Uma política para aliviar consciências
O interior não se recupera com prémios pecuniários a quem para lá for trabalhar – da mesma forma que não se atraem com uns milhares de euros os jovens que emigraram
A impossibilidade de reverter o declínio do interior de Portugal transformou-se num drama que todos os políticos de todos os partidos de todos os governos tentam resolver com pacotes de medidas destinadas a aliviar as consciências e condenadas a falhar. Este Governo não foge à regra. O seu empenho em inverter o declínio demográfico, económico e ambiental do interior já contemplava reduções no IRC, incentivos à criação de emprego, cortes nos custos com algumas portagens, mudanças de secretarias de Estado para Bragança ou Castelo Branco ou transferências administrativas de vagas cortadas nas universidades do litoral. Agora, quem tiver a ousadia ou coragem de migrar do Portugal urbano para o Portugal “sonolento”, pode até ter direito a apoios que oscilam entre os 2400 e os 4800 euros. Para quê?
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A impossibilidade de reverter o declínio do interior de Portugal transformou-se num drama que todos os políticos de todos os partidos de todos os governos tentam resolver com pacotes de medidas destinadas a aliviar as consciências e condenadas a falhar. Este Governo não foge à regra. O seu empenho em inverter o declínio demográfico, económico e ambiental do interior já contemplava reduções no IRC, incentivos à criação de emprego, cortes nos custos com algumas portagens, mudanças de secretarias de Estado para Bragança ou Castelo Branco ou transferências administrativas de vagas cortadas nas universidades do litoral. Agora, quem tiver a ousadia ou coragem de migrar do Portugal urbano para o Portugal “sonolento”, pode até ter direito a apoios que oscilam entre os 2400 e os 4800 euros. Para quê?
Há nesta mais recente estratégia desvelada pelo Governo um vício e uma virtude. O vício é não reconhecer que o principal combate da luta pelo interior (ou, como se diz agora numa linguagem mais bacteriologicamente pura, pelos “territórios de baixa intensidade”) é reter as pessoas que lá vivem e não criar uma nova campanha de colonização interna. A virtude está, paradoxalmente, no reconhecimento de que algumas zonas do interior estão de tal forma esvaziadas que só sangue novo poderá restaurar as suas dinâmicas mínimas. Os 4800 euros podem servir para premiar os que conseguem um emprego no interior; mas não remuneram as dificuldades e a determinação dos que por lá vivem e resistem à distância e à falta de oportunidades. Não há justiça nesta separação.
O interior não se recupera com prémios pecuniários a quem para lá for trabalhar – da mesma forma que não se atraem com uns milhares de euros os jovens que emigraram. Nem com cortes de IRC circunscritos a 25 mil euros de lucros. É preciso muito mais do que cosmética ou voluntarismo. O interior pode ter uma oportunidade se cada região for capaz de desenhar uma estratégia de desenvolvimento e tiver autonomia e recursos para a executar. Se obras como a recuperação do troço da Linha do Douro até Espanha forem executadas. Se a Iberdrola devolver às populações onde tem barragens o que devolve em Espanha – ou se a EDP tiver de fazer o mesmo. Se houver empresas visionárias e corajosas como a Critical Software que olhem para Vila Real ou Évora como lugares onde há oportunidades a explorar.
Com subsídios e cortes irrisórios de impostos, o Governo pode criar a impressão de que o interior está na agenda. Uma ilusão. O país sonolento continua arredado dos grandes gastos do Estado. As migalhas que sobram dão para aliviar consciências, mas estão condenadas a falhar.