Bióloga portuguesa ganha 1,5 milhões de euros para produzir cevada sustentável
Na Irlanda, Sónia Negrão recebeu uma bolsa de 1,5 milhão de euros no âmbito do prémio Líderes do Futuro na Investigação. A portuguesa quer plantar variedades antigas de cevada e monitorizar o seu crescimento através de drones e inteligência artificial.
A investigadora Sónia Negrão, de 44 anos, acaba de receber esta segunda-feira à tarde um dos prémios Líderes do Futuro na Investigação, atribuídos pela Fundação da Ciência da Irlanda (SFI) em conjunto com o Presidente irlandês, Michael D. Higgins. Uma das dez contempladas por esta iniciativa que distingue investigadores no início de carreira com “resultados excepcionais nas áreas das ciências e da engenharia”, a colaboradora na organização portuguesa GREEN-IT – Biorecursos para a Sustentabilidade recebeu um prémio de 1,5 milhões de euros, tendo sido reconhecida pela sua proposta de produção sustentável de cevada na University College de Dublin, onde é docente, com recurso a drones e inteligência artificial.
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A investigadora Sónia Negrão, de 44 anos, acaba de receber esta segunda-feira à tarde um dos prémios Líderes do Futuro na Investigação, atribuídos pela Fundação da Ciência da Irlanda (SFI) em conjunto com o Presidente irlandês, Michael D. Higgins. Uma das dez contempladas por esta iniciativa que distingue investigadores no início de carreira com “resultados excepcionais nas áreas das ciências e da engenharia”, a colaboradora na organização portuguesa GREEN-IT – Biorecursos para a Sustentabilidade recebeu um prémio de 1,5 milhões de euros, tendo sido reconhecida pela sua proposta de produção sustentável de cevada na University College de Dublin, onde é docente, com recurso a drones e inteligência artificial.
Não que o estudo desta matéria-prima – importantíssima na Irlanda, onde o whisky está “em pleno crescimento”, garante a bióloga – acompanhe desde sempre a portuguesa, que concluiu a formação académica entre a Universidade Nova de Lisboa e o Instituto Internacional de Investigação do Arroz, nas Filipinas. Durante o doutoramento no Instituto de Tecnologia Química e Biológica António Xavier, da Universidade Nova de Lisboa, Sónia Negrão avaliou maneiras de “melhorar a variedade portuguesa de arroz tradicional”, recorrendo a marcadores de ADN. Uma técnica que, explica ao PÚBLICO, permitia uma importante poupança de tempo: desta forma, “conseguíamos ver logo se as sementes e plantas tinham o que precisávamos, em vez de esperarmos pelo crescimento”.
Seguiram-se cinco anos na Arábia Saudita, onde o foco viria a passar do arroz para a salinidade. Mas esta “ocorre apenas em zonas mais áridas”, e a investigadora percebeu que precisava de encontrar um novo objecto de investigação quando, em 2018, foi convidada a dar aulas na Irlanda – “que, naturalmente, não é um país seco”, aponta. “O que há em abundância aqui? Irish pubs.” Assim começou o estudo da cevada, e a bióloga rapidamente encontrou um ponto de partida para a hipótese teórica com que agora é distinguida pela SFI. As sementes deste cereal que hoje plantamos foram “melhoradas artificialmente” para produção em massa, mas, ao mesmo tempo, “requerem muito mais fertilizante”. Por outro lado, as “linhas mais antigas de cevada não produzem tanto”, mas apresentam “traços de resistência às alterações climáticas e ambientais que foram perdidos nesse melhoramento”. E se fosse possível recuperar geneticamente essas características, com vista a uma agricultura mais ecológica? Esta é a proposta de Sónia Negrão.
Uma vez que “as chuvas intensas estão a afectar severamente a produção deste cereal, que tem um impacto significativo na indústria do malte”, a equipa responsável pelo estudo pretende, em Abril, semear 400 linhas “muito antigas” de cevada na Lyons Farm, da Universidade de Dublin. Quando crescem, clarifica a investigadora, estas apresentam “sistemas de raízes muito diferentes das actuais”. Nomeadamente, “são mais fortes”, e, ao mesmo tempo, “não perdem tanta água quando as alagamos”, conseguindo “manter os índices de crescimento”. Uma questão fundamental, porque é justamente a rega excessiva que, muitas vezes, contribui para o stress das plantas. “Sim, porque as plantas também têm stress.”
A cientista vai conseguir monitorizar esse crescimento através do uso de drones. Estes “permitem obter imagens ao longo do tempo”, através das quais vai ser possível determinar se “a planta está a reagir bem” aos estímulos que lhe são dados. Os investigadores também vão ter à disposição uma câmara hiperespectral, que, com 240 canais de cor, permitem analisar “coisas que não conseguimos ver a olho nu, num curto período de tempo”. Esta tecnologia, assinala Sónia Negrão, “já existe há algum tempo, mas era extremamente cara”. Agora, brinca, tornou-se “ligeiramente mais acessível”, custando “só” 80 mil euros.
Os responsáveis pelo projecto também querem “treinar” diferentes aparelhos de inteligência artificial. “Podemos dizer-lhes: ‘Esta planta tem stress, esta não tem stress’. A máquina vê o que acontece e começa a reconhecer padrões”, fazendo com que os investigadores consigam mais facilmente distinguir a cevada saudável daquela que não apresenta as melhores condições. A equipa vai usar o dinheiro recebido no âmbito do prémio Líderes do Futuro na Investigação para adquirir equipamento e melhorar infra-estruturas. Uma das ambições é montar uma estufa e analisar “toda a parte de fotossíntese com uma câmara de fluorescência”.
As linhas de cevada que Sónia Negrão recebeu para agora semear vieram de vários países do Norte da Europa. Algumas destas foram “multiplicadas através de speed breeding”, técnica através da qual “as plantas crescem num ambiente controlado, com 22 horas de luz”. Isto permite a produção de “quatro a cinco gerações” de cevada por ano. Esta é a meta ambiciosa que lhe valeu o reconhecimento por parte do prémio Líderes do Futuro na Investigação, que pretende “investir na massa crítica que, a médio longo prazo, vai causar um forte impacto na economia irlandesa”.
Texto editado por Teresa Firmino