Maria Fiuza de Mello, a pasteleira dos bolos americanos

No país da doçaria conventual, uma jovem chef pasteleira aposta nos bolos húmidos, às camadas e com cobertura – do Carrot Cake ao Not-So-Red-Velvet, é a tradição americana que encontramos na Larica.

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Maria Fiuza de Mello Miguel Manso

Da primeira vez que entrou no Culinary Institute of America para conhecer a escola ficou-lhe marcado na memória o cheiro dos bolos, das bolachas, do pão acabado de fazer. Nas bancadas das salas de aula, cada aluno dedicava-se a fazer o seu e, conta, “só isso cativa logo uma pessoa”. Não teve dúvidas. Era ali que queria estudar.

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Da primeira vez que entrou no Culinary Institute of America para conhecer a escola ficou-lhe marcado na memória o cheiro dos bolos, das bolachas, do pão acabado de fazer. Nas bancadas das salas de aula, cada aluno dedicava-se a fazer o seu e, conta, “só isso cativa logo uma pessoa”. Não teve dúvidas. Era ali que queria estudar.

O fascínio de Maria Fiuza de Mello pela pastelaria tinha começado cedo. “Quando estava no quarto ano disse à minha professora que não precisava de aprender História porque ia ser pasteleira”, recorda, sorrindo. Recentemente fez o bolo para uma festa de carreira dessa mesma professora. Tornou-se pasteleira, sim. Mas, entretanto, há muito que tinha percebido que também gostava de História.

Em Portugal estudou na escola americana e sempre se sentiu mais à vontade a falar inglês – ainda hoje, a conversar, os termos ingleses saem-lhe com muito mais facilidade, sobretudo quando se trata de pastelaria: “frosting”, “buttermilk”, ou munchies”, que é uma forma de dizer Larica, o nome com o qual baptizou a empresa que criou no início deste ano para vender (por enquanto, apenas online) os bolos americanos que faz.

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O Bolo de Cenoura da Larica Rita Ladeira

O que é um bolo americano? Esta é a pergunta a que mais vezes tem que responder quando apresenta o seu trabalho. Para a maior parte do público português, este é um mundo ainda desconhecido. “Perguntam-me muitas vezes se são bolos secos. Um bolo nunca deverá ser seco, se o é, é porque foi demasiado cozido. Devem ser húmidos, com sabor e equilibrados.” Habitualmente, têm duas partes, a do bolo propriamente dito, normalmente às camadas, e a da cobertura.

Um dos grandes segredos dos bolos da Larica tem a ver com a relação entre o açúcar e a gordura. “Nos Estados Unidos, tanto na escola como nos sítios onde trabalhei depois, eles optam por usar gordura que tenha realmente gordura. Num bolo, é preferível usar manteiga e de preferência uma com alto teor de gordura”, explica.

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A caneca que acompanhou Maria durante o tempo em que viveu, primeiro como estudante depois já a trabalhar, nos Estados Unidos Miguel Manso

Em Portugal, teve que fazer algumas adaptações. “Temos óptimas manteigas, isso não é difícil, o problema é com as natas, que aqui têm habitualmente um teor de gordura de 30%, enquanto nos EUA têm 40%.” Isto faz com que seja preciso compensar essa menor quantidade de gordura adicionando açúcar. “O que acontece com as 40% é que são supercremosas, têm até um toque doce, que é dado pela gordura.”

Pode não parecer evidente à primeira vista esta relação entre açúcar e gordura, mas o facto é que a menor quantidade de um implica o aumento do outro. Contudo, “com ingredientes melhores, mas que são mais caros, não é preciso usar tanto açúcar, os sabores falam por si”. Daí que tente usar sempre nos seus doces a fruta da época, por ser a que está no auge do sabor, somando isso à preocupação em utilizar produtos biológicos. Isto faz com que os bolos da Larica tenham alguma sazonalidade: “Respeito o ingrediente e sei que o morango vai ter um sabor melhor no Verão e a abóbora no Outono; aliás, em breve vou passar a ter um cheesecake de abóbora.”

Uma excepção, por estar sempre presente, é o Carrot Cake, o bolo de cenoura que, conta-se, seria já um favorito do Presidente norte-americano George Washington, e que é um best-seller da Larica (na foto ao lado). Além dele, encontramos no site o Not-So-Red-Velvet, uma versão do também muito tradicional Velvet Cake, o Bolo de Chocolate Blackout, o Funfetti (todos a partir de 30 euros), os Bolos de Coco e Maracujá (só no Verão), o de Coco e Lima e o de Baunilha e Morangos (a partir dos 35 euros). De quase todos eles existe a versão mini-cakes.

Durante o Verão houve uma série de sanduíches de gelado, entre as quais a de bolo de cenoura, a mais simples apenas de baunilha, uma de gelado de avelã salgado, outra de sorbet de coco e uma de gengibre e manga (estas duas, vegan), e a muito americana de manteiga de amendoim e sorbet de chocolate.

Uma das coisas que Maria gosta de trabalhar, e sobre as quais aprendeu muito nos EUA, são as versões alternativas, sejam os bolos sem glúten, sem lactose ou os vegan. Para quem não tolera a lactose, por exemplo, usa uma margarina com alto teor de gordura; para os celíacos ou intolerantes ao glúten, opta por uma mistura de farinha de arroz, batata, tapioca e aveia, que compra em Inglaterra.

Maria tinha 18 anos, e a experiência de um estágio, aos 15, no Hotel Palácio, no Estoril, quando chegou ao Culinary Institute of America, onde estudou durante três anos, num “ritmo acelerado”, com poucos períodos de férias e grandes saudades de casa (a caneca com azulejos que aparece nas fotos ao lado, oferecida por uma amiga, era um dos objectos que a acompanhava sempre e ajudava a combater as saudades).

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A caneta do Loring Place, o restaurante de Nova Iorque onde mais gostou de trabalhar Miguel Manso

Mas sempre se sentiu à vontade nos Estados Unidos e por isso foi natural para ela ter ficado durante mais seis anos, trabalhando em diferentes restaurantes (o que mais a marcou foi o Loring Place, do qual guarda uma caneta, que mostra noutra das fotos ao lado). “Adoro trabalhar em restauração, é um lugar onde me sinto eu própria, não sou julgada por ser mulher, ou jovem ou branca, sou julgada apenas pelo meu trabalho.”

Já de volta a Portugal, passou por alguns restaurantes e gostou em particular da experiência no 100 Maneiras, em Lisboa, mas percebeu que teria vantagens em tentar lançar-se num negócio sozinha. Olhou o mercado e concluiu que, apesar de “a pastelaria portuguesa ser incrível, o bolo em si, tipo bolo de aniversário, não é muito famoso”.

Havia espaço para os bolos americanos, acreditou. E lançou mãos à obra para criar a Larica. Porque, como se lê no seu site: “A sua vida começará realmente quando se aperceber de que não precisa de uma ocasião especial para comer um bolo”. Ela percebeu isso desde pequena.