“Preconceito” e “arrogância”: Pequim critica lei dos EUA sobre Hong Kong

A lei sobre Hong Kong — que prevê uma revisão anual para apurar se a região mantém “autonomia suficiente” face à China — não foi bem recebida em Pequim: “Os EUA estão a ignorar os factos e a distorcer a verdade.”

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Hong Kong tem sido palco de fortes protestos Reuters/LEAH MILLIS

A lei estava na calha desde Junho, mas foi promulgada por Donald Trump nesta quarta-feira à noite — e foi encarada como um apoio claro aos manifestantes pró-democracia em Hong Kong. Algo que não caiu bem em Pequim, com o ministro dos Negócios Estrangeiros chinês a classificá-la como uma “grave violação do direito internacional e das normas básicas que regem as relações internacionais” e cheia de “arrogância e preconceito”, num comunicado tornado público nesta quinta-feira.

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A lei estava na calha desde Junho, mas foi promulgada por Donald Trump nesta quarta-feira à noite — e foi encarada como um apoio claro aos manifestantes pró-democracia em Hong Kong. Algo que não caiu bem em Pequim, com o ministro dos Negócios Estrangeiros chinês a classificá-la como uma “grave violação do direito internacional e das normas básicas que regem as relações internacionais” e cheia de “arrogância e preconceito”, num comunicado tornado público nesta quinta-feira.

Chama-se Lei dos Direitos Humanos e Democracia e prevê a realização de uma certificação anual para apurar se Hong Kong mantém autonomia suficiente para justificar o seu estatuto especial junto dos EUA. “A [revisão anual] deverá perceber se a China erodiu as liberdades cívicas de Hong Kong e se o Estado de Direito de Hong Kong está protegido pela Lei Básica”, cita a BBC.

A lei prevê também sanções em caso de violação dos direitos humanos por parte da China ou pelos responsáveis de Hong Kong. Entre outras coisas, as sanções aplicadas à China pelos EUA não vão afectar a região de Hong Kong e os cidadãos vão continuar a poder candidatar-se a um visto para os EUA, mesmo que tenham sido detidos durante os protestos.

Foi ainda aprovada uma segunda lei, que proíbe a exportação de material antimotim para a polícia de Hong Kong – como gás pimenta ou balas de borracha.

“As leis estão a ser promulgadas na esperança de que os líderes e os representantes da China e de Hong Kong sejam capazes de acabar com as suas diferenças de forma amigável, dando origem a paz e prosperidade para todos”, alegou Trump.

Como é que esta lei foi encarada na China?

Apesar de Trump ter afirmado que aprovou as leis “com respeito pelo Presidente Xi [Jinping], China e pelas pessoas de Hong Kong”, a notícia não foi bem recebida na China. O ministro dos Negócios Estrangeiros da China respondeu-lhe e acenou com “duras medidas” se os EUA continuarem a interferir na questão de Hong Kong. 

As duas potências ainda vivem em clima de tensão, apesar de, neste momento, estarem a tentar chegar a um acordo para terminar com a guerra comercial que se arrasta desde 2018.

Nesta quinta-feira, o gabinete de Wang Yi afirmou que a lei assinada pelo Presidente norte-americano é uma “grave interferência nos assuntos de Hong Kong, que são assuntos internos da China, e uma grave violação do direito internacional e das normas básicas que regem as relações internacionais”. Deixou ainda um aviso: os EUA vão arcar com a fúria chinesa se continuarem a “agir de forma arbitrária” no que respeita a Hong Kong.

“Os EUA estão a ignorar os factos e a distorcer a verdade”, lê-se no comunicado. “Esta lei, que foi condenada pelo povo chinês, incluindo os compatriotas de Hong Kong, está cheia de arrogância e preconceito. Trata Hong Kong com intimidações e ameaças”, cita o jornal britânico The Guardian "O plano norte-americano está destinado ao falhanço”, cita a Reuters.

A diplomacia chinesa acusou Washington de apoiar “abertamente criminosos violentos que destruíram instalações, incendiaram e agrediram civis inocentes, abalaram o Estado de direito e ameaçaram a ordem social”.

O vice-ministro dos Negócios Estrangeiros chinês, Le Yucheng, pediu uma reunião com o embaixador norte-americano Terry Branstad e que os EUA parem de interferir imediatamente nos assuntos internos chineses.

Em Hong Kong as reacções foram mistas. Junto do executivo da região de autonomia especial chinesa entende-se que “a resolução envia a mensagem errada aos manifestantes”.

Joshua Wong, um dos líderes do movimento pró-democracia, disse que a lei era uma “conquista notável” para todos os que vivem em Hong Kong.

Lei aprovada por unanimidade no Senado

Trump nunca se comprometeu sobre a decisão de promulgar a lei – por um lado mostrava-se ao lado de Hong Kong, enquanto dizia que Xi Jinping era “um tipo incrível”. Quanto aos protestos, em Agosto referiu-se a eles como “motins”, um assunto chinês. Na semana passada manteve a designação de “motim”, mas pediu à China que encarasse esta questão “de forma humana”.

A legislação assinada por Trump foi aprovada de forma unânime pelo Senado norte-americano e por quase toda a Câmara dos Representantes — à excepção de um membro — na semana passada.

A lei foi introduzida em Junho, no início dos protestos de Hong Kong, e diz de forma clara que “Hong Kong é uma parte da China”, mas “tem sistemas legais e económicos muito diferentes”. Em Junho,​ os protestos ainda eram contra uma proposta de lei que permitia a extradição de presos para a China. Desde então já se transformou num protesto pró-democracia que degenerou em violência nos confrontos com a polícia.

No último domingo, Hong Kong foi palco de eleições que serviriam, em teoria, como barómetro da popularidade dos ideais pró-democracia da população. E mostraram uma vitória por larga margem desse movimento.

A China está, também, neste momento sob os holofotes mediáticos por outra questão: os campos e programas de reeducação de minorias muçulmanas, onde se encontram cerca de um milhão de uigures e cazaques, minorias étnicas muçulmanas. Documentos secretos revelados a 24 de Novembro pelo Consórcio Internacional de Jornalistas de Investigação (ICIJ), mostram a extensão do programa chinês de lavagem cerebral destas minorias: os detidos são encarcerados, punidos e sujeitos a um programa para alterar comportamentos e crenças.