IGF alerta para risco de CTT manterem “monopólio natural” no fim da concessão

Bancada do PS quer saber se os bens da concessão postal vão reverter para o Estado no fim do contrato. Auditoria da IGF conclui que é o serviço público que alimenta os ganhos da empresa.

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Socialistas querem respostas do ministro Pedro Nuno Santos LUSA/JOSÉ SENA GOULÃO

A menos de nove meses do fim do contrato entre o Estado e os CTT, a Inspecção-geral das Finanças (IFG) vem alertar para incógnitas legais sobre a titularidade dos bens da concessão do serviço postal universal (SPU) que podem garantir a esta empresa privada uma “vantagem concorrencial” e a possibilidade de se eternizar num “monopólio natural”, que impedirá outros operadores de disputarem o mercado.

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A menos de nove meses do fim do contrato entre o Estado e os CTT, a Inspecção-geral das Finanças (IFG) vem alertar para incógnitas legais sobre a titularidade dos bens da concessão do serviço postal universal (SPU) que podem garantir a esta empresa privada uma “vantagem concorrencial” e a possibilidade de se eternizar num “monopólio natural”, que impedirá outros operadores de disputarem o mercado.

Esta é uma das principais conclusões da auditoria realizada pela IGF ao “Cumprimento das obrigações de serviço público e ao processo de privatização da CTT – Correios de Portugal SA”, que foi pedida pela Assembleia da República, no âmbito da Lei de Enquadramento Orçamental, e cujo resultado levou os deputados do PS a pedirem esclarecimentos ao Ministro das Infraestruturas e Habitação, Pedro Nuno Santos.

O relatório de auditoria concluiu que existe uma “desconformidade entre a lei/contrato [de concessão] e a situação/titularidade dos bens afectos à concessão” (ou seja, os bens que faziam parte da rede postal pública), que “carece de clarificação”, lê-se no enquadramento da pergunta dirigida ao ministro nesta terça-feira.

As dúvidas surgem porque a lei postal foi alterada em 2012, no Governo PSD/CDS, antecipando a privatização da empresa, que se iniciou em 2013.

Em causa está a reversão gratuita e automática dos bens da rede pública para o Estado, no final do contrato. “A não reversão dos bens no termo do contrato teria como consequência” que, no final deste, só os CTT estariam em “condições para continuar a assegurar a prestação do SPU [serviço público universal], actuando em situação de monopólio natural”.

Com isso, a empresa inviabilizaria, “na prática, a entrada de outros operadores, incluindo o Estado, e a liberalização do mercado”, conclui a auditoria da IGF, que alerta ainda “para a eventual posição de vantagem concorrencial que a empresa detém no final do contrato”.

Segundo o pedido de esclarecimentos do PS, a IGF também conclui que os dados do sistema de contabilidade analítica dos CTT (que permite distinguir os ganhos do SPU dos da actividade comercial e que é escrutinado pela Anacom) para o período entre 2013 e 2017 “evidenciam que a actividade global da CTT depende do SPU”.

Isto porque são “as margens positivas obtidas pela prestação” deste serviço que “compensam o desempenho negativo das restantes actividades”.

Os deputados socialistas querem saber se as alterações à lei introduzidas pelo Governo de Passos Coelho (com Sérgio Monteiro na secretaria de Estado das Infraestruturas) põem em causa a reversão dos bens da concessão.

Em concreto, questionam: “com base nas alterações legislativas ocorridas por altura do processo de privatização (2012/2014), no final do contrato os bens afectos à concessão do SPU passarão para a propriedade da empresa privada CTT ou reverterão para o Estado?”.

Recordam que nos meses que antecederam a primeira fase da privatização (no final de 2013), “o diploma que estabelece as Bases da concessão foi modificado visando a sua adaptação à Lei Postal (Lei 17/2012, de 26 de Abril), como também a preparação das mesmas Bases para a privatização da empresa”.

São estas alterações que introduzem o factor de incerteza quanto ao que se poderá passar a partir de Dezembro de 2020, pois “não são claras quanto à titularidade do Estado relativamente aos bens da concessão que integravam a rede postal pública, os quais permaneceram na esfera privada da CTT, mesmo após o processo de privatização da empresa”.

Se os bens da concessão não forem revertidos para a esfera pública, qualquer outro operador que quisesse prestar serviços postais “seria obrigado a um investimento muito significativo para mobilizar os mesmos meios da CTT”, que neste momento tem uma cobertura geográfica ímpar.

A clarificação destas questões também é importante para definir os trunfos com que o Estado pode contar numa provável renegociação do contrato de concessão com a antiga empresa pública.

Os socialistas sublinham que a auditoria “vem confirmar” que a privatização da empresa (hoje presidida por João Bento, mas liderada, à época, por Francisco Lacerda) “não acautelou o interesse público”.

E reforçam o argumento com outra das conclusões do relatório da IGF: “os padrões de qualidade exigidos na satisfação do SPU, nomeadamente quanto a prazos de entrega, densidade de pontos de acesso, regularidade e fiabilidade do serviço, aferidos pelo cumprimento dos onze objectivos fixados pela Anacom para cada ano, evidenciam uma degradação da qualidade do serviço postal após 2013”.