Divergências “sérias” e “graves” limitam cooperação e inviabilizam acordo comercial pós-”Brexit”

Primeira ronda negocial entre a União Europeia e o Reino Unido terminou sem avanços. Equipas retomam as conversações dentro de duas semanas, em Londres.

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Michel Barnier STEPHANIE LECOCQ/Reuters

No final do primeiro round das conversações entre a União Europeia e o Reino Unido para o estabelecimento da sua futura parceria económica e política, o negociador europeu, Michel Barnier, identificou quatro áreas onde as divergências entre os dois blocos são tão “profundas” e tão “sérias” que, a manter-se, limitam o grau de cooperação e inviabilizam a assinatura de um acordo comercial “moderno e sustentável”.

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No final do primeiro round das conversações entre a União Europeia e o Reino Unido para o estabelecimento da sua futura parceria económica e política, o negociador europeu, Michel Barnier, identificou quatro áreas onde as divergências entre os dois blocos são tão “profundas” e tão “sérias” que, a manter-se, limitam o grau de cooperação e inviabilizam a assinatura de um acordo comercial “moderno e sustentável”.

“Para ser muito franco, estas são divergências muito difíceis de resolver. Mas sem progressos nestas matérias não será possível construir uma relação forte e uma parceria económica e de segurança sem precedentes, com um acordo comercial que cubra todas as mercadorias sem tarifas nem quotas e também os serviços, o investimento, a propriedade intelectual e a pesca”, declarou.

As divergências respeitam, grosso modo, as linhas vermelhas que foram traçadas por Londres e Bruxelas antes do início das negociações. Segundo admitiu Barnier, não constituiu nenhuma surpresa verificar que existe um enorme afastamento relativamente à definição dos termos e condições de acesso aos respectivos mercados, isto é, ao respeito (ou não) das mesmas regras laborais, ambientais, fiscais ou de ajudas de Estado. 

Na declaração política que acompanhou o acordo de saída do Reino Unido da UE, os dois lados comprometeram-se em encontrar uma solução que evitasse distorções no mercado e impedisse a concorrência desleal. O Governo de Boris Johnson mostrou-se, entretanto, indisponível para garantir o chamado level playing field, recusando o alinhamento regulatório com os parceiros europeus apesar de assegurar o respeito pelos standards mais elevados.

“Há aqui uma questão de confiança que tem de ser resolvida”, apontou o negociador da UE, que deixou claro que a sua missão é “defender os interesses dos cidadãos, dos consumidores, dos trabalhadores e das empresas europeias, e também do planeta”. O que quer dizer acertar “regras básicas” para que as trocas comerciais entre os dois blocos possam decorrer sem a aplicação das quotas e tarifas que vigoram no quadro da Organização Mundial de Comércio — uma “consequência automática, inevitável e definitiva da saída do Reino Unido do mercado único e da união aduaneira a 31 de Dezembro”, lembrou Barnier.

Mas se já estava a contar com a resistência do Governo britânico nessa matéria, houve outras posições que foram comunicadas pelo negociador britânico, David Frost, que parecem ter apanhado os europeus desprevenidos — e que, segundo dramatizou Barnier, são tão “graves” que “terão um efeito imediato e concreto em termos do nível de ambição da nossa cooperação futura” se não forem revistas.

“O Reino Unido informou-nos que não deseja comprometer-se formalmente com a aplicação da convenção europeia dos direitos humanos, nem consentir que o Tribunal de Justiça Europeu desempenhe o seu papel de intérprete da lei europeia”, revelou, frisando que para a UE esse é um ponto “incontornável”. 

Outro ponto assente para os europeus é que não haverá negociações caso a caso para tratados particulares e ad-hoc ao acordo global de associação que a UE oferece ao Reino Unido. “Não é uma questão ideológica mas prática”, justificou Michel Barnier, afastando um cenário futuro de uma “miríade” de acordos sectoriais que teriam de ser ratificados individualmente pelos 27 Estados membros.

O negociador europeu também rejeitou a hipótese de assinar um acordo final que não inclua “uma solução equilibrada” para o acesso recíproco às águas de pesca. “Uma negociação anual das quotas de pesca de dezenas e dezenas de espécies é totalmente impraticável”, assinalou.