A ModaLisboa fechou com a viagem à infância de Dino Alves

O último dia da ModaLisboa foi marcado pelos desfiles de Constança Entrudo, Hibu, Awaytomars, Aleksandar Protic, Ricardo Andrez, Ninamounah e Dino Alves.

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As palavras são da designer Constança Entrudo, mas podiam definir a identidade de qualquer jovem na fronteira entre os millennials (nascidos entre 1981 e 1996) e a geração Z (os que nasceram entre 1995 e 2012): “Não conseguimos realmente mostrar quem somos.” É com a performance I don’t know if this exists” que arranca o último dia da 54.ª edição da ModaLisboa. Na fila para a sala Lab estão sobretudo jovens. Este não é um desfile tradicional, os modelos estão parados e fazem parte de telas vivas, numa colecção centrada no corpo humano em relação com a pintura, a escultura, o som e, claro, a moda.

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As palavras são da designer Constança Entrudo, mas podiam definir a identidade de qualquer jovem na fronteira entre os millennials (nascidos entre 1981 e 1996) e a geração Z (os que nasceram entre 1995 e 2012): “Não conseguimos realmente mostrar quem somos.” É com a performance I don’t know if this exists” que arranca o último dia da 54.ª edição da ModaLisboa. Na fila para a sala Lab estão sobretudo jovens. Este não é um desfile tradicional, os modelos estão parados e fazem parte de telas vivas, numa colecção centrada no corpo humano em relação com a pintura, a escultura, o som e, claro, a moda.

Constança Entrudo começou a carreira como designer em Londres, onde estudou Design Têxtil na Central Saint Martins. Passou pela Marques’Almeida, Peter Pilotto e a Balmain. Em 2017, lança a marca homónima na ModaLisboa.

Quando se entra na sala, percebe-se de imediato a assinatura de Constança Entrudo em cada peça. A técnica de linhas, através da qual a designer se notabilizou, foi reinventada para o próximo Outono/Inverno, criando imagens distorcidas. “Esta colecção é muito mais pessoal e conceptual”, conta a designer de 26 anos ao PÚBLICO.

Tudo foi pensado nesta instalação artística. O som foi desenvolvido por Dexter e João Ervedosa com voz de Maria Amor. O poema da música foi escrito por Constança Entrudo. “Foi um diário que comecei a escrever durante uma pequena crise existencial que tive e depois descobri que toda a gente a sente”, explica. O maior desafio, conta Constança Entrudo, foi conseguir “um todo coerente”. Os modelos parecem fundir-se com as pinturas que os rodeiam, como se fossem um só. Em vez de sapatos, são esculturas que simulam os saltos de umas sandálias, por exemplo.

Naquela sala, não se está em 2020, mas em 2040. A designer sente que “o mundo evoluiu tão rápido” e é uma questão que procura explorar a cada colecção. “Sou obcecada com o futuro e o conflito geracional que vivemos hoje em dia”, resume.

Hibu e a inexistência da identidade de género

Os desfiles continuam na sala Lab com a Hibu. Na passerelle entra um conjunto em ganga. São exactamente as gangas orgânicas e reutilizadas que dominam os coordenados do desfile da marca. Marta Gonçalves, designer e directora criativa da Hibu, aposta em peças oversized, com a particularidade de não terem género, dando ênfase ao “conforto, durabilidade e utilidade”.

Na linha do conforto, as propostas da designer para a estação fria jogam com acolchoados, bombazines e malhas. No último coordenado, desfila um casaco puffer com um padrão de pequenas cadeiras.

A plateia é surpreendida quando o “modelo” é afinal um artista urbano que desenha, numa “tela” no final da passerelle, uma cadeira semelhante ao padrão do casaco que enverga.

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Hibu ModaLisboa

A colecção 100% biodegradável da Awaytomars

De regresso à sala principal de desfiles das antigas Oficinas Gerais de Fardamento e Equipamento, é hora de conhecer a colecção da Awaytomars, o colectivo de designers fundado por Alfredo Orobio e Marília Biasi.

Quando a Awaytomars nasceu representava cerca de 40 designers, hoje são mais de 16 mil. Para cada colecção contribuem entre 500 a mil. Para o próximo Outono/Inverno, Alfredo Orobio e Marília Biasi inspiraram-se nos buracos negros do universo. “Quando a luz entra num buraco negro, ela perde completamente a forma, cor, tempo e espaço”, começa por explicar Orobio ao PÚBLICO.

O primeiro coordenado a entrar na passerelle é um macacão azul-escuro. Sedas com cânhamo, cetins, malhas e lãs orgânicas são usados em peças com silhuetas simples. Para os primeiros testes da colecção, a Awaytomars utiliza peças antigas enviadas por consumidores que queiram contribuir. Para esta colecção, que reinventa clássicos da alfaiataria, a marca contou também com o apoio Savile Row, a conhecida rua de alfaiatarias de Londres. Com restos de tecido e retalhos, Marília Biasi desenhou até um vestido de noite inspirado no fato de negócios masculino.

Esta é a primeira colecção 100% biodegradável do colectivo. “Qualquer peça que alguém enterrar, desaparece”, esclarece Alfredo Orobio. Alinhada na tendência da sustentabilidade, um dos pilares da marca, a Awaytomars só produz por pré-encomenda.

Para facilitar o processo criativo, a Awaytomars está a desenvolver, em parceria com a IBM e a Universidade de Cambridge, uma tecnologia de inteligência artificial que reconheça padrões idênticos nas ideias que a marca recebe. “Se eu mandei uma ideia e essa é seleccionada pelo padrão, também vou receber uma percentagem dos lucros quando essa peça for vendida”, exemplifica Alfredo Orobio.

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“Juntar novamente os géneros”

Um vestido curto em cabedal com um fecho abre a passerelle de Ricardo Andrez. Para a colecção de Outono/Inverno, o designer continuou a apostar em tecidos dead stock, ao dar-lhes outra abordagem. “O maior desafio é em termos da quantidade de material que temos”, explica Andrez ao PÚBLICO.

Em termos de formas, o desfile apresenta algumas novidades para a marca: o volume. “Tenho peças com mais de dez metros de tecido. Nunca tinha trabalhado este tipo de peça mais imponente”, sublinha o designer. Os vestidos compridos oversized são um dos destaques da colecção, bem como as calças abalonadas.

O objectivo é que qualquer peça da colecção possa ser utilizada por mulheres e homens. “O no gender é um conceito que eu já tinha desenvolvido há muitas estações. Gradualmente afastei a mulher do homem. Agora, fez todo o sentido juntar novamente os géneros”, defende Ricardo Andrez.

Os drapeados de Aleksandar Protic

Com uma linguagem mais gráfica e geométrica, para o próximo Outono/Inverno, Aleksandar Protic continua a “descrever impressões sobre personalidades e as suas singularidades”, pode ler-se no descritivo da colecção.

A passerelle do designer sérvio é marcada sobretudo pelo preto. O único padrão é um estampado de várias cores, utilizado sobretudo em pormenores. Protic aposta também no azul clássico, a cor do ano da Pantone. Destaca-se um vestido de noite oversized em veludo azul.

O veludo é exactamente um dos tecidos mais utilizados, além das sedas. O resultado são peças leves e fluidas, nos drapeados que já vêm sendo a assinatura de Aleksandar Protic.

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A irreverente estreia de Ninamounah

Na sala de desfiles, soa uma música estridente com risos maquiavélicos. A primeira modelo entra na passerelle, traz calçadas umas botas pretas com uns chifres na biqueira.

É a estreia da marca holandesa Ninamounah em Portugal e a primeira vez que uma marca estrangeira desfila na ModaLisboa. “Complete Metamorphosis” é a proposta para a próxima estação, onde o deadstock é trabalhado com intensidade.

Peças de alfaiataria são desconstruídas e sobrepostas. Num dos coordenados, a modelo usa um emaranhado que gravatas de vários padrões. São os acessórios, no entanto, a captar a atenção da plateia. Podem parecer bolsas normais para os mais distraídos, mas cada uma delas representa os órgãos genitais masculinos e femininos.

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Aleksandar Protic ModaLisboa

Os últimos coordenados são verdadeiras surpresas, já que só têm parte da frente, atrás é como se o modelo viesse nú.

“Ontem, hoje e amanhã”

É o veterano Dino Alves a encerrar a 54.ª edição da ModaLisboa. Na passerelle, o fumo branco simula um filme de mistério. Por entre a bruma, surge uma criança, numa analogia ao menino que cresceu na província. Dino Alves nasceu em Anadia e lá “construiu uma parte si”. Em memória da sua educação religiosa, cada modelo desfila com um fio dourado com uma cruz ao peito. Lãs, viscoses, sarja e ganga são usadas em peças clássicas, que misturam o antigo com o futurista.

O designer mistura o xadrez com as riscas e as bolas. As transparências dão um ar actual à colecção, que parece reunir o consenso da plateia, que fotografa e filma. As saias que parecem ter sido calças e que afinal são vestidos são os exemplos perfeitos de uma estética quase punk.

Ao som da voz de José Cid, “Ontem, hoje e amanhã”, os modelos desfilam perante uma plateia que aplaude de pé. O menino da aldeia trouxe as memórias da vida rural e deu-lhe um toque da vida cosmopolita da cidade.

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Nesta viagem ao passado com o olhar no futuro, terminou a 54.ª edição da ModaLisboa, que promete regressar em Outubro para apresentar as colecções de Primavera/Verão. 

Texto editado por Bárbara Wong

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