Juiz Carlos Alexandre aceita respostas de António Costa por escrito a 100 perguntas sobre Tancos

O despacho onde consta a decisão do magistrado foi esta segunda-feira transmitido aos advogados presentes na instrução, mas primeiro-ministro ainda pode ser chamado a depor presencialmente.

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Rui Gaudêncio

O primeiro-ministro, António Costa, vai poder responder por escrito às perguntas do juiz Carlos Alexandre, do Tribunal Central de Instrução Criminal. A notícia avançada pela Rádio Renascença foi confirmada ao PÚBLICO por fontes ligadas ao processo. Serão 100 perguntas as que o magistrado titular da instrução do processo de Tancos quer ver esclarecidas por António Costa. Apesar disso, porém, ainda é possível que o primeiro-ministro venha a ser chamado a depor presencialmente.

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O primeiro-ministro, António Costa, vai poder responder por escrito às perguntas do juiz Carlos Alexandre, do Tribunal Central de Instrução Criminal. A notícia avançada pela Rádio Renascença foi confirmada ao PÚBLICO por fontes ligadas ao processo. Serão 100 perguntas as que o magistrado titular da instrução do processo de Tancos quer ver esclarecidas por António Costa. Apesar disso, porém, ainda é possível que o primeiro-ministro venha a ser chamado a depor presencialmente.

O chefe do Governo foi arrolado como testemunha pelo ex-ministro da Defesa, José Azeredo Lopes, um dos acusados neste processo. Foi em Dezembro passado que o juiz de instrução enviou ao Conselho de Estado um pedido de “autorização para prestação de depoimento, presencial”, de António Costa. O magistrado explicava então que, dada a complexidade da matéria e a eventual necessidade de confrontação das pessoas com a prova documental dos autos, todas as declarações teriam lugar nas instalações do Tribunal Central de Instrução Criminal (TCIC), não admitindo depoimentos por escrito ou por videoconferência. 

O Conselho de Estado, de que António Costa faz parte, autorizou que este depusesse por escrito no processo de Tancos, mas não presencialmente. A decisão teve por base a vontade do próprio primeiro-ministro.

No início de Janeiro, o juiz Carlos Alexandre começou por defender que não podia aceder ao pedido feito pelo primeiro-ministro e aceite pelo Conselho de Estado, de prestar depoimento por escrito na fase de instrução do caso de Tancos. E por isso exigiu que a “prestação de depoimento” fosse presencial. Nesse despacho com data de 8 de Janeiro, Carlos Alexandre referiu que “todas as tomadas de declarações a realizar na fase de instrução terão lugar nas instalações do TCIC”, não dando assim lugar a qualquer excepção. E não aceitando, por isso, a decisão que lhe foi comunicada pelo próprio Conselho de Estado.

Apesar ter agora acabado por aceitar a prerrogativa de responder por escrito perante a justiça que António Costa tem enquanto membro do Conselho de Estado, Carlos Alexandre ainda pode vir a exigir a sua presença em tribunal. A lei é clara, como diz o advogado de Azeredo Lopes, Germano Marques da Silva: se não ficar satisfeito com as respostas que receber às suas cem perguntas, o magistrado terá de voltar a inquirir por escrito esta testemunha sobre os aspectos que considera terem ficado por esclarecer. Caso esta segunda ronda de respostas se revele mesmo assim insuficiente na óptica do juiz, a legislação permite-lhe solicitar a presença do chefe do Governo em tribunal. Para isso terá de fazer novo pedido ao Conselho de Estado - que poderá ou não autorizá-lo a ser presencialmente. 

A instrução deste processo que envolve 23 acusados no furto e recuperação do material de guerra de Tancos começou no início de Janeiro. O ex-director da Polícia Judiciária (PJM) Militar, coronel Luís Vieira, foi um dos arguidos já ouvidos. 

O ex-ministro Azeredo Lopes é um dos acusados por suspeita do Ministério Público de que teria tido conhecimento da operação da PJM, à margem da então Procuradora-Geral da República, Joana Marques Vidal, que entregara a responsabilidade da investigação à Polícia Judiciária. 

Nesta segunda-feira, as três testemunhas arroladas pelo ex-ministro da Defesa Azeredo Lopes, o actual chefe de Estado Maior Geral das Forças Armadas, Almirante Silva Ribeiro, o seu antecessor, Pina Monteiro, e o embaixador de Portugal na NATO, apenas disseram que tiveram conhecimento do aparecimento do material de guerra através do ministro quando esse facto já era oficial.

O interrogatório de Azeredo Lopes está agendado para 3 de Fevereiro no Tribunal de Monsanto, onde decorre a fase de instrução deste processo. 

A decisão de ouvir o chefe do Governo presencialmente foi dada a conhecer logo no despacho de abertura de instrução, Carlos Alexandre enviou ao Conselho de Estado, do qual o primeiro-ministro faz parte por inerência do cargo, um pedido de “autorização para prestação de depoimento, presencial, (de António Costa) como testemunha do arguido Azeredo Lopes.

O magistrado explica que, dada a complexidade da matéria e a eventual necessidade de confrontação das pessoas com a prova documental dos autos, todas as declarações terão lugar nas instalações do Tribunal Central de Instrução Criminal (TCIC), não admitindo depoimentos por escrito ou por videoconferência. Entendeu o juiz que para tomar a decisão o Conselho de Estado deveria ter acesso à acusação do processo do furto e recuperação do armamento de Tancos e ao requerimento de abertura de instrução de Azeredo Lopes.

No mesmo despacho divulgado nesta segunda-feira, Carlos Alexandre tece considerações sobre outros temas envolvendo este processo. Entre elas, garante às defesas dos arguidos a possibilidade de acederem aos dois inquéritos relacionados com a operação encoberta da PJ. Só quando tiver acesso à mesma, o principal suspeito do roubo, João Paulino, estará disposta o testemunhar na instrução.

O seu advogado Carlos Melo Alves deixou essa condição clara no dia em que o tribunal tinha agendada a audição do seu cliente. Uma vez que o Ministério Público já teve acesso às acções encobertas, durante a fase de investigação do processo, os arguidos também devem tê-lo, argumentou o advogado na passada quarta-feira. “Neste momento, o jogo não está a ser igual para o Ministério Publico e para a defesa”, criticou. “O meu cliente quer ter acesso a essas acções encobertas para se poder defender”.

Não só Carlos Melo Alves mas outros advogados de defesa dos arguidos querem ler os relatos para perceberem se foram cumpridos pela PJ todos os requisitos legais exigíveis nestas situações. com Ana Henriques