Mira Forum presta homenagem a Manuel Resende
Alda Sousa, José Carlos Costa Marques, Osvaldo Silvestre e Rui Manuel Amaral participam este sábado à tarde no Porto, com outros amigos e leitores de Resende, na sessão O poeta compareceu em peso.
O poeta e tradutor Manuel Resende, que morreu no passado dia 29 de Janeiro, aos 71 anos, é lembrado este sábado à tarde, pelas 17h, no Mira Forum, no Porto, por um grupo de leitores e amigos. A sessão intitula-se O poeta compareceu em peso, primeiro verso de uma Arte Poética incluída em Natureza Morta Com Desodorizante (1983), o livro de estreia de Resende: “O poeta compareceu em peso/ Alvo impoluto na sua obra completa/ Sonetos caíam das nuvens e a ilha arqueada da noite abria ali uma boca/ Imputrescível (…)”.
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O poeta e tradutor Manuel Resende, que morreu no passado dia 29 de Janeiro, aos 71 anos, é lembrado este sábado à tarde, pelas 17h, no Mira Forum, no Porto, por um grupo de leitores e amigos. A sessão intitula-se O poeta compareceu em peso, primeiro verso de uma Arte Poética incluída em Natureza Morta Com Desodorizante (1983), o livro de estreia de Resende: “O poeta compareceu em peso/ Alvo impoluto na sua obra completa/ Sonetos caíam das nuvens e a ilha arqueada da noite abria ali uma boca/ Imputrescível (…)”.
Haverá algo parecido com uma mesa, que incluirá a dirigente do Bloco de Esquerda Alda Sousa, camarada de Resende em partilhadas militâncias trotskistas e sua amiga de muitas décadas, José Carlos Marques, que fundou com Resende e outros poetas e tradutores portugueses que então trabalhavam em Bruxelas a revista de poesia e tradução DiVersos, o ensaísta Osvaldo Silvestre, editor do terceiro livro do poeta, O Mundo Clamoroso, ainda (Angelus Novus, 2004) e autor do excelente posfácio que encerra a sua Poesia Reunida, e ainda o escritor Rui Manuel Amaral, um dos amigos do poeta que mais se empenhou em que este reunisse a sua obra poética e que mais tem feito para a divulgar.
No entanto, não se adivinha uma sessão formal, com oradores e público, como se depreende da breve nota de divulgação desta homenagem publicada pelo Mira Forum na sua página do Facebook: “Traga o seu poema preferido, uma memória ou uma fotografia com o poeta para partilhar”.
Foi já neste espaço criado e gerido por Manuela Monteiro e João Lafuente na freguesia portuense de Campanhã que, após um primeiro lançamento em Lisboa, a Poesia Reunida de Manuel Resende, editada pela Cotovia, foi apresentada em Junho de 2018. Uma escolha que não poderia ter sido menos casual. Os dois responsáveis do Mira integraram o círculo mais íntimo de Manuel Resende nos anos de militância política clandestina antes do 25 de Abril. “Ele era o melhor de nós, e já nessa altura tínhamos consciência disso”, diz Manuela Monteiro, acrescentando que, além do mais, “o Manuel era o homem mais bonito do Porto” naquele tempo.
Poliglota autodidacta, tradutor de Kaváfis e Odysséas Elytis, de Henry James, Lewis Carroll ou Samuel Beckett, entre muitos outros, Manuel Resende foi um poeta de ritmo de publicação irregular, em boa medida também pela sua indiferença, se não relutância, à publicação em livro. A sua estreia como poeta, em 1983, passou pouco menos do que despercebida, e é hoje bastante óbvio, à distância de quase 40 anos, que esse livro inicial era demasiado alheio ao tom dominante na época para poder ser devida e atempadamente apreciado.
Natureza Morta Com Desodorizante era de facto um objecto bastante insólito, com os seus poemas longos, oscilando entre a distensão formal e requintes prosódicos, com as suas intrusões de um quotidiano tanto colectivo como mais pessoalmente autobiográfico, as citações, ou desvios, de autores das mais diversas línguas e domínios, ou a presença de tópicos da história política e respectivas atrocidades, que criavam uma singular tensão com essa espécie de derrisório e auto-irónico tom “menor” que foi sempre também uma das marcas desta poesia.
É bem provável que os posteriores Em Qualquer Lugar (&etc, 1997) e o já referido O Mundo Clamoroso, ainda (2004) sejam livros mais conseguidos, mas talvez nenhum deles tenha estado tão à frente (ou, talvez melhor, ao lado) da poesia portuguesa do seu tempo como esse volume inaugural, cujo último e longo poema, A palavra ser etc., termina com estes sugestivos versos:
“(…)
Não é possível, mesmo que queira, escrever
poesia americana, nem portuguesa.
Nem as implacáveis flotilhas de conceitos alemães.
E continuar a falar assim, também já não vale a pena.
Ó, meus amigos, estou aqui, sozinho, a tentar dizer
uns rancorosos acontecimentos pensados
sem ritmo a não ser não me calar.
Houve qualquer coisa, isso sei eu, mas não sei o
que terá sido: Uma insurreição? Uma nota falsa?
A bomba? Apenas a ignorância?”