Ofensiva de Assad em Idlib cria um dos maiores movimentos de deslocados desde 2011
As Nações Unidas dizem que cerca de 520 mil pessoas já foram deslocadas de suas casas em Idlib por causa do avanço das forças de Assad. Ofensiva cria tensões entre a Turquia e a Síria.
As forças leais ao regime de Bashar al-Assad continuam a avançar contra o último bastião jihadista de Idlib, no Noroeste do país, e mais de 520 mil civis já foram obrigados a fugir da província, dizem as Nações Unidas. É um dos maiores movimentos de civis na guerra que se arrasta há nove anos e acontece num momento em que as tensões entre a Turquia e a Síria aumentam, com a morte de cinco soldados turcos.
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As forças leais ao regime de Bashar al-Assad continuam a avançar contra o último bastião jihadista de Idlib, no Noroeste do país, e mais de 520 mil civis já foram obrigados a fugir da província, dizem as Nações Unidas. É um dos maiores movimentos de civis na guerra que se arrasta há nove anos e acontece num momento em que as tensões entre a Turquia e a Síria aumentam, com a morte de cinco soldados turcos.
“Desde 1 de Dezembro que cerca de 520 mil pessoas foram deslocadas das suas casas, e a vasta maioria (80%) são mulheres e crianças”, disse à AFP David Swanson, porta-voz do gabinete de coordenação humanitária da ONU. “Este último deslocamento junta-se a uma situação já terrível no terreno”.
Mais de três milhões de pessoas vivem na província, muitas das quais refugiadas oriundas de outras partes do país desde que a guerra começou, em 2011. Idlib é agora o último bastião das forças jihadistas na guerra e o regime de Assad, apoiado pela Rússia, começou no final de Janeiro uma ofensiva para reconquistar a região. Quando o conseguir, a guerra terá terminado, diz a Al-Jazeera.
A ofensiva no terreno foi precedida por intensos bombardeamentos, muitos a cargo de aviões militares russos, e que já mataram mais de mil pessoas. Com forças blindadas e de infantaria a avançarem, milhares de pessoas fugiram, enquanto os jihadistas ficam o pé. Mas, perante a força militar de Assad, têm perdido terreno. No fim de Janeiro, o regime sírio reconquistou Maaret al-Numan, cidade com grande importância estratégica por ter ligação à auto-estrada que liga a capital, Damasco, a Alepo.
Choque directo
Mas a ofensiva ameaça transformar-se num conflito aberto com a Turquia. Na segunda-feira, as forças de Assad capturaram duas vilas perto da cidade de Saraqeb, e, ao perseguirem combatentes jihadistas, mataram cinco soldados turcos. Foi um dos mais sérios confrontos entre Ancara e Damasco e o Presidente turco, Recep Tayyip Erdogan, respondeu com o bombardeamento de 54 alvos sírios.
“Respondemos aos ataques e vamos continuar a fazê-lo, seja com artilharia ou morteiros”, disse Erdogan, pouco depois da retaliação.
Ancara tem 12 postos de observação militar na zona de segurança de Idlib, resultado dos acordos de Astana, de 2017, entre a Rússia, a Turquia e o Irão. Pouco antes do ataque sírio, os militares turcos tinham reforçado a sua presença com o envio de dezenas de veículos blindados, camiões de abastecimento de combustível e transporte de tanques. Erdogan quer travar a ofensiva síria por recear que causem um novo êxodo de civis em direcção à Turquia, onde estão mais de 3,5 milhões de refugiados sírios.
Receia-se que este choque seja o prenúncio de um maior e, para o evitar, a Rússia assumiu o papel de intermediária entre as partes e tentou acalmar a situação responsabilizando a falta de comunicação pela morte dos soldados turcos. “As tropas turcas estavam a mudar de posições, de noite e na zona de segurança em Idlib, sem informar o lado russo e por isso não conseguimos avisar os sírios”, disse o ministro dos Negócios Estrangeiros russo, Sergei Lavrov, de acordo com a agência TASS.
Rússia como intermediário
Rússia e Turquia têm estado em lados opostas nos conflitos na Líbia e Síria, mas, ao mesmo tempo, têm-se aproximado cada vez mais na economia, energia e indústria de defesa. Moscovo é um dos principais interlocutores na guerra civil síria e, de alguma forma, é visto como travão à actuação de Damasco, e por isso os acordos entre as duas potências têm-se repetido.
“Desde o início da ofensiva que temos visto um ciclo em que as forças do regime sírio atacam, a Turquia queixa-se e a Rússia intervém para abrandar os ataques. Então o processo recomeça”, disse à Al-Jazeera o analista turco Ahmet Evin. “Desta vez pode ser diferente, porque a morte dos soldados turcos aumenta o risco”.
Em meados de Janeiro, Moscovo e Ancara anunciaram um cessar-fogo em Idlib, mas, no final de Janeiro, as forças de Assad retomaram o passo e estão, agora, a poucos quilómetros da capital de província, com grande densidade populacional. E, esta quarta-feira, as chefias militares sírias deixaram um aviso a todos os jihadistas: têm uma última oportunidade para se render, caso contrário entrarão em força na cidade.
Moscovo pode não ter assim tanta influência ao ponto de conseguir travar o avanço sírio em Idlib. “A Rússia não consegue que Assad faça o que ela quer”, disse Alexei Khlebnikov, especialista russo no Médio Oriente e política externa russa. “Moscovo teve grandes dificuldades com Damasco no passado e não vejo Moscovo a ter o controlo completo sobre o que faz no terreno”.