Iraque pediu aos EUA para preparar saída, EUA dizem que não vão a lado nenhum

Declaração do Departamento de Estado não refere pedido iraquiano. Presença militar no Iraque depende dos iraquianos, mas como o Governo é interino, a validade do pedido fica em causa.

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Manifestantes no Iraque: além de demissões dos governantes, os manifestantes querem o Iraque fora do controlo quer do Irão quer dos EUA MURTAJA LATEEF/EPA

O primeiro-ministro iraquiano pediu esta sexta-feira aos Estados Unidos para enviarem responsáveis ao Iraque para preparar a saída das tropas americanas do país, depois de o Parlamento ter votado uma resolução para a retirada destes militares, e de o Presidente americano, Donald Trump, ter ameaçado o Iraque com sanções se expulsasse as tropas. Os EUA não se referiram directamente a este pedido  mas garantiram que não vão retirar os militares.

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O primeiro-ministro iraquiano pediu esta sexta-feira aos Estados Unidos para enviarem responsáveis ao Iraque para preparar a saída das tropas americanas do país, depois de o Parlamento ter votado uma resolução para a retirada destes militares, e de o Presidente americano, Donald Trump, ter ameaçado o Iraque com sanções se expulsasse as tropas. Os EUA não se referiram directamente a este pedido  mas garantiram que não vão retirar os militares.

O primeiro-ministro do Iraque, Adel Abdul Mahdi, divulgou um comunicado mencionando uma conversa com o secretário de Estado dos EUA, Mike Pompeo, em que lhe pediu para começar a preparar a retirada dos militares, que são actualmente 5000, e que estão no país a convite do Governo iraquiano e com a missão de lutar contra o Daesh (após o assassínio do general iraniano Qassem Soleimani pelo EUA, estes militares estão apenas a focar-se na sua própria protecção, suspendendo a luta contra o Daesh).

O Departamento de Estado dos EUA emitiu uma declaração em que não se referia ao pedido iraquiano, mas dizia que não retirará tropas, porque estas são necessárias para a luta contra o Daesh e para proteger americanos, iraquianos e parceiros de coligação (uma série de países retiraram temporariamente as suas tropas envolvidas na luta contra o Daesh do Iraque, temendo poder ser alvo de retaliação de milícias apoiadas pelo Irão na retaliação pela morte de Soleimani).

“Nesta altura, qualquer delegação enviada para o Iraque seria dedicada a discutir como reforçar a nossa parceria estratégica – não para discutir retirada de tropas, mas a nossa postura certa e apropriada no Médio Oriente”, disse a porta-voz do Departamento de Estado, Morgan Ortagus.

O Iraque argumenta que os EUA ultrapassaram a missão de lutar contra o Daesh. O ataque que matou Soleimani e o comandante de uma milícia iraquiana xiita – reforçando ainda mais o laço entre a milícia xiita e a República Islâmica – levou o Iraque a queixar-se de “uma enorme quebra na soberania” e uma “quebra evidente nos termos da presença das forças americanas”.

Precedentes desfavoráveis aos EUA

No Washington Post, a analista Stacie L. Pettyjohn, do centro de estudos norte-americano RAND Corporation, explicou que as tropas norte-americanas estão no Iraque a convite das autoridades do país, de modo informal, sem qualquer tratado que regule a sua presença, o que quer dizer que o convite pode ser retirado em qualquer altura.

Por outro lado, podem ser levantadas dúvidas sobre a legalidade do pedido feito por um primeiro-ministro interno de um Governo que não pode aprovar leis – Mahdi anunciou a sua demissão em Novembro na sequência de grandes protestos.

Mas a analista também lembra precedentes em que os EUA impuseram a sua presença militar a países sem se importarem com possíveis ou declaradas objecções, e que nestes casos o resultado a médio prazo acabou por ser desfavorável (a vasta maioria das bases e presença militar dos EUA pós-II Guerra são estabelecidas por acordos com contrapartidas para os países que as recebem, e por vezes têm cláusulas em que estes protegem o seu uso para operações que não sejam de rotina).

Em 1958, a Administração Eisenhower ignorou a Turquia e deslocou forças para a base aérea de Incirlik para uma intervenção no Líbano. Ancara não reagiu de imediato, mas mais tarde limitou os direitos de utilização das bases dos EUA.

E em 1975, diz Stacie L. Pettyjohn, a Administração Ford ignorou a proibição do Governo tailandês de usar as suas bases aéreas para a operação de salvamento do navio mercante Mayaguez, tomado pelos Khmer Vermelho do Camboja na fase final da guerra do Vietname. O navio e a tripulação foram recuperados (não sem cerca de 20 baixas militares relacionadas com a operação). A presença militar na Tailândia foi, no entanto, irremediavelmente comprometida: no Verão de 1976, os militares americanos acabaram por sair do país.

“Há semelhanças notáveis entre a política tailandesa durante o incidente do Mayaguez e a política iraquiana actual”, nota Pettyjohn. Democracias “imaturas, com sociedades polarizadas, que vão seleccionar um novo Governo”.

De qualquer modo, diz, o simples facto de os EUA, e a coligação contra o Daesh, estar em pausa justamente numa altura em que combatentes do grupo se reagrupam em zonas montanhosas do Curdistão e levam cada vez mais a cabo acções de guerrilha é um espaço que o grupo não hesitará em usar para se fortalecer.