O Canto Popular arranjou boa Companhia. E já têm um Rebento
O disco de estreia da Companhia do Canto Popular, que junta músicos de formações distintas, foi lançado esta quinta-feira no auditório da SPA, em Lisboa. Chama-se Rebento.
Nasceu de uma residência artística em Serpa, em Abril, e teve a primeira apresentação pública em Setúbal, na EXIB (Expo Ibero-Americana de Música), em Junho. Agora o trabalho da Companhia do Canto Popular deu o primeiro fruto visível, um disco que apropriadamente ganhou o nome de Rebento. Não por ser o primeiro “filho” de uma união de músicos vindos de formações distintas, mas porque a música que fazem é como uma jovem planta nascida de um chão antigo: a música tradicional popular.
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Nasceu de uma residência artística em Serpa, em Abril, e teve a primeira apresentação pública em Setúbal, na EXIB (Expo Ibero-Americana de Música), em Junho. Agora o trabalho da Companhia do Canto Popular deu o primeiro fruto visível, um disco que apropriadamente ganhou o nome de Rebento. Não por ser o primeiro “filho” de uma união de músicos vindos de formações distintas, mas porque a música que fazem é como uma jovem planta nascida de um chão antigo: a música tradicional popular.
Antes do mais, as apresentações. A Companhia do Canto Popular é um supergrupo que reúne na mesma formação André Sousa Machado (baterista ligado à Orquestra do Hot e a vários projectos de jazz), Artur Fernandes (Danças Ocultas), José Barros (Navegante), José Manuel David (Gaiteiros de Lisboa, 4aoSul), Manuel Rocha (Brigada Victor Jara), Manuel Tentúgal (Vai de Roda), Rui Costa (Silence 4), Rui Vaz (Gaiteiros de Lisboa, 4aoSul), Sara Louraço Vidal (Luar na Lubre, A Presença das Formigas, Diabo a Sete) e Tó Pinheiro da Silva (Banda do Casaco), que trata da sonoplastia. Pelas mãos destes músicos (vários deles também cantores) ouvem-se, no disco, piano, violas, bateria, cavaquinho, concertina, violino, harpa celta, sanfona, flautas, trompa, gaita, baixo eléctrico, guitarra acústica e várias percussões.
Uma ideia nascida em Itália
A ideia de juntar todos estes músicos partiu de José Barros, como o próprio já contara ao PÚBLICO em Junho: “No ano passado, em Itália, em conversa com o Riccardo Tesi, que é um dos grandes concertistas do mundo, ele disse-me que tinha feito um projecto chamada Bella Ciao com gente de vários grupos [Lucilla Galeazzi, Elena Ledda, Ginevra di Marco, Gigi Biolcati, Andrea Salvadori, Alessio Lega].” E, no regresso a Portugal, veio a pensar como poderia fazer aqui um projecto idêntico.
O disco, como ele também já dissera nessa altura, junta originais e versões: “Fizemos uma versão um bocado louca da Gitana, com arranjo do José Manuel David. E eu fiz um tema novo, Cantar de guardador, com letra do José Afonso. O guardador neste caso era o Salazar. Ele escreveu-a no final dos anos 1960, não a musicou, mas usou partes da letra noutros temas que compôs e gravou, como o Venham mais cinco.”
Por falar em José Afonso, o disco abre precisamente com um tema que ele musicou, Tu gitana, do Cancioneiro de Vila Viçosa, que viria a integrar o seu disco Galinhas do Mato (o último que editou em vida, em 1985) e tem vários temas tradicionais, com novos arranjos e harmonizações, vocais e instrumentais, de regiões distintas: Trás-os-Montes (Rosinha, Cantiga dos tosquiadores), Douro Litoral (Viva a música), Alentejo (Fandango), Açores (Moinho de mão), Beira Baixa (Senhora d’azenha) e Galiza (Alborada de Ponte Caldelas). E há recriações a partir de temas tradicionais, como Farol de Montedor e Maria Campaniça (unidos em Farol da Campaniça, com adaptação e arranjo de Artur Fernandes) ou Já lá gritam no Calvário, adaptado para Já lá cantam por Rui Vaz (letra) e José Manuel David (música e arranjo, com Manuel Tentúgal).
Há também uma antiga canção tradicional, Pastorela, na adaptação que dela fez Natália Correia, com arranjo de Artur Fernandes, José Barros (que também assina a música) e José Manuel David. Na verdade, quase todos os membros do grupo assinam adaptações ou arranjos, alguns deles assinados até pelo colectivo. O disco tem ainda um original de Manuel Tentúgal (que fez a letra sobre motivos populares) intitulado Rap lenga, com música dele e de José Manuel David e arranjo do grupo.
Um novo projecto transversal
Apresentada como um “novo projecto transversal da música de raiz portuguesa, que reúne músicos com reconhecido percurso na música nacional”, a Companhia do Canto Popular diz que, “da confluência de experiências e vivências de cada um, nasce um ponto comum: os ritmos e as polifonias da música tradicional e popular portuguesa.”
As palavras do etnomusicólogo Domingos Morais, logo a abrir o folheto do disco, corroboram esta ideia. Este é, diz ele a falar-nos de Rebento, “um virtuoso encontro de nove músicos, carregados de saberes e histórias pessoais em muito e desvairados grupos” que, “num acesso de humildade” se juntaram em residência artística e fizeram aquilo que “poderá ser uma inovadora forma de reinventar o Canto e os instrumentais populares, merecedora da atenção crítica e de sugestões por quem as possa e saiba fazer.” E termina com um desejo: “Que este seja o primeiro de muitos trabalhos, em boa ‘Companhia’, para mais e melhores resultados. E viva a Música.”
O disco, editado pela Sons Vadios e apresentado num dos auditórios da Sociedade Portuguesa de Autores, em Lisboa, é apoiado pelo fundo cultural da SPA e tem ainda apoio institucional do Município de Serpa e da Antena 1 (foi recém-gravado ao vivo no programa Viva a Música, de Armando Carvalhêda e Ana Sofia Carvalhêda).