Como é que alterações no relógio biológico afectam o funcionamento dos rins?

As cientistas Diana Priscila Pires, Ana Luísa Gonçalves, Ana Rita Carlos e Cristina Godinho Silva são as vencedoras das Medalhas de Honra L’Oréal Portugal e cada uma vai receber 15 mil euros.

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As quatro cientistas premiadas foram escolhidas entre mais de 80 candidatas Stoyan Nenov/Reuters

Diana Priscila Pires quer melhorar a eficácia de vírus no combate a uma bactéria resistente aos antibióticos. Já Ana Luísa Gonçalves quer avaliar o potencial das microalgas para tratar de forma mais sustentável os efluentes industriais. Ana Rita Carlos pretende perceber o desenvolvimento de uma distrofia muscular. E Cristina Godinho Silva vai aprofundar a forma como o relógio biológico regula certas células nos rins. São estas as cientistas vencedoras da 16.ª edição das Medalhas de Honra L’Oréal Portugal para as Mulheres na Ciência de 2020, que serão entregues esta quarta-feira de manhã no Pavilhão do Conhecimento, em Lisboa.

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Diana Priscila Pires quer melhorar a eficácia de vírus no combate a uma bactéria resistente aos antibióticos. Já Ana Luísa Gonçalves quer avaliar o potencial das microalgas para tratar de forma mais sustentável os efluentes industriais. Ana Rita Carlos pretende perceber o desenvolvimento de uma distrofia muscular. E Cristina Godinho Silva vai aprofundar a forma como o relógio biológico regula certas células nos rins. São estas as cientistas vencedoras da 16.ª edição das Medalhas de Honra L’Oréal Portugal para as Mulheres na Ciência de 2020, que serão entregues esta quarta-feira de manhã no Pavilhão do Conhecimento, em Lisboa.

As quatro cientistas premiadas têm entre 30 e 34 anos e foram escolhidas entre mais de 80 candidatas por um júri presidido por Alexandre Quintanilha. Cada uma das investigadoras receberá 15 mil euros para a sua investigação na área da saúde ou do ambiente. Desde 2004, este prémio já distinguiu 53 jovens investigadoras em Portugal.

Editar bacteriófagos

Como se pode melhorar a eficácia de vírus que combatem uma bactéria resistente a antibióticos? Este é o desafio de Diana Priscila Pires (do Centro de Engenharia Biológica da Universidade do Minho). A cientista pretende desenvolver uma ferramenta de edição genética que consiga melhorar as propriedades antibacterianas de bacteriófagos (ou fagos) – vírus que conseguem infectar e atacar bactérias nocivas. Neste caso, o objectivo é combater a Pseudomonas aeruginosa, uma bactéria resistente a antibióticos, ligada a infecções hospitalares graves e considerada pela Organização Mundial da Saúde uma das bactérias patogénicas prioritárias a combater.

“Pretendo criar uma ferramenta para gerar bacteriófagos com propriedades antibacterianas melhoradas”, salienta Diana Priscila Pires num comunicado sobre o prémio. Afinal, os fagos que combatem a Pseudomonas aeruginosa têm algumas limitações que poderão ser contornadas com a manipulação dos genomas. Além da melhoria das propriedades antibacterianas dos fagos, pretende-se testá-los in vitro e in vivo.

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Diana Priscila Pires DR

O potencial das microalgas

Conseguirão as microalgas assimilar azoto e fósforo que subsistem nos efluentes industriais? Para responder a esta questão, Ana Luísa Gonçalves (da Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto) vai analisar o potencial das microalgas para tratar de formas mais eficiente os efluentes industriais. “O azoto e o fósforo são importantes nutrientes para o crescimento de microrganismos fotossintéticos, como as microalgas”, explica Ana Luísa Gonçalves. “Assim, temos uma cultura de microalgas que, além de contribuir para o tratamento dos efluentes, gera uma biomassa muito rica em pigmentos fotossintéticos, proteínas, hidratos de carbono, lípidos e outros elementos, que pode ser utilizada na produção de pigmentos naturais, biocombustíveis, biofertilizantes, entre outros.”

A cientista vai focar-se no tratamento terciário dos efluentes das indústrias têxtil e da pasta e papel, que poderão assim beneficiar deste trabalho. “As culturas de microalgas consomem luz solar e dióxido de carbono, sem recurso a agentes químicos adicionais, ao contrário dos métodos físico-químicos hoje aplicados”, acrescenta a investigadora.

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Ana Luísa Gonçalves DR

Alterações em células musculares

Quais são os mecanismos e alterações moleculares que desencadeiam a distrofia muscular congénita merosina-negativa (MDC1A)? Ana Rita Carlos (da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa) quer entender como se desenvolve esta forma de distrofia muscular que está associada a mutações genéticas que causam mudanças nas células musculares no útero da mãe e que pode afectar a capacidade de andar ou de engolir. A MDC1A é a forma mais comum de distrofia muscular congénita.

A cientista quer assim identificar os mecanismos que levam às alterações musculares e sobretudo compreender se mutações especificamente no gene LAMA2 podem conduzir ao envelhecimento precoce das células dos músculos. “Se conseguirmos desvendar os mecanismos que desencadeiam esta distrofia, teremos pistas que podem ajudar, no futuro, a identificar quais as moléculas capazes de tratar a MDC1A e dar melhor qualidade de vida a quem dela sofre”, afirma Ana Rita Carlos. O estudo do gene LAMA2 também poderá ser importante para o conhecimento do cancro e do envelhecimento.

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Ana Rita Carlos DR

Explorar o relógio biológico

Como é que alterações no relógio biológico afectam a actividade de um grupo de células imunitárias essenciais para o funcionamento dos rins? Cristina Godinho Silva (da Fundação Champalimaud, em Lisboa) pode ter a resposta. A investigadora já tinha mostrado que o relógio biológico regula as células linfóides inatas de tipo 3 (ILC3) – um grupo de células do sistema imunitário – são cruciais para manter o funcionamento de órgãos como os intestinos.

“Sabemos já que o relógio central localizado no nosso cérebro indica as horas às ILC3, e que estas células são bastante sensíveis às perturbações deste relógio”, refere Cristina Godinho Silva. Mas agora outros resultados indicam que as células linfóides inatas de tipo 2 (ILC2) também são fundamentais para o funcionamento dos rins e pulmões: “No caso das ILC2, sabemos que possuem um relógio biológico interno e que a sua actividade varia consoante a hora e o dia.” Como tal, se a cientista conseguir perceber como é que o relógio biológico regula a actividade destas células, isso poderá contribuir para o desenvolvimento de estratégias para aumentar ou reduzir terapeuticamente a actividades das ILC2. No comunicado adianta-se mesmo que, a nível clínico, isto poderia ajudar a ajustar a actividade benéfica destas células em doenças renais.

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Cristina Godinho Silva DR