O ano Beethoven
Se 2019 foi o ano de Leonardo da Vinci, 2020 é o ano do génio musical alemão Ludwig van Beethoven.
Se 2019 foi o ano de Leonardo da Vinci (500 anos da morte), 2020 é o ano de Ludwig van Beethoven (250 anos do nascimento), o génio musical alemão nascido em Bona, que viveu a maior parte da vida em Viena.
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Se 2019 foi o ano de Leonardo da Vinci (500 anos da morte), 2020 é o ano de Ludwig van Beethoven (250 anos do nascimento), o génio musical alemão nascido em Bona, que viveu a maior parte da vida em Viena.
Beethoven, depois de uma curta estada em Viena em 1786-1787, onde terá tocado para Mozart (o mais provável é ser uma lenda, embora o círculo de Beethoven visse nele um novo Mozart), fixou-se na capital austríaca em 1792, onde veio a falecer em 1827, com 56 anos. O conde Waldstein, um patrono do jovem Beethoven em Bona, escreveu, quando ele partiu, que “pela sua incessante diligência receberia o espírito de Mozart das mãos de Haydn”. A música de Mozart influenciou decerto Beethoven, apesar de o eventual reencontro se ter tornado impossível pela morte prematura de Mozart em 1791. Em Viena, o compositor alemão foi discípulo de Franz Joseph Haydn, uma relação combinada em Bona quando Haydn aí parou, ao regressar de Londres, que seria interrompida por uma crítica mais severa do mestre, embora nunca se tenham quebrado os laços de estima entre os dois. Para perceber melhor a assim chamada “Trindade Vienense” (Haydn-Mozart-Beethoven) falta acrescentar que Haydn e Mozart foram grandes amigos (irmãos maçónicos, tratavam-se por tu apesar da diferença de idades: Haydn era 24 anos mais velho) e se influenciaram mutuamente do ponto de vista musical.
Não é um acaso que Viena tenha sido o sítio onde confluíram três dos maiores compositores de sempre, pois, graças a generoso apoio mecenático, Viena respirava música no final do século XVIII e início do XIX. O trio deu corpo a um período áureo da história da música: o Classicismo, que medeia entre o Barroco e o Romantismo. Se Haydn tem raízes no Barroco, Beethoven já entra pelo Romantismo. E, ao tempo, brilhou, ainda em Viena, outro gigante: Franz Schubert, claramente um romântico, que portou uma tocha no cortejo fúnebre de Beethoven sem imaginar que um ano depois o seguiria na morte, em idade ainda mais prematura do que a de Mozart.
Para se perceber de onde veio Ludwig, não há nada como ir à sua terra natal e visitar, para além da sua modesta casa no centro urbano (o pai, músico, faleceu de alcoolismo, um mal que também afligiu o filho), a exposição “Beethoven: Mundo. Cidadão. Música,” no Bundeskunsthalle. E, para se perceber o que ele se tornou, convém visitar Viena, onde haverá uma mão cheia de mostras, com destaque para uma (“Beethoven move”) no Kunsthistorisches Museum exibindo obras de arte de Goya, Friedrich e Turner, outra (“A tríade da primeira escola de Viena”) na Mozarthaus, cenário dos encontros entre Haydn e Mozart, e ainda outra (“Beethoven entre o mundo humano e o fulgor divino”) na Biblioteca Nacional Austríaca, expondo páginas originais da Nona Sinfonia. Quem não conhece o “Hino à Alegria”, baseado num ode de Schiller? A Nona – uma novidade com o alargamento da orquestra e a junção dos solistas e coro – estreou em Viena com a casa cheia em 7 de Maio de 1824, quando Beethoven já estava praticamente surdo (colocaram-no no palco, ao lado do maestro para ele poder ouvir, depois de o terem dissuadido de reger). O aplauso final foi extraordinário não só em som como em acenos, para que o autor se apercebesse do júbilo geral.
A perenidade dessa música, repleta de vitalidade e esperança, é mostrada pela inclusão de trechos dela na banda sonora do filme “A Laranja Mecânica” de Stanley Kubrick (1971), e pelo facto de uma sua melodia se ter tornado o hino da União Europeia (1985). Mas o génio de Beethoven brilha muito para além das sinfonias. Brilha na ópera “Fidelio”, nos cinco concertos para piano, nas 47 sonatas, nos 16 quartetos de cordas, nas duas missas e um oratório, etc. A recente edição da Deutsche Grammophon das suas obras completas inclui 118 CD, 2 DVD e 3 BD, fornecendo mais de 175 horas de música. Parece muito, mas fica aquém das obras de Haydn (160 CD) e de Mozart (200 CD). Se Beethoven compôs nove sinfonias (deixou apontamentos de uma décima, que agora um programa de inteligência artificial “completou”), Haydn compôs 106 e Mozart 41. Haydn é considerado o “pai das sinfonias,” mas foi o seu aluno que levou o género aos píncaros, ao erguer uma ponte entre o “mundo humano” e o “fulgor divino”.
Bom Ano Beethoven!