O PS não precisa de acordos
O PS ocupa de facto uma posição no Parlamento que é central, incontornável e decisiva no estabelecimento de maiorias para aprovar legislação.
Na configuração da nova Assembleia da República, mais do que o partido charneira que já era, o PS tornou-se o partido central, incontornável e decisivo para o exercício do poder governativo em Portugal. O PS pode ser governo durante a legislatura, sem nenhum acordo prévio (assinado ou não assinado) e governar até de forma mais aliviada e sem os estigmas que lhe trariam uma maioria absoluta, num país onde a tendência para a promiscuidade, a corrupção e o abuso dos favorecimentos do poder caracterizam a política. Se António Costa faz a mise-en-cène de tentar os acordos, é apenas para manter a imagem de coerência no diálogo e a continuidade do posicionamento estratégico do seu anterior executivo.
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Na configuração da nova Assembleia da República, mais do que o partido charneira que já era, o PS tornou-se o partido central, incontornável e decisivo para o exercício do poder governativo em Portugal. O PS pode ser governo durante a legislatura, sem nenhum acordo prévio (assinado ou não assinado) e governar até de forma mais aliviada e sem os estigmas que lhe trariam uma maioria absoluta, num país onde a tendência para a promiscuidade, a corrupção e o abuso dos favorecimentos do poder caracterizam a política. Se António Costa faz a mise-en-cène de tentar os acordos, é apenas para manter a imagem de coerência no diálogo e a continuidade do posicionamento estratégico do seu anterior executivo.
Ao eleger 106 deputados, que ainda podem crescer para os 108 ou mesmo 109 com o apuramento dos resultados eleitorais dos círculos da emigração, que elegem quatro parlamentares, o PS ocupa de facto uma posição no Parlamento que é central, incontornável e decisiva no estabelecimento de maiorias para aprovar legislação, desde as mais comuns leis ordinárias até aos orçamentos do Estado.
Na nova Assembleia da República os outros partidos representados são uma espécie de satélites do PS, mesmo que não venham a tornar-se participantes activos em negociações que permitam a constituição de maiorias. Um efeito que é potenciado pelo facto de três novos partidos terem eleito deputados e a representação política estar mais fragmentada. No hemiciclo de São Bento, à direita do PS, sentam-se agora quatro partidos: PSD, CDS, Chega e Iniciativa Liberal. A verdade é que todos juntos têm bastante menos deputados do que o PS sozinho.
O Chega é assumidamente um partido de extrema-direita e de ruptura com o sistema democrático nos pressupostos em que tem funcionado a democracia parlamentar em Portugal. É assim natural que a sua acção conjunta com outros partidos seja instrumental. A Iniciativa Liberal é um partido que pode, de acordo com os assuntos em debate, agir em consonância com o PSD, com o CDS e até com o PS. No seu ideário não são de forma alguma postos em causa os princípios da democracia liberal; pelo contrário, estes podem surgem até proclamados com uma convicção exponenciada.
Mas o que é mais decisivo é a situação em que se encontram o PSD e o CDS. Este último praticamente implodiu e torna-se irrelevante. Regressou aos cinco deputados, quando tinha 18, vendo desaparecer de São Bento algumas das suas figuras de referência em algumas áreas importantes no universo de todos os deputados, como é o caso de Isabel Galriça Neto, nas questões de Saúde, ou de João Rebelo, na Defesa.
Grave e com perda de relevância é o peso do PSD no actual hemiciclo. Reduzido a 77 deputados, que poderão subir para 79 ou 80 com os resultados do voto dos emigrantes, o PSD tem o terceiro mais pequeno grupo parlamentar da sua história. Só elegeu menos deputados em 1976 (73), com Sá Carneiro, em 1983 (75), com Mota Pinto, se bem que se deva salientar que o Parlamento tinha então 250 deputados, que baixaram para 230 com a revisão constitucional de 1997. Já em 2005, com Santana Lopes teve apenas 75 mandatos, mas com uma percentagem superior (28,77%).
É certo que o PSD é um partido estruturante da democracia e continua a destacar-se como segundo partido. Mas o seu peso parlamentar é agora reduzido e apenas poderá contar para negociar com o PS medidas estruturais e de regime que podem tornar-se cada vez mais urgentes – o que, convenhamos, confere ao PSD um papel importante.
Mas se em relação à sua direita no hemiciclo o PS está à vontade, o mesmo acontece em relação à esquerda. O BE mantém 19 deputados, tendo perdido cerca de 50 mil votos e baixado em percentagem para 9,67%. O PCP e o PEV elegem 12e deputados, contra os anteriores 17, e perdem mais de cem mil votos. Embora sem se afirmar de esquerda nem de direita, o PAN tem convergido com o PS e cresceu de um para quatro deputados. A eleição de uma deputada pelo Livre é irrelevante no contexto parlamentar.
Assim, salta aos olhos que para Costa aprovar medidas basta-lhe negociar a abstenção de um dos lados do hemiciclo. Assim como salta aos olhos que o PS só será vencido em votações no Parlamento por uma coligação das oposições. Ora, este tipo de alianças contra quem governa deixou marcas recentes no PSD e no CDS, quando da crise dos professores. Tal como as deixou na esquerda, após o chumbo do PEC IV que levou à queda do Governo de José Sócrates.
Com o peso que tem no Parlamento, o PS pode governar sozinho, com acordos pontuais, medida a medida, com facilidade, pelo menos enquanto a economia não entrar em crise ou em estagnação grave, que obrigue a travar a política redistributiva assente na presença do Estado na sociedade que António Costa defende, tem praticado e irá continuar a praticar. É por isso que qualquer acordo é desnecessário. Porque se acabar a tendência de crescimento económico, por muito anémico que seja, não há acordo escrito ou não escrito que salve o governo.