Morreu Marie Laforêt, a “rapariga dos olhos dourados”
Estrela da cultura francesa, dividiu-se entre o cinema, filmada por Chabrol e contracenando com Alain Delon, e a música, servindo de contraponto mais maduro ao yé-yé. Tinha 80 anos. “Encarnou uma forma total de liberdade”, afirmou o ministro da cultura francês, Frank Riester.
O seu percurso fez-se entre mundos, entre a música e o cinema, entre tangentes à Nouvelle Vague e o universo da pop e da chanson, entre este e essoutro universo mais vasto que é o das canções tradicionais de proveniências além da sua França natal ou do influente mundo anglo-saxónico. Marie Laforêt, “a rapariga dos olhos dourados”, como ficou conhecida após protagonizar, em 1961, o filme com o mesmo título, realizado pelo então marido Jean-Gabriel Albicocco e adaptado do romance de Balzac, morreu este sábado, aos 80 anos, em Genolier, Suíça. A notícia foi avançada pela família e não foram reveladas as causas da morte.
A verdade faz-nos mais fortes
Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.
O seu percurso fez-se entre mundos, entre a música e o cinema, entre tangentes à Nouvelle Vague e o universo da pop e da chanson, entre este e essoutro universo mais vasto que é o das canções tradicionais de proveniências além da sua França natal ou do influente mundo anglo-saxónico. Marie Laforêt, “a rapariga dos olhos dourados”, como ficou conhecida após protagonizar, em 1961, o filme com o mesmo título, realizado pelo então marido Jean-Gabriel Albicocco e adaptado do romance de Balzac, morreu este sábado, aos 80 anos, em Genolier, Suíça. A notícia foi avançada pela família e não foram reveladas as causas da morte.
Nascida Maïtena Doumenach a 5 de Outubro de 1939 em Soulac-sur-Mer, teve uma infância marcada pela Segunda Guerra Mundial – o pai foi feito prisioneiro de guerra e ela, juntamente com a mãe e a irmã, encontraram refúgio em Cahors, no sudoeste do país. Foi nesse período que viveu um acontecimento traumático que a marcaria de forma decisiva. Violada por um vizinho aos três anos de idade, carregou em segredo o crime sofrido durante 35 anos. “Sem essa violação”, cita-a o Le Monde no obituário que lhe dedica, “não teria seguido um ofício de exposição pública que é contrário à minha timidez natural. Escolhi um trabalho que era um escape”.
O fim da guerra leva a família a Valenciennes e depois a Paris. Será na capital francesa, depois de pôr de parte uma precoce vocação religiosa, que revela um interesse crescente no mundo das artes. A carreira começa acidentalmente: em 1959, substitui à última hora a irmã enquanto participante num concurso de talentos da rádio e sai vencedora. O sucesso chamou a atenção do mundo do cinema e conduziu à estreia no grande ecrã em 1960, contracenando com Alain Delon em Plein Soleil, de René Clément. No mesmo ano, estreia-se também na música, com a edição do single Saint-Tropez Blues, ponte entre blues, chanson e swing que é também o tema-título do filme que surge no ano seguinte, realizado por Marcel Moussy e em que participa enquanto actriz.
Apesar de deixar a sua marca em França principalmente enquanto cantora, surgindo como contraponto mais adulto, mais sério, à frescura adolescente do yé-yé de Frances Gall ou Sylvie Vartan, manteve-se extremamente activa no cinema ao longo da década de 1960. Enquanto ia editando canções como Vendanges de l’amour (1963), o seu primeiro grande êxito, Manchester et Liverpool, versões em inglês de Blowin’ in the wind ou em francês de Sound of Silence, de Simon & Garfunkel (La voix du silence), ou reinterpretações de Paint it black, dos Rolling Stones (Marie-douceur, Marie-Cólere), surgia nas salas de cinema a contracenar com Charles Aznavour (Le Rat d’Amérique, de Jean-Gabriel Albicocco) ou com Jean-Paul Belmondo (Flic ou Voyou, de Georges Lautner) e inscrevia o seu nome na filmografia de Claude Chabrol (Marie-Chantal contre le docteur Kha) ou de Edouard Molinaro (La Chasse à l’Homme).
Nos anos 1970, décadas em que tem como grandes êxitos Viens, viens, adaptação do êxito alemão Rain, rain, de Simon Butterfly, e Il a neigé sur Yesterday, dedicada aos Beatles, afasta-se progressivamente da pop para explorar os sons que descobria nas suas viagens mundo fora. Cantara anteriormente em espanhol ou italiano e a sua música começa então a reflectir influências do folclore sul-americano ou do leste europeu. Em 1978, decidida a pôr fim à sua carreira musical, muda-se para Genebra, na Suíça, onde abre uma galeria de arte — mais tarde, viria a obter a nacionalidade suíça. Só regressaria aos álbuns em 1993 e aos palcos em 2005, para uma digressão francesa com lotação esgotada em todas as datas. No cinema, manteve uma cadência de trabalho regular, filmando, por exemplo, com Jean-Pierre Mocky em 1985 (Le Pactole).
“Marie Laforêt encarnou uma forma total de liberdade”, reagiu à morte o ministro francês da Cultura, Frank Riester. Escrevendo no Twitter, acrescentou: “Liberdade nas suas escolhas artísticas, liberdade na sua vida, guiada por duas bússolas apenas, o amor e a paixão”.
Casada cinco vezes, teve três filhos, Lisa Azuelos, hoje realizadora, Jean-Medhi-Abraham Azuelos e Eve-Marie-Deborah.