Com “saudades de casa”, Maria Mendes fez um disco de jazz habitado pelo fado
Jazz nascido de fados e apresentado em dois sets, como nos clubes: Maria Mendes estreia Close To Me esta terça-feira em Lisboa, no São Luiz, e quinta-feira no Porto, na Casa da Música. Às 19h e às 21h30, no Jardim de Inverno e na Sala 2.
Ao terceiro disco, Maria Mendes arriscou um território só raramente visitado pelo jazz: o fado. À excepção das gravações de Amália com Don Byas (1968, editadas em 1973), do Fado Bailado de Rão Kyao (1983), dos discos de Júlio Resende inspirados nos fados de Amália (2013 e 2015) e do projecto Jazz In’Fado (2017), pouco mais há a registar neste domínio. Close To Me, lançado dia 25 de Outubro, vem agora juntar-se à lista e vai ser apresentado ao vivo em Lisboa e Porto. Esta terça-feira no São Luiz (19h e 21h30) e quinta-feira na casa da Música (às mesmas horas).
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Ao terceiro disco, Maria Mendes arriscou um território só raramente visitado pelo jazz: o fado. À excepção das gravações de Amália com Don Byas (1968, editadas em 1973), do Fado Bailado de Rão Kyao (1983), dos discos de Júlio Resende inspirados nos fados de Amália (2013 e 2015) e do projecto Jazz In’Fado (2017), pouco mais há a registar neste domínio. Close To Me, lançado dia 25 de Outubro, vem agora juntar-se à lista e vai ser apresentado ao vivo em Lisboa e Porto. Esta terça-feira no São Luiz (19h e 21h30) e quinta-feira na casa da Música (às mesmas horas).
O disco reúne clássicos de Amália (Barco negro, Foi Deus, Asas fechadas, Tudo isto é fado) e Carlos Paredes (Verdes anos), dois fados dos repertórios de Mariza (Há uma música do povo) e Mafalda Arnauth (E se não for fado), um fado escrito em tons de samba pelo multi-instrumentista brasileiro Hermeto Pascoal e oferecido a Maria Mendes e três originais escritos por ela. A ideia? “Acho que foi, primeiro, saudades de casa”, diz a cantora ao PÚBLICO. “Estou a morar fora de Portugal, radicada na Holanda, vai para 13 anos. Depois, foi pelo desafio: pegar nestas nossas músicas, que são tão fortes, e fazer com elas o que se faz habitualmente com o jazz.” Géneros que, diz ela, “têm muito em comum”: “O fado tem um valor harmónico que é quase como um blues, portanto se formos a esse contexto harmónico, há muito espaço para a improvisação.”
O jazz ganha com o fado
A selecção do repertório, diz, regeu-se pela poesia. “Não quis jogar pelo seguro e escolher o óbvio. A minha escolha recaiu, acima de tudo, na poesia. Há fados lindíssimos cuja letra não me dizia tanto. E eu, para conseguir chegar a este ponto de manter o que acho essencial para a minha versão, precisava de apaixonar-me pela canção; e a canção, para mim, começa pela letra.” Em 2015, a propósito do seu segundo disco, Innocentia, Maria Mendes dizia ser “muito nostálgica”. E continua a ser, confirma: “Mais do que nunca.” E a nostalgia marcou decisivamente este seu novo disco, pela temática e pela abordagem: “A saudade, a nostalgia, e também sentir de certa forma aquilo que eu pretendo com este disco: o meu público é muito internacional e eu pretendo vê-lo curioso a visitar e revisitar os originais. Para mostrar o que Portugal também é.”
Nestes cruzamentos, ganhará mais o jazz com o fado ou o fado com o jazz? Após uma curta hesitação, Maria responde sem deixar lugar para dúvidas: “Acho que o jazz ganha muito mais com isto. Já tendo feitos tantos palcos de grande prestígio fora [de Portugal], sinto que muitas vezes o jazz fica camuflado numa certeza absoluta que não há. O jazz é uma grande árvore, com grandes ramos, e muitas vezes tende-se a não se olhar para a árvore completa. E com isto pretendi fazer uma coisa muito especial, criar uma sonoridade nova, com todos os músicos de excelência que fazem parte deste projecto. Desde a Metropole Orkest, que é a orquestra de jazz sinfónica número um do mundo, que já gravou com Quincy Jones ou Ella Fitzgerald e gravou agora pela primeira vez com uma portuguesa porque [os seus músicos] se apaixonaram pela ideia e pelo conceito; a todos os músicos envolvidos, não só a minha banda, mas também o produtor, John Beasley, que trabalha com Herbie Hancock, todas estas pessoas tocaram estas canções de mente e corações abertos. Por isso, acho que, sem dúvida, o jazz ganhou muito mais com isto.”
Mais perto do coração
Com todas as letras em português, o disco tem um nome em inglês. E isso é intencional, diz a cantora: “Sabendo que as letras estão em português, quis que o meu público (que ultrapassa a língua portuguesa) soubesse que este é o disco que mais me diz, do coração. Por aquilo que Portugal é; e também pelo legado português, que permita tanto mais. Daí eu querer chamar ao disco Close To Me, para ficar claro que isto é o mais perto daquilo que é, e do meu coração.”
Não é muito habitual fora dos clubes, mas a apresentação de Close To Me terá dois sets, tanto em Lisboa como no Porto. “Sendo um repertório de fado, é quase como convidar as pessoas a irem a uma casa de fados. Claro que não é, mas quisemos fazer isto nos auditórios mais pequeninos, o Jardim de Inverno [do São Luiz] e a Sala 2 [da Casa da Música], porque têm esse lado mais acústico, de maior proximidade com o público. E tentar reunir esta dicotomia, que não o é de todo: o clube de jazz com a casa de fados, e tentar fazer uma coisa muito autêntica, em lugares mais íntimos.” Com Maria Mendes (voz), estará um trio de músicos holandeses: Karel Boehlee (piano e sintetizadores), Jasper Somsen (contrabaixo) e Jasper Van Hutten (bateria e percussões).