Estruturas para controlar cheias no Mondego com falta de manutenção e inacabadas, diz Ordem dos Engenheiros

Num comunicado, a Ordem dos Engenheiros diz que “há décadas” está por criar um modelo de gestão do Empreendimento de Fins Múltiplos do Baixo Mondego, tal como foi feito no Alqueva. E que faltam seis bombas “de grande potência e débito que nunca foram instaladas na totalidade”.

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LUSA/PAULO CUNHA

A análise feita pela Ordem dos Engenheiros (OE) ao que ocorreu na bacia do Rio Mondego com as tempestades dos últimos dias deixa pouca margem para dúvidas: “Recordamos que nos últimos dez anos o desinvestimento na manutenção das infraestruturas do país só podia conduzir a situações desta natureza e que a redução e desvalorização do papel dos engenheiros e da engenharia na administração só enfraquece o próprio Estado.”

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A análise feita pela Ordem dos Engenheiros (OE) ao que ocorreu na bacia do Rio Mondego com as tempestades dos últimos dias deixa pouca margem para dúvidas: “Recordamos que nos últimos dez anos o desinvestimento na manutenção das infraestruturas do país só podia conduzir a situações desta natureza e que a redução e desvalorização do papel dos engenheiros e da engenharia na administração só enfraquece o próprio Estado.”

“Como é sabido, o empreendimento de fins múltiplos do Baixo Mondego (EFMBM) foi criado para o controle das cheias que sempre ocorreram e afectaram Coimbra e o Vale do Mondego e para outros importantes fins, tais como a agricultura, a produção de energia, o abastecimento de água à indústria, às populações, à aquacultura e à criação de um espelho de água na frente ribeirinha de Coimbra”, relembra a OE, em comunicado.

Só que o plano não terá sido concretizado na totalidade: “Encontra-se por controlar o Rio Ceira que tem tido contribuições muito significativas, sendo que no vale do Mondego foram feitas algumas obras de regularização em outros afluentes, caso do rio Arunca, faltando ainda construir algumas delas. Neste contexto, um dos afluentes que, com a artificialização, passou a afluir ao novo leito do Rio Mondego abaixo da respectiva cota, teve de passar a ser bombado através de uma central onde estavam previstas seis bombas de grande potência e débito, que nunca foram instaladas na totalidade e onde hoje apenas uma está em funcionamento. Continuamos, pois, perante uma obra inacabada, que foi concebida para funcionar no seu todo e que urge concluir ou, no limite, revisitar a sua concepção.”

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Mas a Ordem acha que, mais importante do que terminar esta instalação das bombas, é fundamental criar uma unidade de gestão que faça a manutenção de todo o empreendimento e fiscalize os sistemas ali colocados. “Tal como aconteceu no Alqueva, a criação de uma unidade gestora é crucial para assegurar a gestão, a conclusão, a monitorização, a manutenção e a defesa dos interesses dos diversos stakeholders, a partir obviamente da definição de um modelo de calendarização e financiamento sustentável”, sublinha a OE.

O comunicado fala mesmo de “incúria do Estado": “Apontar o dedo à falta de manutenção é apontar o dedo à incúria do Estado que não canaliza os impostos dos contribuintes nacionais para apoio aos beneficiários locais, o que não deixa de ser uma boa questão.”

A Ordem dá depois uma explicação para o que aconteceu com o leito do Mondego nestes últimos dias: “Tanto quanto nos foi explicado, foram respeitadas as normas de exploração da Barragem da Aguieira e demais represas a cargo da EDP, em articulação com a APA [Agência Portuguesa do Ambiente], mas os caudais afluentes ao Açude Ponte excederam a sua capacidade, aos quais foram acrescidas as afluências de jusante com origem nos afluentes do Vale do Mondego.” O sistema de diques não foi, portanto suficiente para conter os caudais e evitar as inundações. “A falsa sensação de que o sistema de diques que materializou a artificialização do leito natural do Mondego pode garantir ilimitadamente a segurança das povoações e bens ribeirinhos tem sido ciclicamente posta em causa, por razões sobejamente conhecidas e que interessam resolver”, refere o comunicado.