Não fosse o medo das alturas e Lisboa (quase) podia ter sido assim
A construção em altura é refém de uma “visão conservadora e preconceituosa sobre a cidade”? As montagens da exposição Lisbon Vertigo são uma provocação. Porque Pedro Campos Costa não aceita “que as cidades sejam tratadas como museus”.
Não é que Pedro Campos Costa queira encher Lisboa de torres. Menos ainda de construções transcendentes, mutantes, quase dignas de ficção científica, como as que se divertiu a exagerar. Mas “temos de exorcizar o demónio da construção em altura”, congemina o arquitecto. E para uma cidade adulta com “medo de alturas” projectou uma sátira vertiginosa.
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Não é que Pedro Campos Costa queira encher Lisboa de torres. Menos ainda de construções transcendentes, mutantes, quase dignas de ficção científica, como as que se divertiu a exagerar. Mas “temos de exorcizar o demónio da construção em altura”, congemina o arquitecto. E para uma cidade adulta com “medo de alturas” projectou uma sátira vertiginosa.
Lisbon Vertigo mexe nas “torres” tímidas da cidade e alonga-as para “o que deveriam ter sido”. “Sempre que aparece [um projecto para] uma torre não há uma discussão urbana. Há simplesmente uma negação de uma tipologia urbana, que é perfeitamente possível”, defende o arquitecto que abriu, em 2007, o atelier Campos Costa.
As fotomontagens em exposição na Galeria de Arquitectura no Porto, até 22 de Fevereiro, e à vista de todos numa conta no Instagram (onde um novo ensaio visual é publicado a cada sexta-feira) querem elevar esse debate. Propor uma sessão de terapia colectiva, onde arquitectos, moradores (e ex-moradores) são confrontados com uma cidade muitos metros acima do que, até agora, se permitiram a olhar.
“Os arquitectos questionaram a cidade através de instalações ou montagens, basicamente quase todas utópicas, em várias fases da história da arquitectura”, comenta Campos Costa, lembrando as surreais propostas do atelier florentino “radical” Superstudio, na década de 1960.
“São uma ferramenta muito interessante e que permite que os ‘não-arquitectos’ se questionem, pelo exagero ou pelo contraste, o que faz as pessoas começarem a debater a partir de uma imagem. É uma coisa que eu gosto de fazer: questionar aquilo que andamos a fazer, especialmente sobre a cidade ou sobre o território”, diz o arquitecto, que em 2012 venceu o prémio 40 under 40, que distingue os talentos emergentes da Europa com menos de 40 anos na área da Arquitectura, e no ano seguinte foi o comissário da representação portuguesa na Bienal de Veneza.
As ilustrações propostas pelo estúdio português variam entre as torres à Star Wars do Castelo de São Jorge e um conjunto residencial da Avenida Infante Santo a que, não parecendo, Campos Costa triplicou a altura projectada por José Pessoa. “Por acaso, aquele projecto poderia ter sido assim”, aponta.
Para se distanciarem da “realidade de hoje”, Pedro Campos Costa, Francisco Guedes e Enrica Mazzon procuraram em arquivos online fotografias que mostram Lisboa nos anos 30, 40 e 50. Foi sobre elas que trabalharam, recusando “a condenação de uma visão conservadora e preconceituosa sobre a cidade” que dá lugar a centros vazios, “para serem visitados” e não habitados.
“Eu não aceito que as cidades sejam tratadas como museus”, atira. “Noventa por cento das nossas montagens não são sequer possíveis. Mas eu diria que 10 por cento…” — poderia “realmente ter sido assim”, completamos. Assustados?