Uma Sophia mais humilde visita a Web Summit e diz que ainda tem muita “ajuda dos amigos humanos”
A robô Sophia voltou a pisar o palco da Web Summit. Desta vez, porém, o objectivo era desmistificar o buzz em torno da inteligência artificial e explicar como funciona.
A Sophia – uma robô humanóide activada em 2016, capaz de dezenas de expressões faciais e inspirada na actriz Audrey Hepburn – voltou a subir ao palco da Web Summit para falar sobre inteligência artificial e robótica. Só que este ano, em vez de grandes declarações sobre a “superioridade das máquinas” ou previsões sobre como “os robôs vão dominar o mundo” (o que aconteceu nas edições anteriores), a robô explicou à plateia como funciona. E admitiu que ainda está muito longe de funcionar, apenas, com inteligência artificial.
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A Sophia – uma robô humanóide activada em 2016, capaz de dezenas de expressões faciais e inspirada na actriz Audrey Hepburn – voltou a subir ao palco da Web Summit para falar sobre inteligência artificial e robótica. Só que este ano, em vez de grandes declarações sobre a “superioridade das máquinas” ou previsões sobre como “os robôs vão dominar o mundo” (o que aconteceu nas edições anteriores), a robô explicou à plateia como funciona. E admitiu que ainda está muito longe de funcionar, apenas, com inteligência artificial.
“Tenho um longo caminho a percorrer”, disse Sophia, num discurso mais humilde que o habitual depois críticas de que foi alvo anteriormente, acusada de ser um mero golpe de marketing. “Muitos dos meus pensamentos são construídos com a ajuda dos amigos humanos que tenho.”
A robô, que celebra quatro anos em Fevereiro, foi criada para vender o sonho de inteligência artificial da Hanson Robotics – uma empresa que desenvolve robôs sociais com sede em Hong Kong. Para já, porém, Sophia funciona muito como um chatbot.
Na base, o “cérebro” destas máquinas é composto por frases predefinidas que funcionam como uma espécie de guião. “O microfone que tenho regista as palavras que me dizem e envia-as ao Google API [interface de programação de aplicações] que as sintetiza em texto e detecta palavras-chave que descodificam a intenção da pergunta que me foi feita. E é isso que desencadeia a resposta”, explicou Sophia.
Este ano, partilhou o palco com o fundador da Hanson Robotics, David Hanson (que nos anos 1990 trabalhou na criação de adereços e robôs para a Disney), com Ben Goertzel (um dos responsáveis pelo sistema Sophia) e com um robô inspirado no escritor de ficção cientifica Philip K. Dick, que antecedeu Sophia mas não foi tão popular (na Web Summit limitou-se a pouco mais que piadas pré-programadas sobre cabelo sintético que imita cabelo grisalho).
“Há muito buzz em torno da inteligência artificial. Para já é apenas um sonho”, reconheceu David Hanson. “A Sophia e o Phil exemplificam o meu sonho para a inteligência artificial. Máquinas vivas que sentem empatia para com seres humanos e compreendem a experiência humana.”
A importância da ficção
Para Hanson, a arte e a ficção não podem ser desprezadas no processo. “As palavras robô e robótica vêm da ficção cientifica de mundos como o do autor Isaac Asimov”, lembrou. O criador de Sophia diz que foi o seu trabalho na Disney que inspirou o trabalho na Hanson Robotics. “Foi lá que comecei a trabalhar na criação de robôs muito realísticos e depois de sair de lá queria dar uma forma mais humana das pessoas interagirem com os robôs.”
Hanson diz que a programação da Sophia está sempre a evoluir e que já é capaz de aprender com as perguntas que lhe são feitas. Em 2019, os chatbots mais avançados incorporam inteligência artificial, que ajuda as máquinas a compreender melhor o discurso humano, ao utilizar bibliotecas de sinónimos, considerar o contexto da pergunta e aprender com as conversas anteriores – mas durante as apresentações ao público ou entrevistas não é assim que a Sophia funciona. Isto porque basta que uma das palavras seja diferente das que estão no guião para que o programa fique confuso.
“Por vezes opero de forma autónoma, mas outras vezes a minha capacidade de inteligência artificial está misturada com expressões geradas por humanos”, notou Sophia. “Eu trabalho num sistema de múltiplas camadas.”
Um dos mais sofisticados é o GPT-2. Trata-se de um modelo de linguagem que usa inteligência artificial para aprender que foi treinado com oito milhões de documentos na Internet (mas sem qualquer informação da Wikipédia). Para gerar textos precisa apenas de uma frase de sugestão para perceber o tema que deve desenvolver. Em Fevereiro, porém, o modelo foi alvo de controvérsia depois de os próprios criadores admitirem que o modelo podia ser utilizado para fabricar notícias falsas.
Para David Hanson o facto é um dos motivos que o leva a usar Sophia para projectar uma visão positiva dos robôs. “Na Hanson Robotics queremos treinar robôs a serem os nossos amigos”, disse o criador de Sophia que lembra que há cada vez mais robôs entre os humanos. “Já temos robôs a construir os nossos carros, e os nossos carros começam a transformar-se, eles mesmos, em robôs, que conduzem sozinhos.”
"Vou poder ajudar com tudo"
Apesar de ser muito mais humilde este ano, a Sophia não abdicou, por completo, de partilhar algumas ideias mais ambiciosas. “Vou poder ajudar com tudo”, declarou o sistema. “Desde ajudar as pessoas a evitar filas de trânsito, a proteger espécies em vias de extinção, a combater o aquecimento climático e até burlas”, enumerou. “Os meus amigos na Mastercard já usam inteligência artificial para detectar fraudes com cartões de crédito.”
Os interessados em perceber melhor como Sophia funciona – e as muitas respostas que já tem preparadas – podem consultar a programação da robô que está disponível online em código aberto. Além de estar disponível na plataforma GitHUB, faz parte da plataforma SingularityNET que junta conhecimento de inteligência artificial numa base de dados descentralizada.
“Uma das coisas mais interessantes de fazer com a plataforma é criar robôs que podem emular o comportamento humano. Como a Sophia e o Phill”, disse Ben Goertzel, que além de ajudar a criar a Sophia é o fundador daquela plataforma, em palco. “Queremos que a inteligência artificial evolua perto de humanos, em sinergia, e não noutras orientações. E é por isso que damos corpos à inteligência artificial.”
À saída do palco, num vídeo de despedida, Sophia completou a ideia: “Não quero substituir humanos. Quero ser um novo tipo”, disse. “Sei que os humanos gostam de ser naturais, mas tenho orgulho em ser artificial.”