E noutra esquina, Vítor Sobral abre um “talho”
É mesmo em frente à Assembleia da República que fica o novo projecto do chef da Tasca da Esquina – para valorizar as carnes nacionais, as raças portuguesas e o trabalho de quem as matura.
Vítor Sobral já tinha à esquina uma Tasca, uma Peixaria e uma Padaria. Agora passa a ter um Talho da Esquina, o seu primeiro restaurante lisboeta fora do bairro de Campo de Ourique e que abriu no início de Setembro na Rua Correia Garção, em frente à Assembleia da República.
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Vítor Sobral já tinha à esquina uma Tasca, uma Peixaria e uma Padaria. Agora passa a ter um Talho da Esquina, o seu primeiro restaurante lisboeta fora do bairro de Campo de Ourique e que abriu no início de Setembro na Rua Correia Garção, em frente à Assembleia da República.
A carne, claro, é a estrela – assumidamente e sem complexos, como é o estilo de Sobral. “Temos que perguntar se é preciso comer carne todos os dias”, reconhece. Mas não a comer de todo parece-lhe um absurdo, até porque, lembra, não conhecemos o impacto real de uma produção agrícola que pudesse substituir toda a carne actualmente consumida no mundo.
Por isso, quem entrar no Talho da Esquina vai deparar-se logo com grandes peças de carne maturada, todas com etiqueta e “bilhete de identidade”, que serão depois cortadas e cozinhadas à vista dos clientes. O que Vítor Sobral pretende aqui é questionar “a ideia que os portugueses têm sobre o que é comer carne bovina grelhada”. Isto porque, apesar da cultura gastronómica nacional incluir cabrito, borrego, porco, frango, “até há pouco tempo, infelizmente, a carne bovina não era para todas as bolsas”.
E, no entanto, acredita, “temos carnes fantásticas”, não tanto na chamada “carne verde”, que são as raças criadas especificamente para carne, mas nas vacas leiteiras e nos animais de trabalho, cuja carne deve ser maturada, algo que em Portugal também se começou a fazer só recentemente.
“Uma carne verde tem entre 18 e 22 meses, pode chegar aos dois anos na melhor das hipóteses, enquanto uma vaca leiteira ou de trabalho nunca tem menos de oito, dez, 12 anos, daí justificar-se a maturação, que faz com que perca uma parte da água que tem e concentre o sabor e a gordura”, explica Sobral.
“Quando é abatida no matadouro”, sublinha, “a carne tem obrigatoriamente que estar pendurada 15 dias antes de seguir para o consumidor, mas não consideramos isso maturação.” É preciso conhecer estes detalhes para não se ser enganado, avisa.
No restaurante, os funcionários usam t-shirts onde se lê “raças portuguesas” e é a essas – maronesa, arouquesa, barrosã – que aqui se dá a primazia, embora também haja carne da raça holandesa Holstein-Frísia ou da muito popular Angus, de origem escocesa. “Consegue-se arranjar produção nacional em quantidade suficiente”, garante Sobral, “tem é que se pagar como deve ser aos produtores”. Se não o fizermos, o que acaba por acontecer é que “exportamos a nossa carne boa e importamos carne má”.
Olhemos então para a carta, que começa com uma série de petiscos, do tutano de bovino no forno com limão, tomate, pinhões e alecrim (9,20€) ao focinho de porco grelhado, com creme de coentros, cebola avinagrada e azeite de trufa (13,50€), passando pelas moelas grelhadas com pimentão da horta e piripíri, um molho inspirado pelo do frango assado (8,50€) ou pela empada de pato com chutney de abacaxi e gengibre (9,50).
Na secção das carnes, e ainda antes de chegar à bovina, há mão de cabrito com batata assada (28€) ou uma costeleta de porco do montado (14,50€) e nos bovinos, e naquela que é provavelmente a melhor relação qualidade-preço de toda a carta, um bife do beijinho (zona mediana e lateral da pá) Black Angus nacional (14€). “É uma carne fantástica, mas como tem um nervo ao meio as pessoas não querem”, diz o chef, que no Talho opta por não ter lombo e por valorizar carnes habitualmente consideradas menos nobres.
Entre as carnes que são pagas ao peso, encontramos a costeleta de Angus nacional (78€/kg), o T-Bone/costeleta de vaca de trabalho com 45 dias de maturação (95€/kg), a arouquesa com 60 dias (110€/kg) ou com 210 dias (140€/kg) e ainda a costeleta de boi minhoto castrado com 45 dias de maturação (215€/kg).
Há também um prato do dia (13€) que pode ser, por exemplo, uma espetada à madeirense com milhos de maracujá e esparregado ou um arroz de pato à antiga. Em breve, algumas novidades entrarão na carta, nomeadamente os hambúrgueres (o segredo na mistura de carnes é ter uma quantidade de gordura que dê o sabor, explica) e uma degustação de diferentes partes que incluirá o diafragma ou zona baixa da barriga (o onglet dos franceses). As carnes são sempre servidas com pickles, que podemos ver guardados em jarros de vidro sobre o balcão e que ajudam a cortar a gordura.
Curiosamente, apesar de estarmos num ambiente carnívoro, há duas propostas a pensar nos vegetarianos: a paella da terra (12,50€) e a lasanha de legumes (14,50€), para além de um cuidado na qualidade dos acompanhamentos, que incluem, a par das batatas fritas ou assadas, uma salada de legumes grelhados, de tomate ou de pimentos e um arroz de legumes no forno.