Cientistas portugueses trabalharam com os premiados com o Nobel da Física de 2019
Nuno Santos, Alexandre Correia e José Sande e Lemos já trabalharam ou contactaram com Michel Mayor e James Peebles, dois dos laureados com o Prémio Nobel da Física de 2019.
Esta terça-feira o Prémio Nobel da Física foi atribuído a James Peebles, pelas descobertas teóricas em cosmologia física, e a Michel Mayor e Didier Queloz, pela detecção do primeiro exoplaneta. Nesta sua busca pela compreensão da evolução do Universo e lugar da Terra no cosmo, estes três laureados já cruzaram os seus caminhos com cientistas portugueses. Nuno Santos teve a orientação de Michel Mayor no doutoramento. Alexandre Correia integrou a equipa do cientista suíço no Observatório de Genebra. E José Sande e Lemos teve “conversas preciosas” com James Peebles.
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Esta terça-feira o Prémio Nobel da Física foi atribuído a James Peebles, pelas descobertas teóricas em cosmologia física, e a Michel Mayor e Didier Queloz, pela detecção do primeiro exoplaneta. Nesta sua busca pela compreensão da evolução do Universo e lugar da Terra no cosmo, estes três laureados já cruzaram os seus caminhos com cientistas portugueses. Nuno Santos teve a orientação de Michel Mayor no doutoramento. Alexandre Correia integrou a equipa do cientista suíço no Observatório de Genebra. E José Sande e Lemos teve “conversas preciosas” com James Peebles.
Em 1995, quando Michel Mayor e Didier Queloz descobriram o primeiro planeta a orbitar uma outra estrela parecida com o Sol além do nosso sistema solar, Nuno Santos estava a terminar a licenciatura em Física na Faculdade de Ciências na Universidade de Lisboa. Nessa altura, o sistema solar era o único sistema planetário que se conhecia. “Também foi por isso [esta descoberta] que decidi que ia fazer doutoramento nessa área”, recorda.
Nuno Santos acabou mesmo por fazer o doutoramento na Universidade de Genebra (na Suíça) com a orientação de Michel Mayor. “Além de ser um cientista absolutamente excepcional, essa primeira descoberta também foi fruto da sua grande coragem científica”, descreve o cientista português. “Aquilo que foi detectado na altura era algo que não era esperado e ele ousou acreditar que aqueles dados indicavam que estava ali um planeta. Hoje, olhamos para trás e dizemos obviamente que sim [que era um planeta], mas com o conhecimento da altura foi realmente um passo muito grande.” Se do ponto de vista científico Nuno Santos descreve Michel Mayor como “uma pessoa extremamente arguta e que pensa à frente”, a nível humano classifica-o como alguém “completamente excepcional” e refere que ainda continua a contactar com o cientista suíço.
Quando terminou em 2002 o seu doutoramento, Nuno Santos voltou a Portugal e formou uma equipa para investigar exoplanetas – uma das primeiras a nível internacional – que teve um “forte” contributo de Michel Mayor. Hoje, o cientista português já contribuiu para a descoberta de centenas de exoplanetas (já foram descobertos mais de 4000 desde 1995) e lidera uma equipa com cerca de 20 investigadores e estudantes de doutoramento no Instituto de Astrofísica e Ciências do Espaço, que trabalha em diversos aspectos da procura e estudo de exoplanetas.
Sobre a atribuição do Prémio Nobel ao seu mentor, Nuno Santos considera que é um reconhecimento de que a descoberta de 1995 foi “uma alavanca” que permitiu que soubéssemos que existem outros mundos. “Do ponto de vista puramente científico, esta foi a primeira descoberta que abriu uma nova área da astrofísica [da investigação em exoplanetas], que hoje é uma das que tem maior impacto”, assinala o também investigador da Faculdade de Ciências da Universidade do Porto. “Esta descoberta teve impacto até sociológico e ajuda-nos a perceber o nosso lugar no Universo.”
No Observatório de Genebra
Entre 2003 e 2004, Alexandre Correia – agora no Departamento Física da Universidade de Coimbra – esteve integrado na equipa de Michael Mayor como investigador no Observatório de Genebra. “Na altura era ainda uma pequena equipa, que trabalhava arduamente na procura de novos planetas e na construção de equipamentos de detecção cada vez melhores”, conta num artigo no PÚBLICO. Nessa altura, o cientista português esteve envolvido na descoberta de novos planetas, em particular de sistemas com mais do que um planeta. “Com o impacto científico e mediático do trabalho desenvolvido a equipa foi crescendo, sendo hoje a grande referência a nível mundial nesta área.”
Quanto a Michel Mayor, Alexandre Correia descreve-o como uma pessoa extremamente afável e sempre com a preocupação de integrar novos colaboradores. “Mais do que a descoberta sensacional de 1995, soube aproveitar a oportunidade para desenvolver uma linha de investigação completamente nova”, frisa. “O seu sonho, partilhado por todos nós, é que possamos um dia encontrar planetas parecidos com a Terra, que possam albergar vida.”
Conversas em Cambridge
Enquanto estava a fazer o seu doutoramento na Universidade de Cambridge, em Inglaterra (entre 1983 e 1987), José Sande e Lemos – actual presidente do Centro de Astrofísica e Gravitação (CENTRA) do Instituto Superior Técnico, em Lisboa – conheceu James Peebles. Em 1986, o investigador da Universidade de Princeton estava de visita a Cambridge e acabou por conversar e ajudar José Sande e Lemos num problema que este estava a analisar sobre perturbações num Universo não homogéneo em expansão.
“Sempre foi muito prestável. Nessas conversas, aprendi várias coisas e percebi era uma pessoa cheia de entusiasmo. Foi um contacto que nunca mais esqueci”, relata. “Via-o como uma pessoa em que me queria espelhar no futuro.” Na tese, o presidente do CENTRA acabou mesmo por colocá-lo nos agradecimentos. “Beneficiei das conversas com Jim Peebles”, escreveu.
José Sande e Lemos refere que James Peebles “teve vários pontos importantes na sua carreira”. Um deles foi a previsão teórica para a radiação cósmica de fundo. Esta radiação foi detectada acidentalmente em 1964 por Arno Penzias e Robert Wilson, dos Laboratórios Bell (EUA), o que lhes valeu o Nobel da Física em 1978. No início, estes físicos experimentais ainda pensaram que os sinais que estavam a captar se deviam à presença de pombos em cima das antenas. “Peebles foi quem desenvolveu a parte teórica para essa radiação, foi um dos primeiros a perceber como se podiam formar aglomerados de galáxias e galáxias e começou a fazer cosmologia observacional teórica. É um – senão o – expoente dessa área”, enumera. “Fiquei muito contente com este Prémio Nobel. É muito merecido.”