O aluno não sabe e passa? A responsabilidade é do professor
Num mundo ideal, não haveria chumbos. Ao longo da história, nunca um aluno repetiria um ano por não saber; se não sabe, o professor ajuda e o professor explica, promove-se um ensino prático, visual.
Infelizmente, é verdade. A responsabilidade é do professor. Mas almejar que o aluno adquira as competências básicas, ano após ano, num sistema de ensino onde os professores não têm condições para trabalhar equivale a querer construir uma casa pelo telhado.
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Infelizmente, é verdade. A responsabilidade é do professor. Mas almejar que o aluno adquira as competências básicas, ano após ano, num sistema de ensino onde os professores não têm condições para trabalhar equivale a querer construir uma casa pelo telhado.
Num mundo ideal, não haveria chumbos. Ao longo da história, nunca um aluno repetiria um ano por não saber; se não sabe, o professor ajuda e o professor explica, promove-se um ensino prático, visual, desenvolvem-se actividades de grupo, fazem-se pequenos intervalos a meio da aula, incentiva-se o debate, promove-se a aprendizagem individual onde o professor é apenas o guia, muda-se a disposição das mesas e cadeiras, livramo-nos das mesas e cadeiras, livramo-nos da escola, saímos da escola, vamos aprender lá para fora.
Num mundo ideal, um professor teria a liberdade de dar asas à imaginação e ensinar como lhe ensinaram a ensinar, discutindo os grandes temas da actualidade, promovendo debates políticos, levando os alunos a manifestações, a usar a sua voz e os seus direitos, o direito de voto e a cor do sangue para lá chegar, a fazer parte da sociedade, a melhorar a sociedade como futuros adultos, como adultos.
Num mundo ideal, um professor não teria de pagar as fotocópias do seu bolso, nas salas de aula não morreríamos de frio durante o Inverno e de calor no Verão, os professores não teriam medo de entrar na sala sob risco de serem agredidos pelos alunos e respectivos pais, isto para não falar dos insultos diários, o pneu do carro furado e a colega de Ciências que ainda na semana passada acabou no hospital.
Já o disse, e repito, o corpo docente nas escolas seria estável e os professores sempre os mesmos do 7.º ao 12º anos, de modo a promover a relação entre o professor e o aluno, entre o professor e os pais, entre a escola e a comunidade em redor. Estabilidade rima com continuidade, mas também com segurança, confiança, conforto, com ter alguém sempre presente com quem podemos partilhar as nossas vitórias e derrotas, os nossos anseios e preocupações, o passado e o futuro, alguém para nos levar pela mão, ano após ano até à conclusão do ensino secundário.
Os professores nunca estariam por sua conta enquanto a direcção se tranca a sete chaves, independentemente dos repetidos casos de polícia dentro das escolas a fazer manchete nos jornais. Ao invés, os professores seriam apoiados e ajudados a apoiar alunos e famílias, a ir mais além, para lá das paredes da escola.
Os salários seriam o reflexo das centenas de horas de trabalho levadas a cabo todos os meses por quem, longe de casa e dos seus, muitas vezes do lado de lá do país, nas ilhas ou em Timor, trabalha por carolice, para não dizer desespero, quando, ao fim de vinte ou mais anos, a precariedade é sempre a mesma.
Num mundo ideal, e voltando ao início, os professores seriam os motores do futuro, capazes de dotar os alunos, as crianças, os futuros adultos, a sociedade do amanhã, com as competências necessárias para a evolução da sociedade, eliminando para sempre os erros do passado e a toda a brida em direcção às estrelas. Os alunos nunca teriam de repetir um ano porque tudo quanto é necessário para a aprendizagem estaria garantido à partida.
Quando este dia chegar, não teremos problema nenhum em assumir as responsabilidades se um aluno repetir um ano. Mas sem estas premissas, implementar, pura e simplesmente, a progressão automática é criar uma mentira, uma fantasia, daquelas para mostrar lá fora, daquelas para inglês ver.