Manifestantes tentaram invadir residência presidencial no Haiti

Assassínio de jornalista incendiou os ânimos dos haitianos que há meses protestam contra o Presidente Jovenel Moïse. Quatro pessoas morreram e dezenas ficaram feridas.

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Manifestante no meio de uma nuvem de gás lacrimogéneo Andres Martinez Casares/REUTERS

A polícia haitiana impediu milhares de manifestantes de chegarem à residência oficial do Presidente do Haiti, Jovenel Moïse, em Port-au-Prince, depois de ter sido encontrado o corpo de um jornalista assassinado. Josephe Néhémie, da Radio Méga, cobria os protestos e tinha revelado que era ameaçado por alguns políticos que o acusavam de incitar à violência dos protestos que há meses agitam o país.

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A polícia haitiana impediu milhares de manifestantes de chegarem à residência oficial do Presidente do Haiti, Jovenel Moïse, em Port-au-Prince, depois de ter sido encontrado o corpo de um jornalista assassinado. Josephe Néhémie, da Radio Méga, cobria os protestos e tinha revelado que era ameaçado por alguns políticos que o acusavam de incitar à violência dos protestos que há meses agitam o país.

Os manifestantes exigem a demissão do chefe de Estado, acusando-o de ser corrupto. A morte do jornalista, baleado e deixado num carro, foi a mais recente acendalha. Uma multidão tentou chegar à residência oficial do Presidente – houve uma tentativa semelhante nos protestos de 2008 – e a polícia reagiu disparando gás lacrimogéneo e balas reais para o ar.

As manifestações desta sexta-feira foram das maiores das últimas semanas, com um cenário de saques e pneus queimados nas ruas. Quatro pessoas morreram e outras dezenas ficaram feridas nos confrontos com a polícia, que a oposição acusou de usar excessiva violência. 

“Está bem claro que os dias de Jovenel Moïse estão contados. Ele é rejeitado pela população haitiana. Todos os agentes envolvidos em violações dos direitos humanos serão responsabilizados”, disse à agência Efe André Michel, líder do movimento Sector Democrático e Popular.

Pressionado nas ruas, Moïse anunciou a constituição de uma comissão com a missão de encontrar uma solução para a crise política. Porém, recusa ceder aos manifestantes, argumentando não querer deixar o país nas “mãos de gangues armados e criminosos”. A oposição não aceita esta argumentação e recusou participar em negociações. 

Pelo menos 20 pessoas já morreram em meses de protestos e há relatos de em manifestações anteriores as autoridades terem disparado balas reais contra os manifestantes, diz a Associated Press. Entre os feridos nos protestos encontram-se dois jornalistas, Edmond Joseph Agenor e Dieu-Nalio Cheuy. O primeiro foi atingido num pulso e o segundo na cara, por um senador, no exterior do Parlamento.

Os jornalistas tornaram-se alvos. Contando com Josephe Néhémie, agora encontrado morto, outros dois já morreram desde o início da contestação ao chefe de Estado: Pétion Rospide, da Radio Sans Fin, assassinado quando ia de carro para casa, e Vladjimir Legagneur, que desapareceu sem deixar rasto em Março de 2018, quando investigava um tema.

Os protestos começaram depois de o Supremo Tribunal de Contas ter publicado uma auditoria em que denunciava uma gestão calamitosa e possíveis desvios de fundos públicos, na ordem dos dois mil milhões de dólares (1,7 mil milhões de euros). O documento oficial envolveu o Presidente Moïse num esquema de corrupção na compra de petróleo venezuelano barato.

Moïse já estava politicamente fragilizado quando os manifestantes começaram a sair à rua. Em Julho de 2018, o Governo haitiano anunciou o corte dos subsídios aos combustíveis, levando à subida do preço da gasolina (38%), gasóleo (47%) e do querosene (51%), por exigência do Fundo Monetário Internacional. Em troca de um pacote financeiro de assistência, o Governo haitiano tinha ainda de cortar nos gastos dos serviços sociais e infra-estruturas e aumento de impostos. 

Os haitianos não gostaram e saíram à rua, erigindo barricadas, ateando fogo a pneus e envolvendo-se em confrontos com a polícia. Pouco depois, o então primeiro-ministro haitiano, Jack Guy Lafontant, anunciou a suspensão das medidas e, dias depois, apresentou a demissão ao chefe de Estado, cujas promessas eleitorais foram de fortalecer os serviços públicos. Os manifestantes abandonaram as ruas, mas o descontentamento ficou à flor da pele, à espera da próxima razão para se expressar. 

A crescente inflação, falta de combustível e repressão das autoridades, têm motivado protestos ininterruptos no país caribenho. “Estamos na miséria e a morrer de fome”, disse o manifestante Claude Jean, citado pela Reuters. “Não o aguentamos mais. Pedimos-lhe [ao Presidente] que se demita para que possamos ter um novo Haiti, porque sofremos muito neste país”.

A contestação tem contado com uma participação massiva de jovens, uma vez que mais de metade dos onze milhões de haitianos tem menos de 25 anos. Em 2018, o desemprego geral era de 14% e o jovem estava nos 36%, de acordo com o Índice de Desenvolvimento Humano das Nações Unidas. O Haiti é um dos países mais pobres do mundo e está na 168.ª posição num ranking composto por 189 países.