Trabalhadores do Arquivo Municipal de Lisboa denunciam degradação de património e pedem novo edifício
Cerca de 80 trabalhadores concentraram-se à porta do Arquivo Municipal de Lisboa, no Bairro da Liberdade, para dar conta da falta de condições dos edifícios onde trabalham, mas também do tratamento de documentos. Rejeitam a ideia da autarquia de mudar parte do arquivo para o Alto da Eira e pedem um edifício que concentre apenas todas as valências do arquivo.
Guarda documentos desde o século XII à actualidade que ajudam a contar a história de Lisboa, mas quem todos os dias trata de protegê-los afirma que o Arquivo Municipal de Lisboa não pode mais continuar nas condições em que se encontra. Além de disperso por vários locais na cidade — o arquivo histórico está no Bairro da Liberdade e no Arco do Cego, o fotográfico está na Rua da Palma e a Videoteca em Alcântara —, as instalações que guardam esses documentos estão degradadas e há infiltrações e humidade que estão a chegar a esse acervo.
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Guarda documentos desde o século XII à actualidade que ajudam a contar a história de Lisboa, mas quem todos os dias trata de protegê-los afirma que o Arquivo Municipal de Lisboa não pode mais continuar nas condições em que se encontra. Além de disperso por vários locais na cidade — o arquivo histórico está no Bairro da Liberdade e no Arco do Cego, o fotográfico está na Rua da Palma e a Videoteca em Alcântara —, as instalações que guardam esses documentos estão degradadas e há infiltrações e humidade que estão a chegar a esse acervo.
A Câmara de Lisboa já fez saber que tenciona transferir para as torres do Alto da Eira, na freguesia da Penha de França, os serviços que estão no Bairro da Liberdade, em Campolide, passando para lá também o atendimento ao público. Contudo, os trabalhadores opõem-se à mudança para estas instalações que dizem ser desadequadas e apresentar os mesmos problemas, mesmo depois de a autarquia lá ter feito obras. Para deixar essa posição bem clara, cerca de 80 trabalhadores manifestaram-se no pólo do Bairro da Liberdade e fizeram greve durante a manhã desta quinta-feira, apelando não só à salvaguarda do património, mas também à melhoria das condições de trabalho.
“Nós temos a plena consciência que indo para o Alto da Eira não vai haver edifício novo nenhum. O que propusemos, não ignorando o investimento que ali foi feito, foi separar a documentação interna [da autarquia]. Essa ficaria nas instalações do Alto da Eira”, disse ao PÚBLICO Helena Nunes, técnica de conservação e restauro que ali trabalha desde 2004.
Nos vários pólos do arquivo trabalham 150 trabalhadores. Os que ali estavam reivindicam que seja construído, ou reabilitado, um edifício que albergue exclusivamente todo o arquivo e não que sejam transferidos para lojas ou garagens de prédios habitacionais. Nas instalações das torres do Alto da Eira, um bairro municipal, a técnica lembra que houve já inundações na sala do restauro e na sala de leitura, já depois das obras feitas, sublinhando assim que aquele local não tem as condições necessárias para guardar um dos mais importantes espólios do país, tanto em termos de volume como pelo conteúdo “riquíssimo” sobre diferentes épocas, como notaram duas historiadoras ao PÚBLICO.
Mas ali também é frequente este tipo de situações, diz também Marília Maranhas, que trabalha no arquivo desde 1996. Hoje integra o gabinete de comunicação e design do Arquivo Municipal de Lisboa. “Isto aqui que nós vemos são as salas dos técnicos e a sala de leitura. A documentação está no piso -1 e -2. Não é sítio para ter um arquivo”, diz a funcionária, lembrando que já houve problemas de rupturas de canos e que, por vezes, chove lá dentro.
O arquivo histórico funciona naquelas instalações desde 2004, quando foi transferido precisamente do Alto da Eira por questões de falta salubridade, tendo sido detectados potenciais focos de contaminação de legionella. A autarquia acabou por fazer obras e por considerar que aquele espaço reúne agora condições para acolher o arquivo. Marília Maranhas diz que aquele “não é um sítio digno para receber um leitor, um munícipe”, além de que não é facilmente acessível de transportes públicos. “Isto é uma falta de respeito para com os munícipes, os investigadores, os estudantes universitários”, concorda Helena Nunes.
Câmara “está a trabalhar numa solução”
Estas preocupações dos trabalhadores tinham sido já expressas na petição “Por um edifício digno para o Arquivo Municipal de Lisboa” que foi remetida à Assembleia Municipal e discutida, no final de Outubro, na Comissão Permanente de Cultura. Nessa altura, a vereadora Catarina Vaz Pinto disse que esperava anunciar o local definitivo para o Arquivo Municipal de Lisboa no primeiro semestre do próximo ano. Esta quinta-feira, o PÚBLICO questionou a Câmara de Lisboa sobre os planos que tem para o arquivo, tendo a autarquia apenas respondido que “está a trabalhar numa solução”, que conta anunciar “proximamente”.
Os problemas com a preservação do espólio são também partilhados por funcionários de outros pólos. Fátima Tomé trabalha na Videoteca, em Alcântara, lembra que há cassetes que os técnicos já não conseguem visionar e não há condições para as digitalizar. “Não temos forma de guardar as cassetes que devem estar em condições de temperatura e humidade específicas. Nem sequer temos um servidor. O nosso arquivo digital está distribuído em discos externos. É um problema grave. Não há backups”, diz.
Em 2011, a Videoteca foi inserida na divisão dos Arquivos Municipais e desde então que se fala na urgência de ter um arquivo. Segundo os planos da autarquia, a ideia era que a Videoteca saísse do Largo do Calvário e fosse para as instalações no Bairro da Liberdade, “onde as condições também não são boas”, nota Fátima Tomé.
Inês Sapeta Dias, também funcionária da Videoteca, lembra ainda que já nas instalações de Alcântara é complicado ter programação regular. “Aqui, no Bairro da Liberdade, nem sequer há um auditório. Ainda é mais difícil ter programação regular”, nota.
Os trabalhadores do arquivo ouvidos pelo PÚBLICO estão dispostos a colaborar com a autarquia no desenho de um projecto para a construção ou reabilitação de um novo edifício que concentre apenas o arquivo. “Eu acho que é mais uma questão de vontade do que de dinheiro e espaço”, diz Helena Nunes.