Duas semanas depois do Nobel, Etiópia mergulhada em confrontos violentos
Mais de 60 pessoas morreram em confrontos motivados por conflitos étnicos nos últimos dias. Antigo aliado de Abiy Ahmed acusa-o de estar a conduzir o país rumo a uma ditadura.
Pouco mais de duas semanas depois de o primeiro-ministro etíope, Abiy Ahmed, ter sido anunciado como vencedor do Prémio Nobel da Paz, protestos antigovernamentais deixaram mais de 60 mortos nos últimos dias.
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Pouco mais de duas semanas depois de o primeiro-ministro etíope, Abiy Ahmed, ter sido anunciado como vencedor do Prémio Nobel da Paz, protestos antigovernamentais deixaram mais de 60 mortos nos últimos dias.
Tudo começou na quarta-feira, quando o activista político Jawar Mohammed acusou a polícia de tentar organizar um ataque contra si, presumivelmente a mando do Governo. A reacção dos seus apoiantes foi imediata, com vários protestos em Addis Abeba e noutras cidades. Os manifestantes entraram em confronto com a polícia, mas ao fim de algum tempo a violência assumiu contornos inter-étnicos que se prolongaram nos dias seguintes.
Segundo a polícia da província de Oromia, que abrange a capital etíope, pelo menos 67 pessoas morreram – um manifestante diz que três pessoas foram mortas numa “acção policial” depois de terem dado entrada num hospital de Addis Abeba, de acordo com o New York Times.
A onda de violência reflecte uma luta política entre Abiy e Jawar, ambos da etnia oromo, que de aliados passaram a adversários. Jawar esteve vários anos exilado nos EUA até regressar no ano passado à Etiópia, tal como centenas de outros activistas que viram na subida de Abiy ao poder a abertura de uma oportunidade para a liberalização política.
Jawar fundou uma influente rede de meios de comunicação independentes que contrariam a narrativa oficial em vigor até recentemente na Etiópia, onde a etnia tigré era hegemónica face aos oromo. A sua capacidade de influência – tem 1,7 milhões de seguidores no Facebook – torna-o um importante actor no novo panorama político da Etiópia e a sua acção na promoção de manifestações a favor de Abiy fori decisiva para que o país tivesse pela primeira vez um chefe de Governo oromo.
No entanto, a relação entre ambos apresenta sinais de degradação que culminaram nos confrontos da semana passada. O analista do International Crisis Group, William Davison, diz que há “diferentes prioridades políticas” a separá-los. “Enquanto Abiy, de uma forma geral, quer afastar a coligação governamental e o país da política étnica, Jawar está concentrando em ampliar a autonomia e o poder do povo oromo”, diz ao New York Times o especialista.
Na sexta-feira, Jawar disse à Reuters que não exclui a possibilidade de se apresentar às eleições do próximo ano, desafiando Abiy e acusando o primeiro-ministro de estar a fazer regredir o país “na direcção de um sistema autoritário”.