Políticos ameaçados na Alemanha: “A situação é muito tensa”
Dos 1241 delitos cometidos contra políticos alemães em 2019, ameaças de morte e ataques a propriedade são a maioria. Sawsan Chebli, do SPD, foi mandada demitir-se do governo de Berlim na véspera de Natal se não quisesse ser assassinada.
Missivas que acabam com “Heil Hitler”, garantias que “estamos a planear como te vamos executar”, pedras atiradas contra portas. Ameaças e outros crimes contra políticos e representantes públicos alemães não têm abrandado: este ano registaram-se 1241 actos criminosos contra eles, informou o Ministério do Interior em resposta a uma questão do grupo parlamentar do Partido Liberal Democrata (FDP). A maioria dos delitos é de autoria da extrema-direita.
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Missivas que acabam com “Heil Hitler”, garantias que “estamos a planear como te vamos executar”, pedras atiradas contra portas. Ameaças e outros crimes contra políticos e representantes públicos alemães não têm abrandado: este ano registaram-se 1241 actos criminosos contra eles, informou o Ministério do Interior em resposta a uma questão do grupo parlamentar do Partido Liberal Democrata (FDP). A maioria dos delitos é de autoria da extrema-direita.
Uma das políticas recentemente ameaçadas, Sawsan Chebli, do Partido Social Democrata (SPD), publicou no Twitter um texto que lhe foi enviado que terminava com “Heil Hitler” e era assinada por um grupo auto-intitulado “soldados da força do Ciber-Reich”.
Chebli, de ascendência palestiniana, seria, segundo a ameaça, “a terceira na lista” de alvos de uma organização extremista, a seguir a Cem Özdemir (de ascendência turca) e Claudia Roth do partido Os Verdes. Se não se demitisse até às 00h do dia 24 de Dezembro do seu cargo no governo do estado federado de Berlim, dizia o texto, seria assassinada. “Ninguém te pode proteger.”
As ameaças ganharam ainda mais peso na Alemanha depois de, em Junho, Walter Lübcke, presidente da Câmara de Kassel (no estado do Hesse), ter sido morto a tiro no pátio de sua casa por um confesso simpatizante de extrema-direita.
Nesse mesmo mês de Junho, a presidente da Câmara de Colónia, Henriette Reker, também foi ameaçada de morte. Reker ficou ferida com gravidade em 2015, durante a campanha eleitoral, depois de ser atacada com uma faca por um apoiante da extrema-direita durante a campanha eleitoral – quando se soube que tinha sido eleita, ainda estava em coma induzido. Tanto Lübcke como Reker foram atacados pelas suas posições pró-refugiados. Aliás, o atacante de Reker diz que a escolheu como alvo porque a chanceler Angela Merkel era impossível de atacar por causa da segurança.
Em Novembro, Martina Angermann demitiu-se da presidência da Câmara de Arnsdorf, no estado federado da Saxónia (Leste), depois de meses a receber ameaças da extrema-direita. As ameaças começaram em 2016, depois da autarca ter condenado o ataque contra um refugiado iraquiano com problemas mentais levado a cabo por quatro homens.
Os media alemães relataram, há meses, a existência de uma lista de alvos feita por uma organização de extrema-direita que estaria a fazer preparativos para atacar alguns políticos. Os nomes dos políticos não foram divulgados. As autoridades prometeram aumentar a luta contra a extrema-direita.
Chebli disse que todas as semanas apresenta 20 a 30 queixas-crime por causa de emails com ameaças ou palavras de ódio. “Já não há um dia em que não receba mensagens de ódio ou insultos, ou comentários racistas ou sexistas”, disse. “O clima está muito envenenado”, declarou.
Em Novembro, Cem Özdemir, que foi co-líder dos Verdes durante uma década antes de se afastar em 2018, denunciou uma mensagem que estava formulada de um modo que o fez levá-la mais a sério, segundo a emissora Deutsche Welle. “Neste momento estamos a planear quando e como te vamos executar: no próximo comício? Ou vamos apanhar-te em frente a tua casa?”
Özdemir está há muito tempo sob protecção policial. As suas posições em defesa de imigrantes ou refugiados valem-lhe ataques da extrema-direita e as críticas ao Presidente turco, Recep Tayyip Erdogan, suscitam ataques dos apoiantes do líder turco (que são numerosos na Alemanha).
Já depois da ameaça escrita, a casa do político foi atacada: Özdemir partilhou uma imagem da porta de sua casa com o vidro partido – quebrada por um desconhecido que atirou uma pedra.
Em 2017, houve 1527 delitos contra políticos ou detentores de cargos públicos como juízes, e em 2018 houve 1256. Como a contagem de 2019 só foi feita até 11 de Dezembro e ainda são incluídos os dados de Janeiro, “o número deverá sem dúvida subir”, diz o diário Die Welt.
Protecção para todos?
“Temos uma situação muito tensa”, resumiu o responsável do segundo maior sindicato da polícia do país (DPolG na sigla alemã), Rainer Wendt, à emissora Deutsche Welle.
Se medidas de protecção permanente não são excepção em políticos a nível nacional, agora há cada vez mais ameaças a nível local, “até contra pessoas com cargos honorários [que trabalham sem ganhar salário]”, disse Wendt.
Na sequência da morte de Lübcke, um responsável da polícia dizia sob anonimato à agência DPA que não havia meios para proteger permanentemente todos os políticos ameaçados.
Os principais crimes, diz ainda o ministério do Interior citado pelo jornal Die Welt são ameaças, discurso de ódio e insultos a par com danos de propriedade. Os autores dos ataques são, na maioria, de extrema-direita (440 casos) mas há também de extrema-esquerda (240 casos) e 11 ligados a “ideologia estrangeira” (uma categoria muito centrada na Turquia, incluindo ataques contra instituições turcas na Alemanha, levados a cabo, por exemplo, por curdos) e em seis casos por motivos “religiosos”. Em 538 casos, não foi possível perceber, ou atribuir, o motivo.
Quanto aos partidos, a CDU (União Democrata-Cristã) da chanceler, Angela Merkel, é a mais afectada, com 161 delitos contra políticos do partido, seguida do partido de direita radical AfD (Alternativa para a Alemanha) com 143, SPD com 118, Verdes com 97, Die Linke (A Esquerda) com 45, a CSU (partido-gémeo da CDU na Baviera) com 13 e FDP com 12.
Chebli deixa, no entanto, uma nota positiva do seu caso. Desde que publicou a ameaça no Twitter, o apoio que recebeu foi “esmagador”.