E depois de Greta?
A COP25 de Madrid não pode ser apenas um afirmar de boas intenções. Temos de passar das palavras aos atos.
Nestes tempos de incertezas, importa começar por afirmar o que devia ser óbvio: as alterações climáticas e os seus efeitos são, para quem não nega a ciência e o conhecimento, indesmentíveis. Há dois dados objetivos e simples: a temperatura média do planeta dos últimos cinco anos foi a mais alta desde que há registos fidedignos (desde 1880) e nunca emitimos tanto dióxido de carbono. E coloquemos a questão de forma simples: se a temperatura média do planeta continuar a subir e ultrapassar os 2º acima dos níveis médios prévios à industrialização não haverá vencedores. Perderemos todos.
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Nestes tempos de incertezas, importa começar por afirmar o que devia ser óbvio: as alterações climáticas e os seus efeitos são, para quem não nega a ciência e o conhecimento, indesmentíveis. Há dois dados objetivos e simples: a temperatura média do planeta dos últimos cinco anos foi a mais alta desde que há registos fidedignos (desde 1880) e nunca emitimos tanto dióxido de carbono. E coloquemos a questão de forma simples: se a temperatura média do planeta continuar a subir e ultrapassar os 2º acima dos níveis médios prévios à industrialização não haverá vencedores. Perderemos todos.
Mas a radicalização de discurso de ambos os lados é prejudicial para todos. De um lado está quem se recusa a acreditar no problema ou que o considera uma questão menor, cuja face mais visível é Donald Trump. Trump retirou os Estados Unidos do Acordo de Paris e continua a agir como se o problema não existisse. Um outro lado considera que tudo está mal no nosso modelo de desenvolvimento e que defende que temos de “desmontar o sistema”, para usar uma frase da figura mais visível deste lado da barricada, Greta Thunberg.
O Acordo de Paris não é um acordo comercial entre países ou comunidades, não há uma troca entre Lisboa e São Paulo ou entre Barcelona e Xangai. A imposição de sanções ou encerramento de fronteiras não faz o problema desaparecer porque a natureza não conhece as fronteiras dos humanos, nem os fenómenos climáticos extremos nelas se detêm.
E, numa questão de inegável importância, assistimos a um conflito instalado entre dois grupos de discursos extremistas, que querem à força fazer crer que há apenas dois caminhos:
1. Abdicar do crescimento económico, abdicar da melhoria das condições de vida das populações, voltando a tempos de pobreza energética e alimentar. No fundo, ignorar os progressos da economia social de mercado. Alimentar os conflitos, atacando as gerações anteriores. Greta Thunberg diz que lhe roubaram a infância e os seus sonhos, esquecendo que vive num dos países mais ricos do mundo, com um Estado Social que garante acesso a educação, saúde e proteção social. O que responderão as crianças sírias, numa sociedade devastada, ou de tantos países africanos que ainda esperam que o desenvolvimento económico os retire de níveis de pobreza avassaladores? O ativismo cívico não pode ser desligado de um conhecimento da sociedade em que crescemos e das dificuldades e desafios que os outros enfrentam. O que este radicalismo promove é o esquecimento do presente e das necessidades dos mais pobres.
2. O radicalismo, que do outro lado da barricada pretende fazer de conta que as alterações climáticas não são um problema e continuar a esgotar os recursos e a capacidade de renovação ambiental do planeta. Ignorar os impactos da atividade humana no planeta e na biodiversidade. Esquecer o futuro.
E estes radicalismos enfrentam-se nas redes sociais, trocando memes, piadas e insultos como quem atira cocktails molotov.
Entre os dois extremismos, opto pela moderação de um caminho que reconhece o problema, defende a ciência e uma transição energética justa que não deixe ninguém para trás. O modelo socioeconómico não tem de ser desmantelado, tem de evoluir assente no crescimento sustentável e em políticas fiscais que incentivem a adoção de comportamentos amigos do ambiente. A confrontação a que assistimos neste debate prejudica-nos a todos.
Assistimos a isto também por falhanço da política. O diagnóstico científico está feito, o que se espera é ação. Para essa ação acontecer é preciso coragem e decisão política. E é aí que mais falhamos.
Falhamos quando vemos como aceitável o oportunismo do ministro do Ambiente, Eng. Matos Fernandes, que escreve uma carta a Greta enquanto nada faz por um Pinhal de Leiria que continua ao abandono depois dos incêndios que o destruíram.
Falhamos quando temos a rede de iniciativa pública de carregamento de carros elétricos ao abandono, sem manutenção e sem reforço, mas aceitamos que o primeiro-ministro diga que o Governo é um exemplo no combate às alterações climáticas.
Falhamos quando aceitamos que os negócios do lítio, mal explicados, passem sem consequências políticas.
A COP25 que decorre em Madrid por estes dias não pode ser apenas um afirmar de boas intenções. Temos de passar das palavras aos atos!
A autora escreve segundo o novo Acordo Ortográfico