Até sempre, Reino Unido
Neste dia triste para a Europa, projectemos o que se pode ganhar no futuro. Mesmo fora da União, o Reino Unido não pode deixar de a contagiar com o melhor das suas tradições, da sua cultura política e da sua posição aberta perante o mundo.
O Reino Unido vai sair da União Europeia algures entre sinais de alívio e a sensação de que vivemos um dos momentos mais relevantes da história da presente geração. A vida das nações é o que é e agora sobra a angústia até percebermos o que será a União sem os britânicos e o que vai ser do Reino Unido fora do seu espaço geoestratégico natural - pelo caminho, será igualmente importante perceber o que poderá acontecer a Portugal.
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O Reino Unido vai sair da União Europeia algures entre sinais de alívio e a sensação de que vivemos um dos momentos mais relevantes da história da presente geração. A vida das nações é o que é e agora sobra a angústia até percebermos o que será a União sem os britânicos e o que vai ser do Reino Unido fora do seu espaço geoestratégico natural - pelo caminho, será igualmente importante perceber o que poderá acontecer a Portugal.
Há um antes e um depois do dia de hoje, e se não é caso para cairmos no pessimismo extremo, não se vislumbram também grandes motivos para celebrar. A Europa sem o Reino Unido será menos Atlântica, mais estatizante, menos amarrada aos valores da liberdade e também menos ancorada no mais firme parlamentarismo democrático do continente. Será mais pobre.
Não vale a pena hoje discutir como um país com essa cultura política caiu no logro do Brexit. Esqueçamos as mentiras, a manipulação informativa, as promessas populistas ou o choque entre o cosmopolitismo pró-europeu de Londres e os resquícios do império na Inglaterra rural. O que passou, passou e, à margem de todas as coisas feias que aconteceram, é fundamental sublinhar o papel que a audácia teve no sentimento dos britânicos face a uma Europa desalmada e perplexa na crise do euro.
Mesmo que Theresa May ou Boris Johnson estejam longe da grandeza do almirante Nelson, de Wellington ou de Churchill, a decisão de abandonar a União Europeia enquadra-se nesse espírito audacioso que explica Trafalgar, Waterloo ou a resistência na Batalha de Inglaterra em 1940.
A União que deu por estes meses provas de uma insuspeita unidade face ao Brexit vai perder muitas destas qualidades e seguirá em frente. O Reino Unido pode perder influência no seu espaço económico e político natural, arrisca-se a abrir feridas na Irlanda ou na Escócia, mas, não duvidemos que seguirá o seu caminho sem dramas.
O que agora importa é que ambos caminhem em paralelo, perto um do outro. O fim de uma relação de 47 anos no seio da Comunidade e mais tarde União Europeia não bastam para apagar séculos de História. Com um acordo conciliador e de mútuo interesse, o Canal não deixará de ser uma ponte entre duas faces de uma mesma civilização.
Chegados à separação, o que importa é limar arestas, esclarecer dúvidas, enterrar preconceitos e encetar uma nova fase de relacionamento. Teremos de deixar de encarar os britânicos como trânsfugas, como desertores ou os egoístas que merecem punição. O Reino Unido precisa do mercado europeu, mas a Europa precisa da força militar dos britânicos.
Londres precisa de aliados para manter a influência que lhe resta no Mediterrâneo ou no Médio Oriente e a Europa precisa da excelência das suas universidades ou do dinamismo do seu mercado financeiro. Londres precisa da União para cimentar a sua vocação transatlântica, mas a Europa necessita dessa vocação para não se fixar em excesso na Mitteleuropa que uma certa Alemanha ainda encara como o seu jardim das traseiras.
Neste dia triste para a Europa, projectemos o que se pode ganhar no futuro. Mesmo fora da União, o Reino Unido não pode deixar de a contagiar com o melhor das suas tradições, da sua cultura política e da sua posição aberta perante o mundo. Há que encarar a realidade dos factos e avançar. Como a história é fértil em mudanças, o melhor mesmo é olhar para as ilhas, manter os braços abertos aos seus habitantes e saudá-los com um “até mais logo”.