Claudelice dos Santos: “Bolsonaro coloca o dinheiro à frente dos direitos humanos e ambientais”
Activistas ambientais e de direitos aproveitaram entrega do Prémio Shakarov para condenar prioridades da presidência de Jair Bolsonaro.
Três brasileiros estiveram entre os nomeados para o Sakharov 2019: chefe Raoni, Claudelice Silva dos Santos e, a título póstumo, Marielle Franco. No Parlamento Europeu foram distingidos pela sua luta na protecção do ambiente, em especial da floresta Amazónica, e pela defesa dos direitos humanos.
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Três brasileiros estiveram entre os nomeados para o Sakharov 2019: chefe Raoni, Claudelice Silva dos Santos e, a título póstumo, Marielle Franco. No Parlamento Europeu foram distingidos pela sua luta na protecção do ambiente, em especial da floresta Amazónica, e pela defesa dos direitos humanos.
Numa conferência de imprensa conjunta nesta quarta-feira, vários dedos foram apontados a quem está à frente dos destinos do maior país da América do Sul, o Presidente Jair Bolsonaro. A eurodeputada portuguesa Isabel Santos (PS) diz que “Bolsonaro disparou contra tudo e contra todos: activistas, ambientalistas e indígenas”. Numa breve introdução sobre o líder indígena chefe Raoni, lembrou que, apesar de se afirmar que a expulsão dos indígenas e a desflorestação “começou quando os portugueses chegaram há 500 anos”, hoje “há quem esteja deste lado do atlântico a defendê-los”.
Já a viúva de Marielle Franco, Mônica Benício, diz que a morte da sua mulher mostra um “país racista e homofóbico” e que “não há democracia plena no Brasil enquanto não for respondido quem matou Marielle”. O número saiu-lhe depois naturalmente: 644 dias depois do assassínio da vereadora do Rio de Janeiro, as respostas ainda não chegaram, num contador que não tem fim à vista.
A propósito de Marielle Franco, a eurodeputada alemã Hannah Neumann acabou por destacar o facto de se tratar da primeira pessoa LGBT nomeada para o Prémio Sakharov. Valeu-lhe uma - não habitual - sessão de aplausos por parte dos jornalistas que acompanhavam a sessão.
À conversa com o PÚBLICO, a defensora dos direitos humanos e da natureza Claudelice dos Santos falou também de um Brasil onde “são desconsiderados os direitos humanos e ambientais” em “benéfico do interesse económico”. Uma situação “muito pior” desde que Bolsonaro chegou ao poder, no início deste ano. Este, disse, é um Presidente que “incita o ódio contra os activistas e quem defende a floresta”, chamando-lhes de “preguiçosos e pessoas do atraso”.
Claudelice dos Santos, natural do Pará, diz que no Brasil os ambientalistas são tratados como “eco-chatos”, existindo uma campanha para criminalizar quem dá a cara a defender os recursos naturais. Fala em “ameaças constantes e medo”, medo esse que se materializa nos assassínios de várias pessoas. Nessa larga lista somam-se os nomes do irmão de Claudelice e da sua cunhada, mortos em 2011.
A activista diz ter a certeza que “Bolsonaro coloca o dinheiro à frente dos direitos humanos e ambientais”. Foi, na conferência de imprensa, também uma deixa para o eurodeputado espanhol Miguel Crespo questionar: à custa de quem se está a negociar com o Mercosul?, e apontava para os activistas ali presentes.
Ironia do calendário: nesta mesma tarde de quarta-feira o Parlamento Europeu discutiu se o acordo de comércio com o Mercosul (Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai) é compatível com o novo Pacto Verde Europeu, proposto pela comissão presidida pela alemã Ursula von der Leyen.
A eurodeputada portuguesa Marisa Matias (Bloco de Esquerda) falou em “hipocrisia” e disse que este acordo com o Mercosul é uma sentença de morte à Amazónia e uma ofensa aos activistas finalistas do Prémio Sakharov que o Parlamento Europeu tinha acabado de premiar.
O jornalista viajou a convite do Parlamento Europeu