Presidente ucraniano demite chefe de gabinete, próximo de oligarca que promoveu a sua eleição
Andrii Bohdan era visto como testa-de-ferro de Ilhor Kolomoiski. Zelensky está a tentar distanciar-se do milionário que foi um dos seus principais apoios eleitorais.
O Presidente Ucraniano, Volodimir Zelensky, demitiu esta terça-feira o seu chefe de gabinete, Andrii Bohdan, apontado como testa-de-ferro do oligarca Ihor Kolomoiski no seio do Governo de Kiev. Foi o mais recente choque entre o chefe de Estado e um dos homens mais ricos da Ucrânia e teve como objectivo mostrar a independência da presidência.
A verdade faz-nos mais fortes
Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.
O Presidente Ucraniano, Volodimir Zelensky, demitiu esta terça-feira o seu chefe de gabinete, Andrii Bohdan, apontado como testa-de-ferro do oligarca Ihor Kolomoiski no seio do Governo de Kiev. Foi o mais recente choque entre o chefe de Estado e um dos homens mais ricos da Ucrânia e teve como objectivo mostrar a independência da presidência.
Zelensky não deu uma explicação para a demissão de um dos seus mais próximos, diz a Reuters. No entanto, a decisão foi tomada depois de a imprensa ucraniana relatar uma série de desavenças entre Bohgan e Andrii Yermak, conselheiro presidencial.
Yermak viu-se subitamente sob os holofotes ao ser uma peça no processo de impeachment do Presidente americano, Donald Trump. O conselheiro presidencial ucraniano encontrou-se com Rudy Giuliani, advogado pessoal de Trump, em Madrid, Espanha, no ano passado, por causa da pressão de Trump para que a Ucrânia investigasse o filho do antigo vice-presidente e pré-candidato democrata à Casa Branca em 2020, Joe Biden. Viu divulgadas as mensagens que trocou com responsáveis americanos. O conselheiro presidencial vai agora substituir Bohdan no cargo.
O antigo chefe de gabinete representou o oligarca Kolomoiski num processo contra o Estado ucraniano por causa da nacionalização do Privatbank, em 2016, quando ficou à beira da insolvência, para proteger os seus 20 milhões de depositários. O banco era propriedade de dois oligarcas: Kolomoiski e Gennadii Bogoliuov, que desde aí não têm desistido de um dia o reaver.
Estado e accionistas têm estado envolvidos em longas batalhas legais (mais de 600) desde 2016 e, em Abril do ano passado, um tribunal ucraniano deliberou que a nacionalização foi ilegal. Fê-lo poucos dias antes do antigo Presidente Petro Poroshenko terminar o seu mandato, sendo depois substituído por Zelensky.
Um teste de stress ao Privatbank concluiu que houve “políticas de empréstimo imprudentes” e, em 2018, o Banco Central ucraniano disse que 97% dos empréstimos estavam ligados a negócios dos principais accionistas, Uma investigação provava que, antes da nacionalização, o banco foi alvo de uma “fraude coordenada e em larga escala por pelo menos dez anos, acabando em Dezembro de 2016”. Kolomoiski e Bogoliuov rejeitam as alegações.
Kolomoiski tem sido apontado como um dos principais entraves às reformas económicas e combate à corrupção na Ucrânia, diz o Kiev Post. A crescente influência do oligarca no executivo levou Oleksandr Daniliuk, um conhecido reformador, a demitir-se do Conselho de Segurança Nacional e Defesa por desentendimentos. Os principais responsáveis do Ministério da Saúde queixaram-se também de que a reforma do sistema de saúde estava a ter adiada.
As ligações de Zelensky a Kolomoiski comprometem a autoridade e independência do Presidente, que na campanha teve um duro discurso anti-corrupção e prometeu uma nova forma de fazer política. “O Presidente quis distanciar-se de Kolomoiski, que não escondia as suas ambições de influenciar a política doméstica e externa”, disse à Associated Press o analista político Vadim Karasev.
Bohdan “nunca quis realmente acabar com a percepção de que ainda estava no campo de Kolomoiski”, afirmou à Reuters Timothy Ash, da empresa de análise BlueBay Asset Management. “A sua saída, se confirmada, será bem recebida pelo mercado por dar esperança de se tratar de um passo em frente nas reformas, que neste momento parecem estar encalhadas”, acrescentou.
Medidor de influência
A pressão sobre os antigos accionistas não tem parado de aumentar. O Fundo Monetário Internacional apoiou a nacionalização do Privatbank para proteger os depositários, mas tem pressionado as autoridades para que “continuem os esforços na recolha das perdas junto de antigos donos”.
“O tratamento dado à situação do Privatbank será um medidor da influência de Kolomoiski na política e processos de decisão do Governo”, disse à norte-americana CNBC Otilia Dhand, vice-presidente da Teneo Intelligence. “É improvável que o FMI aprove qualquer compromisso sobre a nacionalização do banco, o que iria pôr em causa o investimento de 5,5 mil milhões de dólares na sua recapitalização”.
O Presidente ucraniano tem garantido ser um actor político independente e recusa ser uma marioneta de Kolomoiski - proprietário do canal de televisão onde era transmitida a série que o tornou célebre, na qual fazia de um cidadão comum eleito Presidente da Ucrânia. “Não sou um brinquedo nas mãos de Kolomoiski”, disse Zelensky em Março passado.
“Se ele [Zelensky] é realmente um reformador ou se está no bolso de outro oligarca, será determinado pela forma como agir. Muitas palavras agradáveis sobre tópicos de reformas, como a da terra, não vão contar para nada se Zelensky apoiar Kolomoiski na reversão da nacionalização do Privatbank”, disse Ash, desta vez à CNBC.
Depois de vencer as presidenciais contra o antigo chefe de Estado Petro Poroshenko, Zelensky dissolveu o Parlamento e convocou novas eleições, com o seu novo partido, Servo do Povo, a conquistar a maioria absoluta no órgão legislativo. O antigo humorista tornou-se no líder político mais poderoso desde a independência da Ucrânia, em 1991.