Para quando a fusão do PSD e do CDS?
Tudo indica que, no PSD, em causa continuará a estar apenas a discussão da estratégia de alianças.
A renovação do centro-direita é uma urgência para o país que, infelizmente, poderá ficar mais uma vez adiada com as eleições de lideranças no PSD e no CDS. Era bom que estes partidos tivessem a consciência de que a solução pode passar pela sua fusão num só partido. Uma fusão que naturalmente poderia ter acontecido em três momentos da história da democracia, mas que factores circunstanciais afastaram.
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A renovação do centro-direita é uma urgência para o país que, infelizmente, poderá ficar mais uma vez adiada com as eleições de lideranças no PSD e no CDS. Era bom que estes partidos tivessem a consciência de que a solução pode passar pela sua fusão num só partido. Uma fusão que naturalmente poderia ter acontecido em três momentos da história da democracia, mas que factores circunstanciais afastaram.
Primeiro, a morte do líder fundador do PSD, Francisco Sá Carneiro, a 4 de Dezembro de 1980, alterou os protagonismos e a correlação de forças dentro da Aliança Democrática que poderiam ter levado a essa fusão.
Em 1985, o presidente do CDS, Francisco Lucas Pires, recusou os 25 lugares que o PSD, liderado por Aníbal Cavaco Silva, lhe oferecia nas listas conjuntas às legislativas. Cavaco formou o seu primeiro Governo, com 88 deputados em São Bento e 29,87% dos votos. O CDS começou a sua década de erosão eleitoral, baixou de 30 para 22 deputados e teve 9,96% dos resultados. Lucas Pires impediu assim que a fusão natural entre PSD e CDS acontecesse durante a década do cavaquismo.
O terceiro momento foi em 2015. A fusão natural poderia ter surgido se a coligação Portugal à Frente, liderada por Passos Coelho e Paulo Portas, não tivesse sido afastada do Governo por António Costa, com apoio da esquerda parlamentar, e tivesse permanecido na condução do país por duas legislaturas.
Agora, o PSD e o CDS somam juntos, no Parlamento, a sua representação mais baixa de sempre. O PSD teve um dos piores resultados da sua história. Alcançou 1.457.704 votos, 27,76% e 79 deputados. O CDS teve o pior resultado de sempre. Conseguiu só 221.774 votos, 4,22% dos resultados e cinco deputados.
O futuro destes partidos passa por saberem reinventar-se em novos termos, de modo a potenciarem e renovarem o centro-direita e que este tenha um projecto para o país que ombreie e dispute o poder à esquerda, sobretudo ao PS. Por agora, ainda não se percebe o que vai acontecer ao CDS, no congresso marcado para 25 e 26 de Janeiro. No PSD, há já três candidatos assumidos: Rui Rio, Luís Montenegro e Miguel Pinto Luz. Mas estes parecem querer tão-só reproduzir a luta pelo poder partidário em termos tradicionais — resta ainda saber se Miguel Morgado se candidata e consegue inovar a discussão interna ao nível dos conceitos políticos.
Tudo indica que, no PSD, em causa continuará a estar apenas a discussão da estratégia de alianças. Uma clivagem que existe quase desde a fundação. Como líder da Ala Liberal durante o fim do Estado Novo, Sá Carneiro considerava ter o direito natural a ser líder partidário, mas também das instituições políticas em democracia. Após as primeiras legislativas, em 1976, ganhas pelo PS, Sá Carneiro tentou até ao limite levar Mário Soares a aceitar um acordo de Governo com o PSD. Pressionou, tanto quanto conseguiu, para que o Presidente da República, Ramalho Eanes, obrigasse a isso o líder fundador do PS. Eanes nunca o fez e, em 1979, o líder fundador do PSD muda de estratégia e nasce a Aliança Democrática, em que Sá Carneiro se une ao CDS de Diogo Freitas do Amaral e ao PPM de Gonçalo Ribeiro Teles.
Esta opção no domínio da estratégia de alianças, repito, é ainda a principal linha de divisão no PSD e está presente nas candidaturas que agora se apresentam a directas. A opção de alianças à direita, que levou o PSD ao Governo e é herdada de Sá Carneiro, foi assumida por vários líderes no passado e está presente em Luís Montenegro e Miguel Pinto Luz. Uma estratégia de alianças que muitas vezes se soma a uma defesa de valores político-ideológicos mais conservadores, personalistas e liberais na economia, como, aliás, eram os de Sá Carneiro, embora não pondo em causa o ideário da social-democracia.
Rui Rio é herdeiro da outra opção estratégica que coexiste no PSD, a das alianças à esquerda e ao PS, protagonizadas por Carlos Mota Pinto no Bloco Central, em 1983-1985. Mota Pinto que, na fundação do PSD, integrou o grupo dos sociais-democratas de Coimbra, liderado por Barbosa de Melo, os autores do primeiro programa do PSD.
Conhecer e perceber a história destas clivagens não chega para dar resposta à actual crise do centro-direita. Hoje, o problema da erosão eleitoral do PSD e do CDS dá-se num contexto novo em que entraram no Parlamento o Chega e a IL. Uma transformação de representação parlamentar que espelha a complexidade actual que enfrenta a política.
Era bom que os candidatos em disputa pela liderança do PSD e do CDS estudassem a história dos dois partidos e percebessem o que mudou na política portuguesa e mundial. Até porque, quanto mais depressa estes partidos perceberem qual o próximo passo, melhor para o país. Insisto: não estará na hora de PSD e CDS prepararem a sua fusão num só partido de centro-direita?