O Governo e a descentralização: um barco à deriva
Se até agora uma das glórias das CCDR era lutar contra o minifúndio institucional das autarquias, forçando-as a olhar para lá das suas fronteiras, no futuro ficarão reféns desse minifúndio.
O PS, a começar no seu secretário-geral e a acabar nos autarcas até das mais remotas vilas do país, é defensor da Regionalização. E deseja-a tanto que, depois de um vasto pacote de medidas para avançar com uma versão low cost dessa reforma administrativa, lançada logo no princípio da anterior legislatura pelo ministro Eduardo Cabrita, decidiu esperar pelas conclusões de uma comissão nomeada pela Assembleia para estudar o problema.
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O PS, a começar no seu secretário-geral e a acabar nos autarcas até das mais remotas vilas do país, é defensor da Regionalização. E deseja-a tanto que, depois de um vasto pacote de medidas para avançar com uma versão low cost dessa reforma administrativa, lançada logo no princípio da anterior legislatura pelo ministro Eduardo Cabrita, decidiu esperar pelas conclusões de uma comissão nomeada pela Assembleia para estudar o problema.
A Comissão lá disse o óbvio (que Portugal é um anacronismo centralista entre os países mais desenvolvidos e precisa de pensar e executar políticas regionais), mas nem isso foi capaz de clarificar a posição do Governo. Pelo contrário, parece ter-lhe acentuado as dúvidas e consolidado a hesitação. Já percebemos: nada vai mudar para que tudo continue como antes.
A decisão de travar a eleição directa dos presidentes das áreas metropolitanas é mais um exemplo dessa indecisão. Mas, ao contrário do que comparavam essa medida a uma “regionalização encapotada”, ainda bem que a eleição directa foi enterrada porque destruía a longo prazo qualquer possibilidade de uma regionalização.
Porque, para lá da perversidade de aumentar ainda mais a fragmentação da administração territorial do Estado, dava poder de decisão legitimada politicamente aos polos mais fortes do país e afastava-os do resto do território que estruturam. Ninguém imagina uma região do Norte sem o papel polarizador do Porto nem Lisboa e Vale do Tejo sem a força motriz de Lisboa. Acabar com esse remendo mal-amanhado foi por isso uma opção sensata.
Subsiste ainda uma outra ideia elaborada ainda nos tempos em que Eduardo Cabrita foi ministro adjunto a merecer a mesma sorte: a eleição por um colégio dominado por autarcas das comissões de coordenação regional. António Costa defende que este passo serve “para criar no país a confiança necessária para os passos seguintes”, mas também aqui cai numa cilada que, a prazo, pode comprometer a regionalização.
Olhando a experiência do passado, o maior poder dos autarcas vai tornar as CCDR num organismo dominado pelos legítimos interesses locais, quando o se papel é criar uma escala de administração capaz de potenciar políticas à escala das regional. Se até agora uma das glórias das CCDR era lutar contra o minifúndio institucional das autarquias, forçando-as a olhar para lá das suas fronteiras, no futuro ficarão reféns desse minifúndio.
Mais uma bela prova desta política feita de tergiversação, que nem resolve o problema da macrocefalia do Estado, nem cria alicerces para que o país tenha políticas regionais a prazo como existem nos países que tanto gostamos de emular.