Eleições para as assembleias locais em Hong Kong são teste à adesão aos protestos
Há um número recorde de candidatos, 1104, para 452 lugares. E nunca tantos eleitores se inscreveram para votar: 4,1 milhões.
Hong Kong está de respiração suspensa devido às eleições para as assembleias distritais no domingo, que ganharam um significado especial depois de dois brutais ataques a candidatos e da violência em que degeneraram os protestos no território chinês em luta pelo direito de escolherem o seu próprio governo. Para parte da população e muitos analistas, são uma forma de medir a adesão dos cidadãos da cidade às manifestações, e às suas reivindicações, dos últimos seis meses.
A verdade faz-nos mais fortes
Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.
Hong Kong está de respiração suspensa devido às eleições para as assembleias distritais no domingo, que ganharam um significado especial depois de dois brutais ataques a candidatos e da violência em que degeneraram os protestos no território chinês em luta pelo direito de escolherem o seu próprio governo. Para parte da população e muitos analistas, são uma forma de medir a adesão dos cidadãos da cidade às manifestações, e às suas reivindicações, dos últimos seis meses.
Nesta sexta-feira, a polícia fez um apelo aos manifestantes para não perturbarem a eleição, que tem lugar a cada quatro anos. Há seis meses que a região administrativa especial da China está em convulsão, com embates recorrentes entre a polícia e os manifestantes.
“Temos que garantir a segurança dos eleitores e permitir que votem sem interferências”, disse o comissário da polícia, Tang Ping-keung, numa conferência de imprensa esta sexta-feira. Nos últimos dois dias a cidade acalmou-se - a polícia mantém o cerco à Politécnica de Hong Kong, o centro dos protestos nas últimas semanas, em cujo interior permanece um pequeno grupo de estudantes; os restantes, perto de mil, fugiram ou entregaram-se (a maior parte foi detida).
Casa mesa de voto vai ter uma “forte patrulha policial”, disse o comissário.
Os protestos começaram com a contestação a uma lei de extradição para a China, entretanto anulada, mas evoluíram para a defesa de um sistema democrático completo na cidade, criando o maior desafio à presidência de Xi Jinping desde que chegou ao poder em Pequim em 2012.
Facas e martelos
Um deputado do parlamento de Hong Kong, pró-Pequim, Junius Ho, foi esfaqueado este mês. Jimmy Sham, um dos dirigentes da Frente dos Direitos Civis e Humanos (pró-democracia), foi violentamente agredido por um grupo de homens com martelos em Outubro, depois de o seu grupo ter organizado os comícios contra a lei da extradição. E no início de Novembro um homem armado com uma faca cortou parte da orelha de Andrew Chiu, um conselheiro pró-democracia de uma assembleia distrital (cujas composições são eleitas no domingo).
O conselheiro distrital e candidato Clement Woo disse que vários membros do seu campo, pró-Pequim, foram alvo de violência e de actos de intimidação. “Com esta atmosfera, como pode a eleição ser justa?”, perguntou Woo.
A veterana política pró-democracia Emily Lau disse que havia “uma preocupação real” com a possibilidade de a campanha se tornar violenta e de as “coisas ficarem feias, com candidatos de ambos os lados feridos e sedes de ambos os lados vandalizadas”. “Isto de facto aconteceu e pode ficar pior”, diz.
“Não queremos adiar a votação a não ser que seja mesmo necessário”, tinha dito Patrick Nip, secretário para os Assuntos Constitucionais e do Continente (é o homem que faz a ligação a Pequim e garante a gestão entre a lei básica de Hong Kong e as regras chinesas). A chefe do governo local, Carrie Lam, tem o poder de cancelar a votação até 24 horas antes da abertura das urnas.
Há um número recorde de 1104 candidatos para 452 lugares nas assembleias dos vários distritos que compõem Hong Kong. Inscreveram-se para votar 4,1 milhões de eleitores - nunca tantos o fizeram. Os conselhos distritais controlam uma parcela do orçamento distrital e tomam decisões diárias sobre assuntos locais, como a reciclagem, os transportes e a saúde pública.
Alguns dos lugares que eram incontestados, e dominados por candidatos pró-Pequim, estão agora a ser disputados por candidatos mais jovens do movimento pró-democracia.
A maior parte das candidaturas foi aprovada, mas as autoridades bloquearam a do conhecido dirigente do partido Demosistō (Vontade do Povo), Joshua Wong, que defende a autodeterminação de Hong Kong. As autoridades justificaram a rejeição da sua candidatura precisamente por estar ligado a uma organização política que promove a independência de Hong Kong.
Cinco dos conselheiros que vão ser eleitos domingo podem candidatar-se a cinco lugares no Conselho Legislativo (parlamento), em Setembro de 2020.
Hong Kong foi devolvido pelo Reino Unido à China em 1997, com a promessa de que muitas das liberdades da era colonial britânica se mantinham, ao abrigo do sistema “um país, dois sistemas”, pelo menos durante 50 anos.
Os candidatos ao governo de Hong Kong são escolhidos, a partir de uma lista pré-aprovada, por um comité de figuras leais a Pequim composto por 1200 pessoas, entre elas alguns conselheiros locais. Nunca um candidato da oposição foi eleito chefe do governo, apesar de vários terem conseguido inscrever o seu nome no boletim de voto.
Manifestações pacíficas a exigir o sufrágio universal paralisaram a cidade durante 79 dias em 2014 - o movimento ficou conhecido por Revolução do Chapéu de Chuva (que os manifestantes usavam para se proteger do gás lacrimogéneo) e deu notoriedade a Joshua Wong, que tinha 17 anos na altura.