Tudo o que é sólido desvanece nos ares
Mais aeroportos, mais aviões, mais turismo, mais delapidação de recursos, mais emissões de gases carbónicos, mais minas, mais materiais, mais lixo, lixo mesmo em cima das pessoas (e a única coisa que não está roto são os seus bolsos), das aldeias e da ruralidade. E mais umas fábricas mirabolantes, sem estudos nem qualquer viabilidade.
“Renunciar aos factos é renunciar à liberdade. Se nada é verdade, ninguém pode criticar o poder, porque não há bases para tal. Se nada é verdade, tudo é espectáculo.”
Timothy Snyder
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“Renunciar aos factos é renunciar à liberdade. Se nada é verdade, ninguém pode criticar o poder, porque não há bases para tal. Se nada é verdade, tudo é espectáculo.”
Timothy Snyder
1. A História não é um mito criativo
Já tinha passado há muito o estudo de 18 localizações para o novo aeroporto de Lisboa e, embora a comissão de Rio Frio continuasse a receber senhas de presença, já alguém tinha proclamado “a Sul do Tejo, jamais!”. Era, então, vereador na Câmara Municipal de Lisboa quando, em reunião do executivo, ouvimos o diretor do LNEC defender com unhas e dentes a opção... da Ota. Tive só que lhe lembrar que a Ota era um paul que teria que ser aterrado, e é certo que estava ladeado por dois montes, mas até um dos maiores criminosos da história tinha inventado um tal Yukong que removia montanhas, com os filhos, os netos e gerações a seguir, mas sobretudo com a ajuda de dois anjos, porque não... e assim até tinham material para aterrar o paul... só que ainda havia as águas subterrâneas.... ai, as águas subterrâneas e até um rio .
Ota, jamais, não sei que fim esses figurões levaram.
Mas, entretanto, negócios e negociatas foram passando debaixo das pontes e o Montijo, que ficara em último lugar no estudo acima mencionado, saiu da cartola.
2. A realidade não é uma criação da Goldman Sachs
O Montijo está em zona Rede Natura, e goza por tal facto de proteção comunitária, que não está sujeita, não é permeável (a zona é o muito!), a indemnizações... No entorno temos várias Zonas de Proteção Especial, além de ocupar ainda parte do Sítio de Importância Comunitária. Além da elevada importância que estas têm em termos de biodiversidade e de serviços de ecossistema, temos ainda um grande risco de colisão das aeronaves com aves de grande parte (incluindo flamingos e cegonhas e outras aves de grande porte).
Aqui, um dos melhores pareceres com dados de quem está no terreno e não num gabinete com ar condicionado.
Mas há mais... O aeroporto existente (em choque com as linhas de voo de grande parte das aves, que não irão reconhecer os sinais, e lá teremos churrasco ou...) não tem espaço, por isso, leiam devagar, tem que ser prolongado em estacaria, em estacas sobre o sapal.
Será que os senhores que contam o pataco sabem que a dinâmica das marés, sem falar de fenómenos geológicos, tem amplitude de vários metros... e não é que decidiram que tinha que ficar poucos, muito poucos acima do nível do mar, que irá aumentar com as emissões, também dos aviõezinhos....recordo dois aeroportos que fecharam, porque os aviões foram à água (em África, lá longe), e há pouco (por causa das aves) um avião aterrou no Hudson.
3. E quem será responsável?
Temos que desde já, o caso dramático que hoje qualquer ignorante vê, o enorme desastre que foi a maior barragem (Alqueva) da Europa que pagamos todos mas sem nenhum responsável, temos que saber quem iremos responsabilizar por este desastre intercalar, uma vez que o objetivo é outro, outro aeroporto (mas e o de Beja, e uma nova centralidade e uma linha de comboio de alta velocidade entre Faro, Beja, Lisboa, Badajoz, Madrid, ah!, esse não é da Goldman Sachs), quem, a quem teremos que pedir contas?
E as colisões que certamente irão ocorrer, com grandes aves, que abundam no estuário e que por obrigação devemos proteger (duas ou três convenções internacionais que nos obrigam, que assinámos, e vamos infringir!), e a IATA, que ainda não disse piu sobre a segurança e o chamado bird strike, o choque com aves. É que aqui não temos falcões que dêem conta... sisões, flamingos, cegonhas coelheiros, e dezenas de diferentes espécies.
Mas depois não haverá, como de costume, responsável... Ponhamos já um nome na placa: António Costa!
4. Contra as alterações climáticas?
Tenho que confessar que me estou completamente, mas completamente, nas tintas para a temperatura que irá fazer no ano 2100, mais quatro, cinco ou seis ou ate dez graus a mais, estou-me completamente nas tintas. Nem o meu neto mais novo (cinco anos) estará vivo nessa altura. Agitar esse papão, e mesmo o aumento de três, quatro graus até 2050 (provável!), deixa-me indiferente.
O mundo irá continuar, talvez melhor, mas estou, e muito, preocupado com a seca, os incêndios, a agitação marítima e o fim das pescas, as ondas de calor e de frio glacial, as tempestades tropicais, várias por ano aqui, a falta de água e o ar contaminado, agora, hoje, hoje mesmo. Agora, mesmo!
E acho que estamos a lidar com uma corja, sim uma corja de hipócritas, de indivíduos da maior leviandade que dizem uma coisa e sem sequer virarem as costas fazem o contrário. São uns descarados.
Mais aeroportos, mais aviões, mais turismo, mais delapidação de recursos, mais emissões de gases carbónicos, mais minas, mais materiais, mais lixo, lixo mesmo em cima das pessoas (e a única coisa que não está roto são os seus bolsos), das aldeias e da ruralidade. E mais umas fábricas mirabolantes, sem estudos nem qualquer viabilidade.
Mas temos a emergência climática e até a menina Greta chegou de barquinho. Podemos tentar romper com isto que parece sólido, podemos começar por dar um murro na mesa e dizer basta, basta, quem julgam que são para continuarem a mentir-nos descaradamente? Nada do que nos dizem é verdade.
Comecemos a desmascará-los! Já, já, agora mesmo.
O autor escreve segundo o novo Acordo Ortográfico