TPI autoriza investigação a suspeitas de crimes de guerra dos EUA no Afeganistão

Exército norte-americano, Governo afegão e taliban são suspeitos de terem cometido crimes contra a humanidade e crimes de guerra durante o conflito no país. EUA não são Estados-membros do tribunal de Haia.

Foto
Exército norte-americano foi mobilizado para o Afeganistão há quase 20 anos Reuters/Ahmad Nadeem

O Tribunal Penal Internacional (TPI), com sede em Haia, deu esta quinta-feira luz verde à abertura formal das investigações sobre os crimes de guerra e os crimes contra a humanidade alegadamente cometidos por soldados norte-americanos, combatentes taliban e elementos das forças de segurança afegãs, durante o conflito no Afeganistão.

A verdade faz-nos mais fortes

Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.

O Tribunal Penal Internacional (TPI), com sede em Haia, deu esta quinta-feira luz verde à abertura formal das investigações sobre os crimes de guerra e os crimes contra a humanidade alegadamente cometidos por soldados norte-americanos, combatentes taliban e elementos das forças de segurança afegãs, durante o conflito no Afeganistão.

O tribunal reverteu um recurso apresentado por uma instância inferior, que bloqueou as investigações há um ano, por falta de cooperação de Cabul e de Washington, pelas reduzidas probabilidades de sucesso da demanda e porque, nessas condições, o caso “não servia os interesses da Justiça”. 

O TPI tem autoridade para investigar casos de genocídio, crimes contra a humanidade, crimes de guerra e o crime de agressão, quando cometidos ou sofridos por Estados-membros. O Afeganistão é um Estado-membro desde 2003, mas os EUA não fazem, no entanto, parte do TPI, e recusam cooperar com quaisquer investigações.

A administração Trump chegou a impor restrições de viagens e outras sanções a funcionários e juízes do tribunal de Haia, em nome “dos ataques do TPI ao Estado de direito americano”, nas palavras do secretário de Estado, Mike Pompeo.

A decisão desta quinta-feira permite, no entanto, que a procuradora gambiana Fatou Bensouda avance com as diligências, três anos depois de ter apresentado o caso ao tribunal, e após mais de uma década de recolha de prova e identificação de testemunhas.

“[O tribunal] considera que é apropriado rectificar a decisão que foi alvo de recurso, permitindo que a procuradora seja autorizada a iniciar uma investigação sobre os crimes alegadamente cometidos no território do Afeganistão, desde o dia 1 de Maio de 2003”, informou o juiz-presidente, Piotr Hofmanski, citado pelo Washington Post.

As suspeitas sobre crimes cometidos por soldados do Exército e membros dos serviços secretos norte-americanos, destacados no Afeganistão desde 2001, prendem-se com episódios referentes a 2003 e 2004, e, mais concretamente, com testemunhos de quase 700 vítimas, que denunciam “torturas, tratamento cruel, afrontas à dignidade, violações e violência sexual” levadas a cabo na prisão de Bagram – conhecida como a “Guantánamo afegã”.

As forças de segurança leais ao Governo afegão são também suspeitas de terem torturado prisioneiros em centros de detenção por todo o país. Já os taliban serão investigados pelas supostas responsabilidades no homicídio de 17 mil civis desde 2009.

A decisão do TPI surge poucos dias depois de Estados Unidos e representantes do grupo islamista terem assinado um acordo de paz, que tem como objecto principal a retirada faseada das tropas norte-americanas do Afeganistão.