Doentes crónicos com baixo nível de literacia em saúde recorrem mais às urgências

Estudo promovido pela Escola Nacional de Saúde Pública da Universidade Nova de Lisboa envolveu 412 pessoas com doença crónica, com idades entre os 18 e os 94 anos. Mostra que 55% da população com doença crónica tem níveis inadequados de literacia em saúde

Foto
Rui Gaudencio

Os doentes crónicos e com um nível de literacia em saúde mais baixo utilizam mais vezes os serviços de urgência hospitalares e dos centros de saúde e as consultas de medicina geral e familiar, revela hoje um estudo.

A verdade faz-nos mais fortes

Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.

Os doentes crónicos e com um nível de literacia em saúde mais baixo utilizam mais vezes os serviços de urgência hospitalares e dos centros de saúde e as consultas de medicina geral e familiar, revela hoje um estudo.

O estudo, promovido pela Escola Nacional de Saúde Pública da Universidade Nova de Lisboa (ENSP-NOVA), envolveu 412 pessoas com doença crónica, com idades entre os 18 e os 94 anos, sendo as doenças mais prevalentes a hipertensão arterial, a dislipidemia, a diabetes, a ansiedade e a depressão.

As conclusões do estudo apontam que “55% da população com doença crónica tem níveis inadequados de literacia em saúde” e que esta situação “pode ter impactos significativos na gestão da sua doença”, disse à agência Lusa Ana Rita Pedro, investigadora da ENSP-Nova e responsável pelo estudo Literacia em saúde na doença crónica.

“Contudo, quando comparamos com os resultados a nível nacional que obtivemos em 2016, verificamos que, ainda assim, esta população específica tem níveis de literacia em saúde superiores à população em geral, o que é bom”, afirmou a coordenadora do estudo desenvolvido no âmbito do projecto Saúde que Conta, uma iniciativa de investigação da ENSP-NOVA, com o apoio da Lilly Portugal.

Os resultados revelam também que um maior nível de literacia em saúde se reflecte numa melhor adesão à terapêutica (78%), com os doentes a terem “uma maior percepção da necessidade de tomar a medicação”.

Apontam igualmente que “as pessoas com doença crónica e com um nível de literacia em saúde mais baixo utilizam mais vezes o serviço de urgência hospitalar, as consultas de medicina geral e familiar e a urgência do centro de saúde”.

Também tendem a ter mais doenças crónicas em simultâneo, sublinhou a investigadora, considerando que estas conclusões necessitavam de ser “melhor exploradas e trabalhadas num contexto político nacional”.

O estudo indica ainda que cerca de metade dos inquiridos afirmou não ter apoio em aspectos relacionados com a gestão da sua doença, no entanto, quem gere autonomamente a doença apresenta um nível de literacia em saúde mais elevado.

De acordo com o estudo, nove em cada 10 doentes crónicos não utilizam o SNS24. Ressalvando que esta conclusão “terá de ser melhor explorada no futuro”, Ana Rita Pedro apontou como possível explicação o facto ser uma população com características muito próprias: “são pessoas que vivenciam, experienciam, a sua doença e os desafios que dela advêm há muito tempo, pelo que se calhar não reconhecem a utilidade do SNS24”.

As principais fontes de informação em saúde utilizadas pelos inquiridos são os profissionais de saúde (82,8%), seguindo-se os familiares e amigos (57,7%) e a televisão (55,1%).

Apenas cerca de dois em cada 10 doentes crónicos utiliza a Internet e, destes, apenas 25% procura informação através de plataformas governamentais.

“Os profissionais de saúde continuam a ser a fonte de informação preferencial, credível das pessoas com doença crónica pelo que, cada vez mais, se torna imperativo que estes estejam dotados das competências necessárias para saberem passar a mensagem, saberem ouvir e para saberem informar”, disse a investigadora, defendendo um “investimento nesta área estratégica” para “mudar o panorama da literacia em saúde em Portugal”.

Ana Rita Pedro considerou que já foi dado “um passo muito grande” em 2016 com a criação do Programa Nacional de Literacia em Saúde, mas defendeu que estes temas necessitam de “maturidade política”, de “mais pensamento” e da “criação de estratégias concretas” que envolvam os profissionais de saúde, os decisores políticos, os parceiros e os cidadãos.