“Os eleitores austríacos queriam mudança. Tiveram-na, e acabou num drama”
A jornalista de política Ulrike Weiser analisa o que se prevê como desfecho das legislativas antecipadas na Áustria. Com um vencedor anunciado, o mais interessante será a formação de uma nova coligação de governo.
A coligação entre conservadores e extrema-direita terminou com um escândalo. Mas a hipótese de se repetir não está afastada, nota a jornalista de Política do jornal Die Presse Ulrike Weiser, numa entrevista telefónica com o PÚBLICO.
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A coligação entre conservadores e extrema-direita terminou com um escândalo. Mas a hipótese de se repetir não está afastada, nota a jornalista de Política do jornal Die Presse Ulrike Weiser, numa entrevista telefónica com o PÚBLICO.
Quais foram os temas desta campanha?
Na sequência do “vídeo de Ibiza”, em que o então líder do FPÖ [Partido da Liberdade, extrema-direita], Heinz-Christian Strache, discutiu que oligarcas russos comprassem uma parte do jornal Kroner, e financiassem o partido através de clubes ou associações [o escândalo que ditou o fim do Governo anterior] o tema do financiamento dos partidos foi muito discutido – e ainda foi aprofundado por um segundo escândalo, em torno de despesas pessoais do então líder Strache. Temos uma lei de financiamento dos partidos relativamente branda, e por isso houve debate sobre os limites, a transparência, etc. O segundo tema é global, foi o clima. Os Verdes, que nas últimas legislativas ficaram fora do Parlamento, vão agora eleger deputados, e nenhum partido ignorou o tema.
Além destes dois temas centrais, discutiu-se como se vão financiar os cuidados a uma população envelhecida, e ainda o Exército, depois de o ministro da Defesa ter apresentado um quadro muito dramático do seu mau estado financeiro. Também foram discutidos os temas habituais: migração, impostos, educação, mas nesta campanha os primeiros foram novos.
Algum factor pode ser decisivo?
Há um ponto de partida muito raro nestas eleições, que é não haver um duelo pelo primeiro lugar. O primeiro lugar está garantido para Sebastian Kurz, cujo partido ÖVP vai ser o mais forte. O que quer dizer também que não poderia ter havido durante a campanha nenhum tema que pudesse mudar esse ponto de partida. Desde o início que a narrativa do ÖVP foi que a inveja dos outros partidos fez cair o seu governo e a confiança dos cidadãos vai permitir que Kurz volte a ser chanceler. Mas a pergunta interessante é com quem poderá coligar-se.
Qais são as hipóteses de coligação?
Houve coisas na campanha que deram a sensação de que Kurz poderia pender para um lado ou para outro, foi mudando. Houve ondas de aproximação do ÖVP ao SPÖ (Partido Social Democrata) e ao FPÖ (Partido da Liberdade).
Todas as hipóteses têm problemas. Uma nova “grande coligação”, com os sociais-democratas, é voltar a um modelo que existiu durante muitos anos, que deu uma sensação de imobilidade, e as pessoas fartaram-se - o que poderia oferecer de novo? Uma coligação com o FPÖ teve problemas a nível interno e internacional, e as pessoas pensarão para que votaram se foi para obter o mesmo governo. As pessoas estavam fartas da “grande coligação”, queriam mudança. Tiveram mudança, e a mudança acabou num drama…
E uma coligação com os conservadores, liberais e verdes, a “coligação dirndl”?
Isto seria muito novo, nunca houve uma coligação com três partidos a nível nacional. Seria talvez a variante mais interessante, em termos de conteúdo seria a mais nova. Mas tem alguns problemas, por exemplo no tema da migração, conservadores e Verdes têm posições opostas.
Não consigo mesmo dizer qual coligação é a mais provável, ninguém sabe.
Há uma última possibilidade. Que Kurz forme um governo minoritário e que coopere com partidos diferentes para diferentes políticas. Tivemos um governo minoritário uma vez, mas é relativamente novo e não é uma opção muito estável. Está sobre a mesa, mas não consigo dizer, e ninguém consegue dizer, qual é a mais provável. O que sabemos é que vai demorar muito até termos governo, porque as conversações vão ser muito difíceis.