Regressar a Auschwitz
As ideias virulentas derrotam-se à nascença, o que não está a acontecer. Recordar o horror de Auschwitz é a melhor forma de colher argumentos para esse combate.
Há décadas que o Mundo, e em particular a Europa, tentam encontrar respostas para a selvajaria da II Guerra Mundial e do seu máximo expoente, o Holocausto. As razões dessa procura são muitas, mas talvez ninguém como o historiador Timothy Snyder foi capaz de as explicar: “Compreender o Holocausto é a nossa oportunidade, talvez a última, de preservar a humanidade”, escreveu Snyder já no remate da sua incontornável obra Terra Negra, o Holocausto como História e Aviso (Bertrand Editora, 2016). Compreender o mecanismo de assassínio premeditado, planeado e executado com racionalidade e ciência faz parte dessa necessidade. Mas compreender as razões que o determinaram é ainda mais importante nestes tempos em que a intolerância e as ideias extremistas ganham passo até nas mais consolidadas democracias ocidentais.
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Há décadas que o Mundo, e em particular a Europa, tentam encontrar respostas para a selvajaria da II Guerra Mundial e do seu máximo expoente, o Holocausto. As razões dessa procura são muitas, mas talvez ninguém como o historiador Timothy Snyder foi capaz de as explicar: “Compreender o Holocausto é a nossa oportunidade, talvez a última, de preservar a humanidade”, escreveu Snyder já no remate da sua incontornável obra Terra Negra, o Holocausto como História e Aviso (Bertrand Editora, 2016). Compreender o mecanismo de assassínio premeditado, planeado e executado com racionalidade e ciência faz parte dessa necessidade. Mas compreender as razões que o determinaram é ainda mais importante nestes tempos em que a intolerância e as ideias extremistas ganham passo até nas mais consolidadas democracias ocidentais.
A descoberta e a revelação do que aconteceu em Auschwitz continuam a chocar-nos 75 anos depois porque são produto de uma cultura, ou de uma civilização, que nos é próxima. É um produto da Europa, não de uma selva tropical. A sua evocação é útil para nos lembrar como valores essenciais dessa cultura, como a humanidade ou o respeito pela vida, podem ruir de um momento para o outro. Basta que o mal se “banalize” para que milénios de cultura se dissolvam, as estruturas éticas do Estado se fragilizem e aconteçam atrocidades como Auschwitz, o massacre de Nanquim, o terror do Gulag ou o genocídio do Ruanda.
Esta sensação de fragilidade está de volta. O negacionismo da Solução Final ganha adeptos. O radicalismo da extrema-direita normaliza-se nos discursos e nos programas de partidos com assento parlamentar em vários países – até no trabalhismo da era Jeremy Corbyn. O antissemitismo regressou à ordem do dia. A tensão em torno de fantasmas do passado inquina as relações entre a Polónia e a Rússia ou entre a Polónia e Israel. O Presidente da Alemanha, Frank-Walter Steinmeier, gostava que o seu país tivesse aprendido as lições da História “de uma vez por todas”, mas como reconheceu no seu discurso no Fórum Mundial do Holocausto, em Jerusalém, não o pode garantir quando há crianças judias a serem “cuspidas” por colegas nos recreios das escolas.
Regressar aos dias em que se libertou Auschwitz é fundamental para nos apercebermos como a Europa continua sem aprender com os seus erros. Vivemos apenas indícios desses perigos, os tempos são outros e as pessoas também. Mas desvalorizar esses sinais é repetir o alheamento dos anos de 1930. As ideias virulentas derrotam-se à nascença, o que não está a acontecer. Recordar o horror de Auschwitz é a melhor forma de colher argumentos para esse combate.