Voltar aos 25 dias de férias? Bagão Félix alerta para discriminação do privado

PCP entregou projecto-lei para repor os 25 dias de férias, o BE promete imitá-lo e o Governo fala de reintroduzir “incentivos” à assiduidade na função pública retirados no período da troika. Bagão Félix, o ministro que implementou a medida em 2003, acha que o sector privado não deve ficar de fora no eventual regresso desse bónus.

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Daniel Rocha

A hipótese foi levantada pela ministra da Modernização do Estado e da Administração Pública, que, em entrevista ao PÚBLICO, defendeu a reintrodução na lei dos “incentivos” à assiduidade dos funcionários públicos retirados durante o período da troika, como majoração do período de férias para os mais assíduos. E PCP voltou nesta quarta-feira a entregar um projecto de lei para o regresso dos 25 dias de férias, independentemente da assiduidade, e o Bloco de Esquerda já admitiu fazer outro tanto.

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A hipótese foi levantada pela ministra da Modernização do Estado e da Administração Pública, que, em entrevista ao PÚBLICO, defendeu a reintrodução na lei dos “incentivos” à assiduidade dos funcionários públicos retirados durante o período da troika, como majoração do período de férias para os mais assíduos. E PCP voltou nesta quarta-feira a entregar um projecto de lei para o regresso dos 25 dias de férias, independentemente da assiduidade, e o Bloco de Esquerda já admitiu fazer outro tanto.

Foi em 2003 que o então ministro do Trabalho do Governo de Durão Barroso, António Bagão Félix, deu à função pública a possibilidade de gozar 25 dias de férias. Aos 22 dias obrigatórios por lei, somar-se-iam até três dias úteis para os trabalhadores que cumprissem os padrões de assiduidade. O objectivo seria diminuir o absentismo na função pública, que a ministra Alexandra Leitão disse na entrevista ao PÚBLICO ser “muito elevado”, sem concretizar.

Hoje, Bagão Félix acha que o regresso dos 25 dias de férias é exequível, mas alerta para alguns factores que, em seu entender, têm de ser acautelados. “Não é uma solução óptima, tem vantagens e inconvenientes, mas, neste momento, não vejo outra [política eficaz para reduzir o absentismo]. É uma possibilidade. Na altura [2003] foi introduzida no Código do Trabalho. Agora, tanto quanto percebi, a ideia seria implementá-la na função pública. Em primeiro lugar, introduz um factor discriminatório contra tudo o que é não é sector público. Em segundo lugar, esta medida será paga pelos contribuintes. O que se exige ao Estado é, desde logo, que encontre formas de não premiar a normalidade através dos contribuintes e de não introduzir factores de discriminação — como foi o caso da introdução das 35 horas [de trabalho semanais na função pública]”.

Esta opção do Governo de Durão Barroso foi revertida por outro executivo liderado pelo PSD. Em 2012, em função do memorando de entendimento para o Programa de Assistência Económico-Financeiro (PAEF) com a troika, o executivo liderado por Pedro Passos Coelho retirou, ao sector privado, a obrigatoriedade de dar mais três dias de férias aos trabalhadores sem registo de ausências. No Verão de 2014, alterações à Lei Geral de Trabalho em Funções Públicas acabaram também com os três dias de bónus no sector público. Todos os trabalhadores ficaram com 22 dias de férias, período mínimo resultante das alterações ao Código do Trabalho de 2009 pela Lei n.º 23/2012 de 25 de Junho. A este número acresce um dia útil de férias por cada dez anos de serviço efectivamente prestado. 

Em 2011, Bagão Félix mostrou-se reticente quanto à decisão do Governo de Pedro Passos Coelho. Oito anos depois, acha que poderia ter havido mais ponderação antes do corte. “Antes de ser retirada, era bom que tivesse sido medido o grau da sua eficácia. Não foi feito. Acho que, em Portugal, é uma mania dos políticos alterar a legislação sem medir os resultados. É por faro, quase por intuição. Por isso é que andamos sempre a mudar. Esta política começou em 2003 e mudou passados oito anos. Agora, sete anos depois, [poderá ser reposta] apenas para um sector. Não faz sentido, até porque não estamos a falar de minudências”, lamenta.

Já em 2016, Bloco de Esquerda, PCP e PAN apresentaram propostas para a reposição dos 25 dias de férias. Os projectos de lei apresentados abrangiam todos os trabalhadores, do público ao privado, mas o ministro do Trabalho, Vieira da Silva, colocou, à partida, um travão a esta intenção dos restantes partidos de esquerda, justificando que a reposição dos dias de férias “não estava no programa eleitoral do PS" nem “no programa do Governo”.

As propostas da esquerda diziam respeito a todos os trabalhadores, da função pública e do sector privado, sem contrapartidas relativas à assiduidade. Foram chumbadas com os votos contra de PS, PSD e CDS-PP, em Janeiro de 2017. O deputado socialista Rui Riso afirmou que a bancada parlamentar do PS estava “globalmente de acordo” com as propostas de lei apresentadas, mas que uma eventual mudança deveria ser discutida entre Governo e sindicatos ou então negociada na especialidade.

Resistência ao regresso da majoração do período de férias é algo que Bagão Félix compreende. O próprio, confessa, teve de pesar os prós e contras desta medida antes de a implementar: “Percebo alguma crítica que se faça, no sentido de dizer que não se deve premiar a normalidade, e sim sancionar a falta de assiduidade. É um argumento com algum peso sobre o qual pensei quando a medida foi implementada.”

Também o presidente do Conselho Económico e Social, António Correia de Campos, defendeu, em entrevista ao PÚBLICO e à Renascença difundida esta quarta-feira, que “um bónus por assiduidade é naturalmente estranho”.