Emprestar o cérebro à Ciência

Esta é a história da minha primeira experiência dentro de um aparelho de ressonância magnética. Não, não estou doente. Este foi o dia em que emprestei o cérebro à Ciência.

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Robina Weermeijer/Unsplash

Estava deitado numa espécie de marquesa que fazia parte da máquina. Tinha vestidas roupas azuis descartáveis, como quem vai retirar o apêndice ao hospital. Apesar de estar voltado para cima, não conseguia ver as luzes no tecto. Havia um dónute metálico gigante em volta de mim. Sobre a minha face havia sido colocada uma estrutura em plástico, em forma de máscara, que me cobria a face, reflectindo, por intermédio de um espelho no seu interior, imagens provenientes de um ecrã situado atrás de mim. Imagens a preto e branco apareciam e desapareciam rapidamente no ecrã. Eram faces de pessoas famosas, animais selvagens e edifícios mundialmente conhecidos, tais como a Torre Eiffel ou a Casa Branca. Ao centro existia um pequeno ponto vermelho vivo. Ao mesmo tempo, ouvia-se um ruído agudo e ritmado vindo da máquina, como se estivesse dentro de um fax. O som estridente era bem audível, mesmo com os tampões cor-de-laranja que havia colocado nos ouvidos anteriormente. Lembrei-me imediatamente dos avisos de segurança que havia visto do outro lado da porta, antes de entrar. Esta é a história da minha primeira experiência dentro de um aparelho de ressonância magnética. Não, não estou doente. Este foi o dia em que emprestei o cérebro à Ciência.

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Estava deitado numa espécie de marquesa que fazia parte da máquina. Tinha vestidas roupas azuis descartáveis, como quem vai retirar o apêndice ao hospital. Apesar de estar voltado para cima, não conseguia ver as luzes no tecto. Havia um dónute metálico gigante em volta de mim. Sobre a minha face havia sido colocada uma estrutura em plástico, em forma de máscara, que me cobria a face, reflectindo, por intermédio de um espelho no seu interior, imagens provenientes de um ecrã situado atrás de mim. Imagens a preto e branco apareciam e desapareciam rapidamente no ecrã. Eram faces de pessoas famosas, animais selvagens e edifícios mundialmente conhecidos, tais como a Torre Eiffel ou a Casa Branca. Ao centro existia um pequeno ponto vermelho vivo. Ao mesmo tempo, ouvia-se um ruído agudo e ritmado vindo da máquina, como se estivesse dentro de um fax. O som estridente era bem audível, mesmo com os tampões cor-de-laranja que havia colocado nos ouvidos anteriormente. Lembrei-me imediatamente dos avisos de segurança que havia visto do outro lado da porta, antes de entrar. Esta é a história da minha primeira experiência dentro de um aparelho de ressonância magnética. Não, não estou doente. Este foi o dia em que emprestei o cérebro à Ciência.

Por vezes, o espelho tornava-se baço devido à minha lenta respiração. Apesar do ar fresco que sentia sair da máquina, estava quente ali dentro. Começava a sentir um desconforto por não me poder mexer. “Se te mexeres vais estragar a experiência”, pensei. Segurava na mão direita um comando com dois botões. Deveria pressionar o direito quando aparecessem animais e o esquerdo para as pessoas e edifícios. Torna-se aborrecido ao longo do tempo. As imagens repetem e os dedos da mão vão ficando cansados. “O que será que ele pretende descobrir com isto?”, pensava. A mente vagueia entre imagens e até o ruído se parece transformar em música.

Foi há precisamente 16 anos que Paul C. Lauterbur e Sir Peter Mansfield foram reconhecidos com o Prémio Nobel da Medicina pelas suas contribuições na obtenção de imagens de órgãos do corpo humano através de ressonância magnética. Esta é uma técnica não invasiva que permite aos médicos e cientistas obterem imagens do interior do cérebro com grande detalhe. O dónute metálico é, na verdade, um íman muito potente, capaz de estimular áreas do cérebro que reagem de forma diferente a este campo magnético. As diferentes respostas permitem construir uma imagem do cérebro a três dimensões, evidenciando assim as diferentes estruturas do mesmo. A ressonância magnética funcional (fMRI), uma variante da técnica original, vai um pouco mais além pois permite visualizar através de cores diferentes a actividade cerebral nas diferentes regiões. Neste caso é o fluxo sanguíneo que lhes permite visualizar em tempo real a actividade cerebral. Esta última é particularmente útil na investigação em ciências cognitivas. Na sala de controlo estavam, portanto, a ver que zonas do meu cérebro respondiam a imagens a preto-e-branco de pessoas, animais e edifícios, respectivamente Nessa sala estava Jon Walbrin, um investigador de pós-doutoramento do Proaction Lab.

Foi a seu pedido que participei como voluntário nesta investigação, o que requereu manter a cabeça imóvel durante uma hora dentro da máquina, enquanto imagens apareciam e desapareciam diante dos meus olhos. O objectivo da sua investigação é perceber como é que a informação sobre diversas categorias semânticas (faces, carros, casas, etc.) está organizada no cérebro. Mais do que isso, Jon quer melhorar as técnicas que são usadas na investigação em neurociência para que produzam imagens mais precisas e resultados mais fidedignos.

Enquanto comunicador de Ciência deste laboratório, o meu objectivo é partilhar com vários públicos o trabalho que aqui é desenvolvido. Muito desse trabalho é feito em frente a um computador, tentando deixar a neurociência apelativa e compreensível pelo comum dos mortais. Em vez das tarefas habituais de comunicação de ciência, aquela tarde ficou marcada pela participação na investigação levada a cabo por investigadores do laboratório onde trabalho. Troquei temporariamente as redes sociais, os sites e as câmaras por uma nova experiência: fui (mais) uma cobaia para uma investigação científica cujos resultados irei mais tarde comunicar. Agora é esperar para ver o que sai dali.