Estado não sinalizou risco de queda de arriba que provocou mortos porque lei não o obrigava
Foi o concessionário da praia Maria Luísa que fez a sinalização das arribas. Só depois do acidente, em que cinco pessoas morreram, é que saiu legislação para regulamentar zonas de risco na costa portuguesa.
O antigo director do Departamento de Recursos Hídricos do Litoral, Sebastião Teixeira, admitiu esta segunda-feira, no julgamento do caso da queda de uma arriba que provocou cinco mortes no Algarve, que as autoridades não tinham sinalizado então o risco de desabamento do leixão. A lei não obrigava a fazê-lo. “A placa de ‘zona perigosa’, que se encontrava no leixão [arriba], foi colocada pelo concessionário da praia, e só tive conhecimento [da colocação dessa placa] depois do acidente”. A arriba caiu em Agosto de 2009 na praia Maria Luísa e a legislação que regulamenta as zonas de praia em risco só saiu três anos depois.
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O antigo director do Departamento de Recursos Hídricos do Litoral, Sebastião Teixeira, admitiu esta segunda-feira, no julgamento do caso da queda de uma arriba que provocou cinco mortes no Algarve, que as autoridades não tinham sinalizado então o risco de desabamento do leixão. A lei não obrigava a fazê-lo. “A placa de ‘zona perigosa’, que se encontrava no leixão [arriba], foi colocada pelo concessionário da praia, e só tive conhecimento [da colocação dessa placa] depois do acidente”. A arriba caiu em Agosto de 2009 na praia Maria Luísa e a legislação que regulamenta as zonas de praia em risco só saiu três anos depois.
Os familiares das vítimas pedem, pela “omissão” da administração pública de garantir a segurança das praias e dos banhistas, uma indemnização que ascende aos 911 mil euros. Sebastião Teixeira admitiu que, em 2009, quando se deu a derrocada, não existia qualquer plano de sinalização para identificar e alertar para as zonas de perigo. As placas triangulares com a representação de uma rocha a desmoronar-se, afixadas nos acessos principais às praias, disse, “foram afixadas, de acordo com a sensibilidade dos técnicos”. Só depois de se ter verificado o acidente, no dia 21 de Agosto de 2009, pelas 11h, é que passou a existir normas escritas. O decreto-lei sobre os planos de sinalização das praias foi publicado em Julho de 2012.
A praia Maria Luísa é considerada uma das mais vulneráveis, do ponto de vista da erosão costeira. O leixão que tombou, afirmou Sebastião Teixeira, “é uma pérola geológica” do ponto de vista cénico, tal como outros que existem na região. Por isso, o perigo e beleza coabitam no mesmo espaço, e as advertências dos riscos nem sempre são levadas a sério. Na zona poente desta praia (do lado Club Med da Balaia) a linha de costa recua uma média de 20 centímetros por ano; do lado nascente, o mar avança quatro centímetros – cerca do dobro da média das ocorrências nas restantes praias da região.
Embora não existisse um plano de sinalização, Sebastião Teixeira salientou que a Administração da Região Hidrográfica (ARH) afixou um sinal de perigo de desmoronamento de arribas, à entrada da praia. “Qual foi o critério?”, perguntou a juíza Patrícia Martins. “As placas foram adquiridas por concurso público e colocadas caso a caso de acordo a sensibilidade dos técnicos”, explicou o antigo director do departamento responsável pela gestão do litoral algarvio, entre 2008 e 2012. Desde 1995, há registos de cerca de 400 desabamentos de arribas nas praias algarvias.
Concessionário tem “larga experiência"
O facto do concessionário da praia Maria Luísa se ter substituído à ARH, na afixação de placas de sinalização de “perigo” junto ao leixão, não causa estranheza a Sebastião Teixeira. O concessionário “tem uma larga experiência e conhecimento” dos fenómenos que ocorrem naquela zona balnear. Quando se deu a derrocada, em pleno Verão, o cone de projecção das pedras que se desprenderam atingiu uma distância de 18 metros. As cinco vítimas foram apanhadas quando passeavam junto à zona de rebentação, e outros encontravam-se deitados ao sol. “Por que razão o local não estava balizado, para evitar aproximação?”, questionaram os advogados. “Não adiantava, porque na maré seguinte o mar levaria as balizas”, explicou o representante da ARH, tirando ilações para futuros estudos sobre o ordenamento do litoral: “Aprendemos todos com este acidente”, disse. Após o desmoronamento, foi feita remoção do que restou do leixão por uma questão de segurança. Segundo os estudos desenvolvidos pela ARH, 80 % dos desmoronamentos estão associados a picos de temperatura ou chuvas com um volume superior a 10 milímetros/dia. Os restantes 20 por cento, destacou o geólogo, são “imprevisíveis, como sucedeu na praia Maria Luísa”.
O Plano de Ordenamento da Orla Costeira (POOC) Burgau-Vilamoura, publicado em 1999, já definia faixas de risco nesta e noutras praias do Sotavento algarvio, mas apenas para efeito de licenciamentos no espaço balnear. A juíza Patrícia Martins, seguindo uma recomendação do Conselho Superior da Magistratura para sejam acelerados todos os processos abertos até 2012, manifestou a desejo de proferir a sentença até final do ano.