2020 – O início de um novo ciclo?
Se para os mais crentes nestas matérias o horóscopo parece favorável, o que podemos, no entanto, esperar enquanto nação?
Tradicionalmente, o início de um novo ano corresponde a um momento de reflexão, planeamento e esperanças renovadas num futuro melhor.
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Tradicionalmente, o início de um novo ano corresponde a um momento de reflexão, planeamento e esperanças renovadas num futuro melhor.
Para aqueles mais ligados às matérias astrológicas, o início de 2020 é um momento duplamente especial na medida em que se inicia este ano um novo ciclo de rotação do horóscopo chinês – ano do Rato -, caracterizado, segundo dizem, pela abundância, oportunidades e bons projetos.
Se para os mais crentes nestas matérias o horóscopo parece favorável, o que podemos, no entanto, esperar enquanto nação?
As incertezas de dentro
No que respeita aos riscos internos que Portugal enfrenta, eles resultam, fundamentalmente, de alguns desequilíbrios macroeconómicos que persistem e tendem a agravar-se. Com efeito, conforme referido pela Comissão Europeia (Alert Mechanism Report, de 17 de dezembro de 2020), Portugal apresenta fragilidades em, pelo menos, cinco áreas.
Em primeiro lugar, a situação externa é vulnerável, com a posição líquida do Investimento Internacional em valores bastante negativos, enquanto se observa uma continuada deterioração da balança comercial.
Em segundo lugar, observa-se uma perda progressiva da competitividade, em particular na componente preço, com a produtividade do trabalho relativamente baixa quando comparada com as economias europeias mais avançadas.
Em terceiro lugar, a dívida pública, apesar da projetada trajetória decrescente, permanece em níveis elevados, enquanto o endividamento das famílias e empresas se situa, ainda, acima de níveis adequados (no caso das empresas, o nível de capitalização permanece bastante insatisfatório, com mais de um quarto das empresas a apresentarem em 2018 uma situação liquida negativa).
Por outro lado, apesar da resiliência do setor bancário ter melhorado significativamente, o nível de non-performing loans situa-se ainda em valores preocupantes (os bancos portugueses apresentavam em dezembro de 2018 um rácio de crédito malparado de 9,4%, longe da média na zona euro, que era em meados de 2018 de cerca de 5%). Por fim, o crescimento bastante acentuado dos preços no imobiliário, torna evidente o surgimento de algumas “bolhas”, em particular nas áreas mais pressionadas pelo turismo.
As incertezas de fora
Como pequena economia que é, o desempenho de Portugal está também fortemente condicionado pela envolvente externa.
Nesta perspetiva, as sucessivas revisões em baixa das previsões de crescimento económico mundial, concretamente da economia europeia, agravam os riscos de abrandamento da economia portuguesa (recorde-se que cerca de 80% das nossas exportações correspondem a vendas para países da UE). De acordo com a OCDE, o crescimento da zona euro cairá de 1,9% em 2018, para 1,2% em 2019, 1,1% em 2020, recuperando ligeiramente para 1,2% em 2021, sendo que o crescimento do nosso principal parceiro comercial – Espanha –, cairá de 2,4% em 2018 para 2% em 2019, mantendo-se nos 1,6% em 2020 e 2021.
Os riscos de abrandamento da economia mundial poderão ainda ser agravados por um conjunto diverso de fatores.
Em primeiro lugar, as tensões geradas pela “guerra comercial” entre os EUA e a China, bem como as limitações operacionais da Organização Mundial de Comércio (OMC), não estão ultrapassadas e poderão afetar negativamente o comércio internacional, com consequente efeito no crescimento da economia.
Em segundo lugar, o processo político iniciado em 2016 – “Brexit” –, apesar das enormes dificuldades processuais, quer do ponto de vista jurídico, quer do ponto de vista económico e social, deverá ter desenvolvimentos significativos em 2020, sendo inquestionável o seu impacto negativo, pelo menos no curto prazo.
De igual forma, é expectável que 2020 seja também caraterizado pela manutenção de uma tendência crescente e progressivamente fragmentada de movimentos vox populi. Com efeito, ao observado em Hong-Kong, França, Catalunha, Líbano ou Chile, poder-se-ão juntar as tensões de uma Escócia dividida pelo “Brexit” ou de uma Argentina fustigada por uma crise económica. Refira-se aliás que a incerteza política mundial situava-se, em final de 2019, próximo de níveis históricos máximos, traduzindo esta crescente tensão à escala mundial.
Por fim, destaca-se a complexa situação monetária internacional. Com efeito, num quadro em que as taxas de juro se encontram em níveis historicamente baixos e em que algumas economias se podem, inclusive, financiar com juros negativos, o funcionamento dos mercados financeiros e do sistema bancário enfrenta desafios que, ampliados por um crescente apetite pelo risco, poderão colocar em causa a “aparente” tranquilidade que vivemos.
A certeza …. e um desejo
Independentemente dos riscos internos e externos que Portugal enfrente em 2020, os dados disponíveis permitem, no entanto, retirar uma conclusão: O crescimento modesto da economia não permitirá retirar Portugal do “pelotão dos últimos”. Com efeito, para o triénio que termina em 2021 o crescimento projetado do PIB português situar-se-á claramente abaixo do observado para os países do Visegrado.
Esta trajetória inevitável (?) da economia portuguesa, não nos deve, no entanto, desmobilizar.
Antes pelo contrário. 2020 – ano do Rato –, poderá ser um ano de renovação em que, como afirmam os mais ligados às matérias astrológicas, “todos os riscos devem ser calculados para aumentar as possibilidades de sucesso e para se iniciar um novo ciclo de felicidade”. Se todos nos mobilizarmos nesta renovação, estou certo que poderemos evitar a concretização do provérbio português que envolve navios, ratos e ratinhos...