Finalmente o Governo despertou para a corrupção
Se até agora a inércia e conformismo do Governo o embrulhavam na suspeita de tolerância com a corrupção, este plano coloca-o claramente num nível de preocupação que deve ser elogiado.
O Governo parece ter finalmente despertado para a urgência do combate à corrupção. Depois de quase uma década perdida com paliativos, o Ministério da Justiça vai avançar com um caderno de encargos que, se for aprovado pela comissão especializada que os vai analisar e, mais tarde, vertido na lei, será provavelmente a mais ambiciosa estratégia contra a corrupção em muitos anos. Acabar com os megaprocessos que geram labirintos processuais onde a justiça se perde, criar juízos especializados para casos de corrupção mais complexos, avançar com a “colaboração premiada” ou o acompanhamento dos julgamentos pelos magistrados que integraram a investigação é, ou parece ser, um plano consistente e ousado. Mesmo que de fora tenha ficado a sensível questão do enriquecimento ilícito, o que está em cima da mesa é suficiente para que o Governo saia da indiferença que marcou a sua relação com a corrupção e responda a uma das mais urgentes exigências dos cidadãos.
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O Governo parece ter finalmente despertado para a urgência do combate à corrupção. Depois de quase uma década perdida com paliativos, o Ministério da Justiça vai avançar com um caderno de encargos que, se for aprovado pela comissão especializada que os vai analisar e, mais tarde, vertido na lei, será provavelmente a mais ambiciosa estratégia contra a corrupção em muitos anos. Acabar com os megaprocessos que geram labirintos processuais onde a justiça se perde, criar juízos especializados para casos de corrupção mais complexos, avançar com a “colaboração premiada” ou o acompanhamento dos julgamentos pelos magistrados que integraram a investigação é, ou parece ser, um plano consistente e ousado. Mesmo que de fora tenha ficado a sensível questão do enriquecimento ilícito, o que está em cima da mesa é suficiente para que o Governo saia da indiferença que marcou a sua relação com a corrupção e responda a uma das mais urgentes exigências dos cidadãos.
Portugal, é bom dizê-lo, não é o oásis da corrupção que os tremendistas e os arautos da extrema-direita gostam de denunciar. Mas estar no 30.º lugar da lista de 180 países escrutinados pela Transparência Internacional não é motivo para que a corrupção seja encarada como um mal menor. Até porque a posição de Portugal nesse ranking congelou desde 2012, pouco antes de sabermos dos deprimentes contornos do caso do BES ou detalhes dos cofres e dos empréstimos de um amigo ao ex-primeiro-ministro José Sócrates. Pelo caminho, ficámos também a saber que uma comissão parlamentar para a transparência esteve mil dias sem produzir um diploma, ou que Portugal foi em 2018 o país europeu que menos recomendações do Conselho da Europa seguiu em matéria de luta contra a corrupção.
O Governo sabe que o tema da corrupção queima, que histórias como a da concessão de exploração do lítio, negociatas como as das golas antifogo ou o inenarrável segredo dos acordos com a Web Summit se tornaram um ingrediente político fundamental. Avançar com um plano de mudanças legais ambicioso joga a seu favor e afasta as suspeitas de simpatias com a opacidade que começavam a avolumar-se. Muitas das propostas que faz são polémicas – por muito que o Ministério da Justiça queira suavizar os conceitos, uma “colaboração premiada” é uma “delação premiada” e vai ser necessário discutir se esta figura é eticamente tolerável. Mas, se até agora a inércia e conformismo do Governo o embrulhavam na suspeita de tolerância com a corrupção, este plano coloca-o claramente num nível de preocupação que deve ser elogiado.