, porta-voz regional do ACNUR para o México e América Central.

“É uma situação preocupante. A Costa Rica fez um trabalho muito forte e muito generoso, mas isso provoca também uma pressão enorme”, disse a representante. “Pedimos à comunidade internacional que ajude, não só as pessoas deslocadas, mas também as comunidades que as acolhem. Isto exige recursos significativos.”

Na capital da Costa Rica, San José, o ACNUR encontrou dezenas de nicaraguenses a viverem sem condições mínimas num antigo armazém abandonado, entre paredes improvisadas com chapas de zinco e com um frigorífico que nem sempre funciona. Estão à espera de resposta aos seus pedidos de asilo.

No grupo há jornalistas, estudantes, agricultores, contabilistas. “Todos eles com emprego, família e casa na Nicarágua, e que agora dormem apertados em colchões sujos postos no chão, ou em cima das enormes máquinas que ficaram para trás quando a fábrica foi encerrada”, diz o ACNUR.

“A maioria deles são homens, mas no grupo também há várias mulheres, particularmente vulneráveis a agressões sexuais na rua. Entre as mulheres que vivem nesse armazém, há uma grávida de 18 anos e uma mãe com a sua filha de nove anos.”

No total, o ACNUR estima que 103.600 pessoas fugiram da Nicarágua nos últimos dois anos, a maioria para a Costa Rica, mas também para o Panamá e para o México.