A ressurreição do 25 de Novembro
Afinal, o 25 de Novembro é mesmo uma data que o Parlamento deve celebrar? E faz sentido iniciar essa comemoração 44 anos depois?
O CDS precisa desesperadamente de causas para fazer prova de vida e a causa do 25 de Novembro encaixa que nem uma luva na sua aflição. Porque qualquer iniciativa para evocar a data que pôs termo à deriva esquerdista que ameaçava subverter o rumo do 25 de Abril é sempre um belo palco de confronto com o Bloco e com o PCP. Porque essa bandeira erguida contra a democracia dita “popular”, ou o comunismo, é sempre eficaz para situar o partido num bloco ideológico já disputado por outros partidos. Mas à margem do oportunismo e da circunstância, vale a pena discutir a iniciativa do CDS em duas perspectivas: afinal, o 25 de Novembro é mesmo uma data que o Parlamento deve celebrar? E faz sentido iniciar essa comemoração 44 anos depois? Ramalho Eanes afirmou há tempos sobre o 25 de Novembro que “os momentos fracturantes não se comemoram, recordam-se”, mas o CDS deixou de se satisfazer com memórias ou jantares evocativos.
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O CDS precisa desesperadamente de causas para fazer prova de vida e a causa do 25 de Novembro encaixa que nem uma luva na sua aflição. Porque qualquer iniciativa para evocar a data que pôs termo à deriva esquerdista que ameaçava subverter o rumo do 25 de Abril é sempre um belo palco de confronto com o Bloco e com o PCP. Porque essa bandeira erguida contra a democracia dita “popular”, ou o comunismo, é sempre eficaz para situar o partido num bloco ideológico já disputado por outros partidos. Mas à margem do oportunismo e da circunstância, vale a pena discutir a iniciativa do CDS em duas perspectivas: afinal, o 25 de Novembro é mesmo uma data que o Parlamento deve celebrar? E faz sentido iniciar essa comemoração 44 anos depois? Ramalho Eanes afirmou há tempos sobre o 25 de Novembro que “os momentos fracturantes não se comemoram, recordam-se”, mas o CDS deixou de se satisfazer com memórias ou jantares evocativos.
Desenterrar a História tanto pode ser útil como perigoso. Será sempre útil, se em causa estiver um ocaso forçado ou um esquecimento imposto, o que numa democracia como a portuguesa não aconteceu. E pode ser perigoso quando, como é o caso, permite que a celebração de uma facção ideológica represente uma provocação da facção oposta. Vivemos num tempo em que estes riscos ou oportunidades se repetem, como aconteceu no Parlamento Europeu com a equiparação do comunismo estalinista ao nazismo, ou com o desenterro dos restos mortais de Francisco Franco.
O CDS quer regressar ao passado para dar lastro a seu precário presente propondo uma festa com moderação: não propõe um feriado, nem uma sessão solene, apenas uma sessão evocativa. Mas, ao pretender “reafirmar os compromissos da Assembleia com os valores da liberdade de expressão” e da democracia aberta e pluralista que a maioria esmagadora dos portugueses defende, ao reiterar a ideia indiscutível de que o 25 de Novembro salvou o país da ameaça de um regime estatista e iliberal, o CDS reabre feridas que se supunham saradas. Se o 25 de Novembro garantiu ao país a Europa e a democracia plural que hoje vivemos, a sua invocação impõe a discussão sobre a luta crucial de personagens como Álvaro Cunhal e ameaça ressuscitar fantasmas que o PS gostaria de ver enterrados.
A política, porém, é o que é. Apesar das angústias que a iniciativa do CDS suscita, não haverá grande coisa a perder, se o debate se salvar do maniqueísmo sectário e respeitar as margens da tolerância da democracia.